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quarta-feira, 25 de maio de 2022

Entidades e governos ocidentais contestam viagem histórica de Bachelet à China

A histórica viagem que a alta comissária da ONU (Organização das Nações Unidas) para os direitos humanos, Michelle Bachelet, realiza à China desde a última segunda-feira (23) tem gerado críticas de grupos humanitários e governos ocidentais. Segundo esses, a passagem da chilena pelo país asiático pode servir para mascarar os abusos cometidos por Beijing contra minorias como a dos uigures, em Xinjiang, principal tema da visita. As informações são da rede Radio Free Europe.

Xinjiang, onde muitos países acusam a China de genocídio contra os uigures, está na rota de Bachelet, cujo objetivo é justamente averiguar as condições dos direitos humanos no país. A repressão em Hong Kong, no Tibete e na Mongólia interior também estão na pauta. Trata-se da primeira visita da autoridade máxima em direitos humanos da ONU ao país desde 2005.

A alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, em pronunciamento em evento do jornal norte-americano “New York Times”, em março de 2013 (Foto: UN Women/Catianne Tijerina)

Em parte, a desconfiança global deve-se ao mistério que cerca a visita, cujos detalhes são mantidos em segredo pela China e pela ONU. Na visão dos críticos, Beijing vai maquiar os problemas e assim reduzir o escrutínio global no que tange à questão dos direitos humanos.

“O governo chinês está cometendo violações de direitos humanos em um escopo e escala inimagináveis desde a última visita de um alto comissário, em 2005, em parte porque não há medo de responsabilização”, disse Sophie Richardson, diretora da ONG Human Rights Watch (HRW) para a China. “A alta comissária precisa trabalhar para acabar, não para viabilizar essa percepção”.

Segundo a diretora da HRW, o governo chinês não permitirá que a alta comissária “veja qualquer coisa que eles não querem que ela veja”. Também não será permitido a ela ter acesso livre a defensores de direitos humanos e vítimas de abusos. “O legado de Bachelet como alta comissária será medido por sua disposição de responsabilizar um Estado poderoso por crimes contra a humanidade cometidos sob seu comando”, afirmou Richardson.

O temor é compartilhado por Washington. “Estamos profundamente preocupados com a próxima visita”, disse o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Ned Price, em entrevista coletiva na última sexta-feira (20). Segundo ele, o governo norte-americano não espera que a China “conceda o necessário acesso para conduzir uma avaliação completa e não manipulada do ambiente de direitos humanos em Xinjiang”.

Corrobora essa preocupação a denúncia de que Beijing teria orientado os uigures em Xinjiang a não conversarem com estrangeiros. “Sessões de estudos políticos” também teriam sido organizadas na região a fim de preparar terreno para a presença da comitiva da ONU.

Ao fim da visita, o ACNUDH (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos) pretende publicar um relatório que vem sendo preparado há três anos sobre os direitos humanos na China. Ele é baseado em entrevistas com sobreviventes de campos de internação e estudiosos do tema e em evidências de código aberto, como imagens de satélite e documentos estatais vazados.

“É hora de a ONU reconhecer oficialmente o corajoso testemunho público de sobreviventes, milhares de páginas de documentos do governo chinês vazados, pesquisas meticulosas revisadas por pares e centenas de imagens de satélite condenatórias de campos de concentração”, disse Omer Kanat, diretor executivo do Uyghur Human Rights Project. “A viagem não passará de um exercício de propaganda”.

Por que isso importa?

A província de Xinjiang, no noroeste da China, faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes étnicas e linguísticas. Ali vive a comunidade uigur, uma minoria muçulmana de raízes turcas que sofre perseguição do governo chinês, com acusações de abusos diversos.

Os uigures, cerca de 11 milhões, enfrentam discriminação da sociedade e do governo chinês e são vistos com desconfiança pela maioria han, que responde por 92% dos chineses. Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.

Estimativas apontam que um em cada 20 uigures ou cidadãos de minoria étnica já passou por campos de detenção de forma arbitrária desde 2014.

O governo de Joe Biden, nos EUA, foi o primeiro a usar o termo “genocídio” para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e mais recentemente a Lituânia se juntou ao grupo.

A China nega as acusações de que comete abusos em Xinjiang e diz que as ações do governo na região têm como finalidade a educação contraterrorismo, a fim de conter movimentos separatistas e combater grupos extremistas religiosos que eventualmente venham a planejar ataques terroristas no país.

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Zhao Lijian, afirma que o trabalho forçado uigur é “a maior mentira do século”. “Os Estados Unidos tanto criam mentiras quanto tomam ações flagrantes com base em suas mentiras para violar as regras do comércio internacional e os princípios da economia de mercado”, disse ele.

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