O soldado russo Vadim Shishimarin, primeiro militar a enfrentar um processo por crime de guerra após três meses de conflito na Ucrânia, foi condenado à prisão perpétua nesta segunda-feira (23) por matar um civil desarmado no dia 28 de fevereiro, quatro dias após o início da invasão. As informações são da rede CNN.
Shishimarin já havia se declarado culpado à Justiça ucraniana na última quarta-feira (18), em Kiev, por matar Oleksandr Shelipov, de 62 anos, no vilarejo de Chupakhivka, na região nordeste de Sumy. Antes de dar o veredicto, o tribunal, com base no direito humanitário internacional, disse que o soldado de 21 anos havia “cometido uma ofensa criminal”.
A ação do soldado foi detalhada na corte.
“Shishimarin viu um civil na calçada. Sabendo que Shelipov é um civil e está desarmado e não representa nenhuma ameaça para ele, dispara vários tiros de seu fuzil”, descreveu o tribunal, acrescentando que “a causa da morte de Shelipov foi um tiro na cabeça que resultou no esmagamento do crânio”. A sentença poderá ser apelada no prazo de 30 dias.
As tropas russas podem encarar mais julgamentos por crimes de guerra, segundo apontou o promotor Andriy Sunyuk. De acordo com ele, a condenação de Shishimarin sinaliza para isso.
“Acho que todas as outras agências de aplicação da lei irão seguir o caminho que percorremos”, observou.
Na Rússia, o porta-voz do presidente Vladimir Putin, Dmitry Peskov, declarou que o Kremlin não irá abandonar Shishimarin e irá procurar formas de ajudá-lo. Antes da sentença, ele já havia declarado que Moscou considera as acusações “inaceitáveis”, “ultrajantes” e “encenadas”.
Shishimarin, que integrava uma unidade de tanques, declarou em um vídeo divulgado pelo SBU (Serviço de Segurança da Ucrânia) que recebeu ordens para atirar no homem. Na última sexta (20), ao se declarar culpado, o soldado disse que estava “sinceramente arrependido”.
“Fiquei nervoso no momento em que isso aconteceu. Eu não queria matar. Mas aconteceu e eu não o nego”, assumiu.
Um dia antes, o condenado foi forçado a confrontar a viúva do homem que tirou a vida, a quem ele disse: “Entendo que você não poderá me perdoar, mas sinto muito”. A mulher questionou o russo sobre o que havia trazido ele à Ucrânia. “Você veio para nos defender? De quem? Você me defendeu de meu marido que você matou?”.
Para defesa, soldado “não é um assassino”
O advogado de Shishimarin, Viktor Ovsyannikov, argumentou que seu cliente é culpado de matar, mas que não se trata de um assassino.
“Shishimarin estava num estado de estresse causado pela situação de combate e pela pressão de seu comandante. A análise dessas circunstâncias me permite concluir que Shishimarin não tinha intenção direta de assassinato”, disse a defesa, acrescentando que ele e seus colegas não estavam conscientes de que suas ações “resultariam em mortes em massa não só de militares, mas também de civis”.
O massacre de Bucha
A pressão global por punições à Rússia, às suas tropas e ao presidente Putin aumentou bastante depois que os corpos de dezenas de pessoas foram encontrados nas ruas de Bucha, quando as tropas locais reconquistaram a cidade três dias após a retirada do exército russo. As imagens dos mortos foram divulgadas pela primeira vez no dia 2 de abril, por agências de notícias, e chocaram o mundo.
As fotos mostram pessoas mortas com as mãos amarradas atrás do corpo, um indício de execução. Outros corpos aparecem parcialmente enterrados, com algumas partes à mostra. Há também muitos corpos em valas comuns. Nenhum dos mortos usava uniforme militar, sugerindo que as vítimas são civis.
“O massacre de Bucha prova que o ódio russo aos ucranianos está além de qualquer coisa que a Europa tenha visto desde a Segunda Guerra Mundial”, disse o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, em sua conta no Twitter.
Moscou, por sua vez, nega as acusações. Através do aplicativo russo de mensagens Telegram, o Ministério da Defesa russo disse que, “durante o tempo em que a cidade esteve sob o controle das forças armadas russas, nenhum morador local sofreu qualquer ação violenta”. O texto classifica as denúncias como “outra farsa, uma produção encenada e provocação do regime de Kiev para a mídia ocidental, como foi o caso em Mariupol com a maternidade“.
Entretanto, imagens de satélite da empresa especializada Maxar Technologies derrubam o argumento da Rússia. O jornal The New York Times realizou uma investigação com base nessas imagens e constatou que objetos de tamanho compatível com um corpo humano aparecem na rua Yablonska entre 9 e 11 de março. Eles estão exatamente nas mesmas posições em que foram descobertos os corpos quando da chegada das tropas ucranianas, conforme vídeo feito por um residente da cidade em 1º de abril.
Mais recentemente, Kiev alegou que apenas em Mariupol, que tem sido o principal alvo das tropas russas, foram encontrados ao menos 20 mil corpos de civis mortos. E acusa os soldados russos de depositarem cerca de nove mil cadáveres em valas comuns em Manhush, uma vila próxima à cidade portuária. Ao levar os corpos para outra localidade, o objetivo das tropas de Moscou seria esconder as evidências de crimes.
Vadym Boychenko, prefeito de Mariupol, comparou a descoberta ao massacre de Babi Yar, um fuzilamento em massa comandado nas proximidades de Kiev pelos nazistas em 1941, durante a Segunda Guerra Mundial. Os corpos de cerca de 33 mil pessoas, essencialmente judeus, foram encontrados em valas comuns na ocasião.
“O maior crime de guerra do século 21 foi cometido em Mariupol. Este é o novo Babi Yar. Então, Hitler matou judeus, ciganos e eslavos. Agora, Putin está destruindo os ucranianos”, disse Boychenko. “Precisamos fazer tudo o que pudermos para impedir o genocídio”.
Os mortos de Putin
Desde que assumiu o poder na Rússia, em 1999, o presidente Vladimir Putin esteve envolvido, direta ou indiretamente, ou é forte suspeito de ter relação com inúmeros eventos, que levaram a dezenas de milhares de mortes. A lista de vítimas do líder russo tem soldados, civis, dissidentes e até crianças. E vai aumentar bastante com a guerra que ele provocou na Ucrânia.
Na conta dos mortos de Putin entram a guerra devastadora na região do Cáucaso, ações fatais de suas forças especiais que resultaram em baixas civis até dentro do território russo, a queda suspeita de um avião comercial e, em 2022, a invasão à Ucrânia que colocou o mundo em alerta.
A Referência organizou alguns dos principais incidentes associados ao líder russo. Relembre os casos.
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