Um grupo de mulheres migrantes da Etiópia denunciou rotinas de escravidão no trabalho como empregadas domésticas no Líbano. Em entrevista à agência catari Al-Jazeera, elas relatam total ausência de remuneração e isolamento dos familiares etíopes.
Aster Goshu, 24, diz que recebeu apenas um salário desde que começou a trabalhar com uma família libanesa, em 2016. Na Etiópia, sua família chegou a considerá-la morta ao ser proibida de fazer contato por meses.
A mulher deixou o país africano em busca de trabalho ainda em 2014 – uma realidade comum entre jovens etíopes que buscam melhores condições econômicas. Agora, pede ajuda aos repórteres para que a ajudem a fugir da casa.
Grupos de direitos humanos relatam casos como o de Aster há décadas. Ao chegar ao Oriente Médio, as mulheres africanas se deparam com a kafala – sistema de patrocínio que vincula o status legal do trabalhador migrante à relação contratual com o empregador.
Por este sistema, o trabalhador deve “receber um convite” antes de chegar ao país. A admissão é facilmente driblada já no aeroporto de Beirute, onde agências de emprego confiscam passaportes e cobram de migrantes, muitas vezes ilegais, valores de até US$ 500 para facilitar o recrutamento no Líbano.
A armadilha está pronta: unidos a traficantes, agenciadores encontram famílias para registrar esses trabalhadores sob a kafala. O resultado são migrantes excluídos das leis trabalhistas libanesas e envolvidos em uma larga rede de abusos.
Rotina de exploração
Há relatos de empregadores que forçam os trabalhadores a trabalhar por cargas horárias extremamente longas, sem dias de folga ou pagamento. Muitos retém os passaportes para impedir o retorno ao país de origem.
“Em casos extremos, já denunciamos trabalho forçado e tráfico de pessoas também”, disse Diala Haidar, ativista da Anistia Internacional no Líbano.
Desde 2017, a organização This is Lebanon, criada para reivindicar direitos dos trabalhadores domésticos sob a kafala, registrou mais de 6 mil denúncias de abusos. “Pague ou torne-se famoso”, diz o slogan do grupo, que pressiona empregadores abusivos com a ameaça de publicar detalhes das explorações.
“Resolvemos muitos casos via negociações, em particular quando se trata de casos relacionados a salários não pagos. Nós escalamos as coisas apenas quando os abusadores se recusam a cooperar”, disse a fundadora Dipendra Uprety.
A exploração já fez com que a Etiópia proibisse que seus cidadãos viajassem ao Líbano para trabalhar em 2008. A medida, porém, nunca foi devidamente aplicada e o número de trabalhadores no país do Oriente Médio só cresceu. Hoje, o Líbano registra cerca de 400 mil migrantes etíopes.
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