Desde o início da guerra na Ucrânia, no dia 24 de fevereiro, a Rússia já teria registrado as mortes de ao menos 12 generais no conflito, segundo informações das forças ucranianas reproduzidas pelo jornal The New York Times. Esse número elevado de baixas tende a impactar severamente no desempenho das tropas de Moscou, de acordo com analistas militares ouvidos pelo jornal independente The Moscow Times.
Para se ter ideia do que essa estatística representa, nos dez anos da guerra do Afeganistão, travada pela antiga União Soviética, morreram apenas seis generais. Trata-se de uma patente que geralmente leva 15 anos para ser conquistada e que coloca sob o comando de cada um desses oficiais dezenas de milhares de soldados.
“Cada morte de um general torna as Forças Armadas russas menos eficazes. Pode levar dias ou até semanas para substituí-los”, disse o analista militar independente Pavel Luzhin. Segundo ele, é preciso treinar os futuros comandantes, estabelecer relações com subordinados e repassar a eles os detalhes da situação militar.
A própria Rússia confirmou algumas das mortes, como a do major general Andrei Sukhovetsky, em abril. Outras, no entanto, Moscou nega, a fim de reduzir o impacto das notícias negativas sob a população russa, como parte da campanha de propaganda estatal.
Foi o caso do tenente general Andrei Mordvichev, cuja morte foi anunciada por Kiev e desmentida por Moscou através da emissora estatal Canal Um, que classificou a notícia como “falsa”.
Independente dos números reais, é fato que a Rússia tem enfrentado problema para lidar com a perda de oficiais de alta patente. De acordo com o site independente russo Mediazona, ao menos 317 oficiais russos foram mortos na Ucrânia, um terço dos quais são funcionários seniores, como majores, tenentes-coronéis e coronéis
O que ajuda a explica o número elevado de baixas nos mais altos postos do exército russo é o fato de que muitos deles têm ido ao campo de batalha com uma frequência incomum. “Se ele não obtiver informações, e os oficiais não fornecerem informações, isso aproxima os generais dos combates”, disse Sam Cranny-Evans, analista militar do think tank britânico Royal United Services Institute.
Segundo Cranny-Evans, a proximidade entre os generais e importantes figuras do Kremlin, que poderia sugerir privilégios, na verdade faz crescer a responsabilidade desses militares e acaba por deixá-los mais expostos. “Alguns generais serão amigos de Putin, ou associados do [ministro da Defesa Sergei] Shoigu e do [chefe do exército Valery] Gerasimov, em um grau em que os generais dos exércitos ocidentais não são. Então, haverá uma responsabilidade pessoal de verificar se tudo está indo bem”.
O próprio Gerasimov, terceira figura mais importante das forças armadas russas, quase foi morto na cidade ucraniana de Izyum. Informadas sobre a visita dele, as tropas ucranianas prepararam um ataque, mas chegaram um pouco tarde, de acordo com o The New York Times. Ainda assim, teriam matado cerca de 200 militares russos, entre eles um general.
“Nossa suposição de trabalho é de que ele estava lá porque há um reconhecimento de que eles ainda não resolveram todos os seus problemas”, disse um funcionário do governo norte-americano com conhecimento dos fatos e que pediu anonimato.
O major general morto em Izyum seria Andrei Simonov, encarregado do aparato bélico tecnológico da Rússia. Com ele teriam morrido outros oficiais de alta patente, que costumam acompanhar seus superiores. “Eles trabalham em conjunto com seus coronéis e majores. Então, se um general morre, geralmente significa que coronéis e oficiais também morrem”, afirmou Luzhin.
O que tem ajudado bastante a Ucrânia a atingir tal sucesso é o apoio da inteligência norte-americana. Dados fornecidos por Washington, associados ao trabalho da própria inteligência ucraniana, permitem a Kiev antecipar os movimentos do inimigo e determinar com precisão a localização dos militares russos no campo de batalha.
Segundo dois funcionários do governo norte-americano que pediram para não serem identificados, há casos de comunicação interceptada que permitiu à Ucrânia bombardear posições russas onde estavam oficiais, exatamente como ocorreu em Izyum.
O que aumenta o problema para Moscou é o fato de que os mortos geralmente são oficiais com vasta experiência de combate, tendo lutado no Afeganistão, na Chechênia, na Síria e em outras guerras envolvendo a Rússia nos últimos anos.
Tais baixas, na visão dos analistas, tende a impactar cada vez mais no desempenho das forças armadas russas na Ucrânia. “Há espaço para a perda de uma enorme quantidade de experiência”, disse Cranny-Evans. “Essas perdas serão preocupantes do ponto de vista russo”.
Por que isso importa?
A escalada de tensão entre Rússia e Ucrânia, que culminou com a efetiva invasão russa ao país vizinho, no dia 24 de fevereiro, remete à anexação da Crimeia pelos russos, em 2014, e à guerra em Donbass, que começou naquele mesmo an. Aquele conflito foi usado por Vladimir Putin como argumento para justificar a invasão integral, classificada por ele como uma “operação militar especial”.
“Tomei a decisão de uma operação militar especial”, disse Putin pouco depois das 6h de Moscou (0h de Brasília) de 24 de fevereiro. Cerca de 30 minutos depois, as primeira explosões foram ouvidas em Kiev, capital ucraniana, e logo em seguida em Mariupol, no leste do país.
No início da ofensiva, o objetivo das forças russas era dominar Kiev, alvo de constantes bombardeios. Entretanto, diante da inesperada resistência ucraniana, a Rússia foi forçada a mudar sua estratégia. As tropas, então, começaram a se afastar de Kiev e a se concentrar mais no leste ucraniano, a fim de tentar assumir definitivamente o controle de Donbass e de outros locais estratégicos naquela região.
Em meio ao conflito, o governo da Ucrânia e as nações ocidentais passaram a acusar Moscou de atacar inclusive alvos civis, como hospitais e escolas, dando início a investigações de crimes de guerra ou contra a humanidade cometidos pelos soldados do Kremlin.
O episódio que mais pesou para as acusações foi o massacre de Bucha, cidade ucraniana em cujas ruas foram encontrados dezenas de corpos após a retirada do exército russo. As imagens dos mortos foram divulgadas pela primeira vez no dia 2 de abril, por agências de notícias, e chocaram o mundo.
O jornal The New York Times realizou uma investigação com base em imagens de satélite e associou as mortes em Bucha a tropas russas. As fotos mostram objetos de tamanho compatível com um corpo humano na rua Yablonska, entre 9 e 11 de março. Eles estão exatamente nas mesmas posições em que foram descobertos os corpos quando da chegada das tropas ucranianas, conforme vídeo feito por um residente da cidade em 1º de abril.
Fora do campo de batalha, a Rússia tem sido alvo de todo tipo de sanções. As esperadas punições financeiras impostas pelas principais potencias globais já começaram a sufocar a economia russa, e o país tem se tornado um pária global. Desde a invasão da Ucrânia, em 24 de fevereiro, mais de 600 empresas ocidentais deixaram de operar na Rússia, seja de maneira temporária ou definitiva, parcial ou integral.
Os mortos de Putin
Desde que assumiu o poder na Rússia, em 1999, o presidente Vladimir Putin esteve envolvido, direta ou indiretamente, ou é forte suspeito de ter relação com inúmeros eventos, que levaram a dezenas de milhares de mortes. A lista de vítimas do líder russo tem soldados, civis, dissidentes e até crianças. E vai aumentar bastante com a guerra que ele provocou na Ucrânia.
Na conta dos mortos de Putin entram a guerra devastadora na região do Cáucaso, ações fatais de suas forças especiais que resultaram em baixas civis até dentro do território russo, a queda suspeita de um avião comercial e, em 2022, a invasão à Ucrânia que colocou o mundo em alerta.
A Referência organizou alguns dos principais incidentes associados ao líder russo. Relembre os casos.
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