O governo da Turquia anunciou na quinta-feira (26) que prendeu Abu al-Hassan al-Hashimi al-Quraishi, que no início de março foi anunciado como novo líder do Estado Islâmico (EI). Ele teria sido detido durante uma operação das forças antiterrorismo e da inteligência na semana passada, de acordo com a rede Voice of America (VOA).
A emissora turca OdaTV foi a primeira a noticiar a prisão de Abu al-Hassan, dizendo que as forças de segurança não precisaram disparar um único tiro durante a operação. Ele estava em uma residência em Istambul no momento da prisão e foi posteriormente levado para interrogatório.
A informação foi posteriormente confirmada à rede Bloomberg por dois altos funcionários do governo turco que preferiram não se identificar. Já o governo dos EUA disse, através do secretário de imprensa do Pentágono, John Kirby, que estava apurando a informação: “Não podemos confirmar os relatos sobre al-Qurashi”, afirmou ele.
O anúncio feito por Ancara nesta quinta é mais um duro golpe contra o EI. Em fevereiro, o presidente Joe Biden anunciou a morte de Abu Ibrahim al-Hashimi al-Qurashi, antecessor de Abu al-Hassan. Ele teria se suicidado em meio a uma operação das forças especiais dos EUA na Síria.
Quem é Abu al-Hassan?
O fato de que tanto a Turquia quanto seus aliados ocidentais não anunciaram oficialmente a detenção deve-se possivelmente à dificuldade para formalizar a identificação do preso.
O verdadeiro nome do líder do EI é um mistério. Abu al-Hassan al-Hashimi al-Quraishi é apenas um nome de guerra, usado para indicar que ele é um descendente do clã hachemita da tribo Qurashi, que por linhagem sanguínea o ligaria ao profeta Maomé. Há, entretanto, algumas teorias sobre quem é ele de fato.
Em fevereiro, uma reportagem da revista New Lines sugeriu que o próximo na linha de sucessão do EI, após a morte de Abu Ibrahim, era Bashar Khattab Ghazal al-Sumaidai. Conhecido também pelo apelido Ustath Zaid (Professor Zaid), ele vinha ganhando popularidade entre os jihadistas.
Posteriormente, em março, a agência Reuters afirmou que o grupo extremista vinha sendo liderado por Juma Awad al-Badri. Ele é o irmão de Abu Bakr al-Baghdadi, o primeiro comandante do Estado Islâmico, igualmente morto por forças norte-americanas na Síria, em 2019.
“Badri é um radical que se juntou a grupos jihadistas salafistas em 2003 e era conhecido por sempre acompanhar Baghdadi como companheiro pessoal e consultor jurídico islâmico”, disse um oficial das forças de segurança do Iraque que pediu para ter sua identidade preservada.
Por que isso importa?
Nos últimos anos, o EI se enfraqueceu financeira e militarmente. Em 2017, o exército iraquiano anunciou ter derrotado a organização no país, com a retomada de todos os territórios que ela dominava desde 2014. O grupo, que chegou a controlar um terço do Iraque, hoje mantém apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos, quase sempre focados em agentes do governo. Já as FDS (Forças Democráticas Sírias), uma milícia curda apoiada pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pela organização extremista na Síria.
Em fevereiro deste ano, o grupo sofreu mais um duro golpe quando o exército norte-americano anunciou ter matado Abu Ibrahim al-Hashimi al-Qurashi, principal líder da facção. Durante uma operação antiterrorismo dos EUA na Síria, ele explodiu uma bomba que carregava junto ao corpo, matando também mulheres e crianças que o acompanhavam. O evento foi semelhante a outro, em 2019, que terminou com a morte do líder anterior da organização extremista, Abu Bakr al-Baghdadi.
De acordo com um relatório do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) publicado em fevereiro de 2022, as perdas territoriais e de pessoal transformaram o EI, que antes controlava boas partes da Síria e do Iraque, em “uma insurgência principalmente rural, resistindo à pressão antiterrorista sustentada pelas forças da região”.
A pandemia também continua a ser um desafio, pois impede as “viagens transfronteiriças, diminuindo as ameaças decorrentes de fluxos de combatentes em zonas de conflito e viagens terroristas mais amplas em zonas de não conflito”. Por outro lado, a estagnação do terrorismo em meio à onda de Covid-19 aumenta as “oportunidades de recrutamento e radicalização online”, criando a perspectiva de uma retomada futura das ações extremistas globais.
Outro risco que o grupo oferece é a presença de milhares de ex-combatentes em prisões e campos de deslocados em várias partes do mundo. Devolvê-los a seus países de origem e processá-los judicialmente é um desafio para os Estados-Membros da ONU, e os estabelecimentos que abrigam os extremistas são um potencial alvo de ataques para o EI. Exatamente como ocorreu na prisão de Ghwayran, na cidade de al-Hasakah, na Síria, invadida pelo grupo com a meta de libertar seguidores.
“Devido à capacidade severamente degradada, a sobrevivência futura do EI depende de sua capacidade de reabastecer as fileiras por meio de tentativas mal concebidas, como o ataque a Hasakah”, afirmou o major-general norte-americano John W. Brennan Jr., comandante da força de coalização liderada pelos EUA para combater o EI. Segundo ele, a ação na prisão síria gerou enorme prejuízo ao grupo terrorista, que “sentenciou à morte muitos dos seus que participaram deste ataque”.
Atualmente, o principal reduto do EI é o continente africano, onde consegue se manter relevante graças ao recrutamento online e à ação de grupos afiliados regionais. A expansão do grupo em muitas regiões da África desde o início de 2021 é alarmante e pode marcar sua retomada de força. No Sudeste Asiático, ao contrário, os países da região têm obtido sucesso significativo em interromper o terrorismo de facções afiliadas.
No Brasil
Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.
Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.
Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.
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