por Cristiane Noberto
Acusações de censura foram direcionadas nesta sexta-feira (18) à Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Os episódios ocorreram durante um encontro virtual que mostraria ao público as perspectivas do acordo assinado entre a instituição e a Universidade Estadual de Belarus (BSU), firmado em maio deste ano.
O ativista belarusso Tsimafei Malakhouski, coordenador de projeto na iniciativa Honest People, relatou ter sido removido da conferência sem qualquer justificativa, antes mesmo de fazer alguma pergunta.
“Pretendia questionar as professoras brasileiras sobre como avaliam os riscos de cooperação com a administração repressiva da BSU. Para minha surpresa, cinco minutos depois de eu levantar a mão, fui expulso com a mensagem ‘Você foi excluído da conferência pelo organizador’. Só consegui voltar à reunião usando outra conta do Google que era anônima”, disse o ativista em conversa com A Referência.
A representante da Embaixada Popular de Belarus no Brasil Volha Yermalayeva Franco também relatou interrupção no momento em que fez um questionamento. “A gravação foi encerrada e a moderadora, professora da UFPB Leila Bijos, interrompeu bruscamente minha fala. Perguntei se estava me censurando como acontece em Belarus, e só depois disso tive meu questionamento restabelecido por outra professora presente”, disse.
As perguntas para a professora belarussa Elena Dostanko, que apresentava a parceria entre as universidades, questionavam episódios de repressão por parte da administração no campus, a segurança dos brasileiros no intercâmbio para Belarus e os protestos no país europeu. Como resposta, a convidada disse que não comentaria sobre política naquele momento, mesmo sabendo da complexidade do assunto. A docente ainda afirmou que a parceria com o Brasil estaria segura pelo período acordado.
Os estudantes da BSU acusam a entidade de de perseguição contra alunos e funcionários. São relatos de expulsões, prisões arbitrárias e demissões em massa. As repressões tiveram início junto com os protestos contra o chefe de Estado de Belarus, Aleksander Lukashenko, que começaram em agosto do ano passado.
Acordos internacionais
Atualmente, a BSU possui acordos de cooperação com diversas universidades no mundo. Porém, algumas instituições, como as da Alemanha e Ucrânia, registraram a suspensão dos contratos em face de “assédio e demissões ilegais“.
Ao tomar conhecimento do acordo com a UFPB, o diretor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), Pio Penna, escreveu para os envolvidos no arranjo entre a UFPB e BSU e afirmou estar “abismado e perplexo com essa situação”. Até 2020, a universidade sediada em Minsk também tinha um acordo com a UnB.
No e-mail, que A Referência obteve com exclusividade, o docente ainda questiona: “como podem celebrar um acordo com uma Universidade submissa a um governo ditatorial e que persegue seus professores e alunos? Farei o que for possível, no que estiver ao meu alcance, para denunciar essa situação”.
Expulsos por motivo político
Em documento enviado À Referência, a Embaixada Popular de Belarus no Brasil fez um compilado de depoimentos de estudantes e professores que sofreram algum tipo de abuso pela BSU. Confira alguns abaixo:
Yaraslau Kot, ex-professor da Universidade Estatal de Belarus e um dos fundadores do Sindicato Livre de professores da Universidade Estatal de Belarus:
“Fui um dos primeiros professores que declararam sua posição política. Assim, a administração da faculdade me considerou um opositor. Começaram a me chamar para conversas, meus dados foram enviados para listas com a menção de “provocador” e “Judas”. Meu carro foi pichado, recebi ligações com ameaças. A administração disse: “Por que você está conversando com os estudantes sobre política? A culpa será sua se eles forem esmagados com tanques”. Em dezembro, recebi a demissão”.
Alina Bolbas, ex-estudante da Faculdade de Jornalismo da BSU, expulsa do 5º semestre
“Fui expulsa por não comparecer às provas porque eram restritamente presenciais e eu estava no exterior no momento. Abriram um processo criminal contra estudantes que participaram dos protestos e a KGB veio com buscas e, como eu estava envolvida no caso, tive que sair do país. Tentei trancar os estudos, sem sucesso. Em seguida, fiz testes e entreguei os trabalhos finais, mas não consegui comparecer presencialmente às provas, o que fez com que eu fosse jubilada. Considerando a atitude e a pressão da administração, resolvi não lutar mais para fazer as provas”.
Leanid Kazatchak, ex-aluno da Faculdade de Relações Internacionais da BSU
“Em outubro de 2020, fui detido enquanto distribuía panfletos com informações sobre protestos. Fiquei preso por 12 dias nos termos do Artigo 17.1 (delinquência) do Código Civil belarusso. Depois de eu cumprir a prisão, a universidade emitiu uma advertência. Em 16 de fevereiro de 2021, os policiais me tiraram de casa e me levaram ao departamento de polícia do distrito de Maskouski com justificativa de possível início de um processo criminal com base nos resultados da análise de folhetos e equipamentos confiscados. Após 12 horas, fui liberado sem explicação de outras perspectivas. Depois disso, me forçaram a deixar o país antes mesmo da expulsão da universidade”.
Petição virtual
Em abaixo assinado virtual, a “Honest University” apela para um boicote de parcerias e cooperações internacionais com a BSU, “até que a repressão política em Belarus seja encerrada”. Porém, os alunos pedem que as instituições desenvolvam e expandam outros tipos de bolsas de estudo e programas de apoio independente para estudantes e acadêmicos afetados e inclua aqueles que tiveram que deixar o país europeu por medo de perseguição política.
Os ativistas também pedem que estas universidades condenem publicamente as violações dos direitos humanos e das liberdades cometidas pela administração de universidades bielorrussas.
“Se não protegermos os estudantes belarussos, muitos deles acabarão na prisão. Apoie a petição em defesa de alunos e professores na Belarus”, diz o abaixo assinado virtual que já conta com mais de 18 mil assinaturas.
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