Entre os efeitos da guerra que já podem ser sentidos pela Rússia, além das inúmeras sanções ocidentais, está uma considerável redução de seu corpo diplomático nos países da Europa. Desde a invasão da Ucrânia por tropas de Moscou, no dia 24 de fevereiro, cerca de 400 diplomatas russos foram expulsos de nações europeias, segundo levantamento da revista Foreign Policy feito em abril.
No período analisado, 24 dos 30 países da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) já haviam expulsado diplomatas russos. São casos ligados também ao conflito, como represália pela agressão injustificada de Moscou à nação vizinha. Mas que estão igualmente relacionados a denúncias de espionagem, com muitos russos suspeitos de usar o disfarce do serviço diplomático para servir à inteligência de seu país. Quem antes fazia vista grossa para o problema agora o considera intolerável.
Em março, a Bulgária foi uma das primeiras a agir. Sem entrar em maiores detalhes, Sófia justificou a expulsão de dez russos dizendo apenas que “os referidos funcionários da Embaixada da Federação Russa na Bulgária realizaram no território da República da Bulgária atividades incompatíveis com a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas”.
A decisão foi logo acompanhada pelas nações bálticas, que adotaram medida idêntica. Letônia e Estônia anunciaram a expulsão de três diplomatas cada, enquanto a Lituânia expulsou quatro.
“Os ataques militares da Rússia a civis, bens civis, hospitais, escolas, maternidades e bens culturais são crimes de guerra e crimes contra a humanidade”, disse o ministro das Relações Exteriores da Lituânia, Gabrielius Landsbergis. “Os serviços especiais russos estão ativamente envolvidos na organização desses crimes contra a população pacífica da Ucrânia, por isso não queremos que os representantes dessas estruturas caminhem em nossas terras e representem uma ameaça à segurança nacional da Lituânia”.
Através de sua conta no Twitter, o ministro das Relações Exteriores da Letônia, Edgars Rinkevics, deu a mesma justifica da Bulgária. “A Letônia expulsa três funcionários da Embaixada da Rússia em conexão com atividades contrárias ao seu status diplomático e levando em consideração a agressão russa em andamento na Ucrânia. A decisão foi coordenada com a Lituânia e a Estônia”.
#Latvia expells three Russian Embassy employees in connection with activities that are contrary to their diplomatic status and taking into account ongoing Russian aggression in #Ukraine. The decision has been coordinated with #Lithuania and #Estonia
— Edgars Rinkēvičs (@edgarsrinkevics) March 18, 2022
Uma semana depois foi a vez da Polônia, cuja lista de expulsões tinha 45 pessoas. Na sequência, quatro países da UE expulsaram 43 diplomatas no total. A Holanda puxou a fila, com 17 expulsos por desempenharem “atividades secretas”. A Bélgica, em ação coordenada com o vizinho, expulsou 21. O terceiro país a aderir à ação foi a República Tcheca, com um nome, enquanto a Irlanda anunciou uma lista com quatro indivíduos.
Já em abril foi a vez de a Alemanha expulsar 40 diplomatas russos, enquanto a França anunciou a saída de 25. A ministra das Relações Exteriores alemã, Annalena Baerbock, disse na ocasião que a decisão de expulsar os diplomatas russos foi uma resposta à “brutalidade inacreditável” do Kremlin na Ucrânia. Paris, por sua vez, alegou que o movimento também estava diretamente relacionado ao massacre em Bucha.
Uma nova leva de países europeus anunciaram a expulsão de integrantes do corpo diplomático russo no mês de abril. Juntos, Portugal, Espanha, Dinamarca, Suécia e Itália expulsaram mais de 80 indivíduos acusados de usar as funções diplomáticas para acobertar o fato de servirem à inteligência russa.
Ao anunciar a decisão, a Dinamarca sequer referiu-se aos expulsos como diplomatas. “Estamos enviando um sinal claro a Moscou de que não aceitaremos que oficiais de inteligência russos estejam espionando em solo dinamarquês. Eles representam um risco para a nossa segurança nacional que não podemos ignorar”, disse um comunicado assinado pelo ministro das Relações Exteriores, Jeppe Kofod.
Ainda no mês passado, Áustria, Eslovênia, Estônia, Finlândia, Grécia, Macedônia do Norte, Noruega e Romênia fizeram o mesmo movimento de exclusão de cidadãos russos. Fora da Europa, o Japão também agiu e expulsou oito diplomatas russos em abril.
Espionagem sob o manto da diplomacia
Dentro da União Europeia (UE), embora seja dependente das fontes de energia provenientes da Rússia, a Alemanha tem liderado as medidas contra o governo Putin. O país, maior exportador de gás natural russo em todo o mundo, expulsou 40 diplomatas de Moscou desde o começo da guerra, deu abrigo ao principal opositor do presidente Putin, caçou espiões em seu próprio território e até proibiu uma emissora de televisão russa de transmitir.
Moscou e Berlim começaram a se afastar em 2014, quando da anexação da Crimeia, que gerou uma série de sanções à Rússia. Desde então, liderada pela Alemanha da então chanceler Angela Merkel, a UE proibiu a venda para empresas russas de bens de dupla utilização, aqueles que poderiam também ter uso militar. Assim, os casos de espionagem passaram a se acumular.
Entretanto, o evento que mais contribuiu para a ruptura entre os governos correu em 2020. Foi o envenenamento do principal opositor do Kremlin, Alexei Navalny, que aliados dele atribuem ao presidente russo Vladimir Putin. A vítima se recuperou na capital alemã antes de retornar à Rússia, onde está preso desde fevereiro de 2021.
A Ucrânia, agora integralmente invadida por tropas de Moscou, também detectou forte atividade de inteligência russa nos últimos anos. Um relatório divulgado pelo SBU (Serviço de Segurança da Ucrânia, da sigla em inglês), no final de 2021, aponta que mais de 20 oficiais da inteligência russa operavam no país sob cobertura diplomática e foram denunciados desde 2014. O trabalho já levou aos tribunais mais de 180 réus, que foram posteriormente considerados culpados por traição e espionagem.
Quando anunciou a expulsão de 45 indivíduos do corpo diplomático da Rússia, a Polônia deixou claro que a espionagem foi um fator preponderante para a decisão. “São pessoas que operam usando seu status diplomático, mas na realidade realizam atividades de inteligência contra a Polônia”, disse Stanislaw Zaryn, porta-voz de segurança do Estado.
“A Rússia está travando uma guerra bárbara contra a Ucrânia há mais de três semanas. Nós e outros países ocidentais somos tratados como um inimigo chave”, disse Lukasz Jasina, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, ao justificar a decisão, em 23 de março. “Tolerar ainda mais esse tipo de atividade ilegal dos serviços russos criaria uma ameaça particular à segurança da Polônia, mas também aos nossos aliados da Otan e da União Europeia, com quem coordenamos todas essas atividades”.
A própria Otan foi alvo dos espiões, tendo anunciado, em outubro do ano passado, a expulsão de oito diplomatas russos. Como consequência, à época, a aliança ainda reduziu pela metade a equipe de Moscou dentro de seu quartel-general.
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