O presidente da China, Xi Jinping, deixou claro na quarta-feira (25) que a comitiva da ONU (Organização das Nações Unidas) em visita ao país, a primeira em 17 anos, terá que se adequar às regras impostas por Beijing. E que o mundo precisa aceitar a posição chinesa sobre a questão dos direitos humanos. A histórica passagem do grupo, liderado pela alta comissária para os direitos humanos Michelle Bachelet, começou na segunda-feira (23) e terá a duração de seis dias.
Xi e Bachelet conversaram por vídeo na quarta (25). O presidente afirmou que a posição chinesa sobre a questão dos direitos humanos e sua aplicação deve ser respeitada internacionalmente, pois “se adequa às suas próprias condições nacionais”, segundo a rede norte-americana CNN.
“Na questão dos direitos humanos, nenhum país é perfeito. Não há a necessidade de pregadores darem ordens a outros países. Muito menos devem politizar a questão, praticar dois pesos e duas medidas ou usá-la como desculpa para interferir nos assuntos internos de outros países”, disse Xi.
O presidente chinês sugeriu que o país tem sua própria interpretação de direitos humanos e não sairá desse modelo. “Desviar-se da realidade e copiar por atacado o modelo institucional de outros países não apenas se encaixará mal com as condições locais, mas também trará consequências desastrosas”, disse Xi, segundo a agência Reuters.
Bachelet, por sua vez, foi política ao comentar a visita. Por exemplo, assim como Xi, ela não citou Xinjiang, onde muitos países acusam a China de genocídio contra os uigures. A região está na rota da comitiva da ONU e tende a ser o principal foco de debate no que tange à visita.
“É uma prioridade me envolver diretamente com o governo da China em questões de direitos humanos domésticas, regionais e globais”, disse Bachelet, segundo o site ONU News. “Para que o desenvolvimento, a paz e a segurança sejam sustentáveis, localmente e além-fronteiras, os direitos humanos devem estar no centro”.
Trabalhos forçados
Na conversa com a alta comissária, Xi afirmou que os direitos à subsistência e ao desenvolvimento estão inseridos na questão dos direitos humanos. Sobretudo no caso dos países em desenvolvimento, como a China. Um discurso que se enquadra justamente na questão de Xinjiang, onde há denúncias de que os uigures sejam submetidos a trabalho forçado em indústrias da região.
Em abril, uma denúncia feita pela rede Radio Free Asia citou o caso de centenas de uigures detidos pelo governo da China e submetidos a trabalho forçado. O episódio ocorreu na aldeia de Sheyih Mehelle.
As pessoas de Sheyih Mehelle submetidas a trabalho forçado são na maioria mulheres e idosos, enviados a fábricas de Xinjiang. Elas trabalham de dez a 12 horas diárias, sempre sob a rígida supervisão de agentes estatais, com salários mensais que variam entre mil e dois mil yuans (R$ 710 a R$ 1.420, no câmbio atual).
Desconfiança global
A histórica viagem que Michelle Bachelet realiza à China tem gerado críticas de grupos humanitários e governos ocidentais. Segundo esses, a passagem da chilena pelo país asiático pode servir para mascarar os abusos cometidos por Beijing contra minorias como a dos uigures, em Xinjiang, principal tema da visita.
Em parte, a desconfiança global deve-se ao mistério que cerca a visita, cujos detalhes são mantidos em segredo pela China e pela ONU. Na visão dos críticos, Beijing vai maquiar os problemas e assim reduzir o escrutínio global no que tange à questão dos direitos humanos.
“Estamos profundamente preocupados com a próxima visita”, disse o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Ned Price, em entrevista coletiva na última sexta-feira (20). Segundo ele, o governo norte-americano não espera que a China “conceda o necessário acesso para conduzir uma avaliação completa e não manipulada do ambiente de direitos humanos em Xinjiang”.
Segundo Price, Washington considerou “um erro concordar com uma visita dadas as circunstâncias”. E acrescentou que Bachelet não será capaz de obter um quadro completo “das atrocidades, crimes contra a humanidade e genocídio” na região.
Ao fim da visita, o ACNUDH (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos) pretende publicar um relatório que vem sendo preparado há três anos sobre os direitos humanos na China. Ele é baseado em entrevistas com sobreviventes de campos de internação e estudiosos do tema e em evidências de código aberto, como imagens de satélite e documentos estatais vazados.
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