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sexta-feira, 27 de maio de 2022

Enviado da ONU diz que Taleban deve reverter restrições a mulheres afegãs

A segregação de gênero é uma das principais marcas do governo talibã desde que a organização retomou o poder no Afeganistão, tendo se espalhado por diversos setores da sociedade. Nesta quinta-feira (26), Richard Bennett, observador da ONU (Organização das Nações Unidas) em visita ao país declarou que as restrições do Taleban às mulheres têm o objetivo de torná-las “invisíveis”. As informações são do jornal Times of Israel.

Os talibãs, que após a tomada do poder central, em agosto de 2021, prometeram maior abertura e respeito à liberdade de expressão, têm escancarado suas contradições. O Ministério de Assuntos da Mulher do antigo governo foi fechado, o que restringiu expressivamente os direitos das mulheres. A maioria foi proibida de trabalhar e teve vetado o direito à educação.

Bennett, relator especial da ONU para direitos humanos no Afeganistão, afirmou em coletiva de imprensa na capital afegã que essas políticas mostram um “padrão de absoluta segregação de gênero e visam a tornar as mulheres invisíveis na sociedade”. Ele ficou 11 dias no país coletando informações.

“As autoridades não reconheceram a magnitude e a gravidade dos abusos cometidos, muitos deles em seu nome, bem como a responsabilidade de lidar com essa agressão e proteger toda a população”, disse Bennett.

Meninas têm aula no ensino fundamental em escola improvisada na província de Nangarhar (Foto: Unicef/Marko Kokic)

Durante sua passagem em terras afegãs, Bennett esteve em contato com líderes talibãs e percorreu o país, indo ao encontro de grupos da sociedade civil, ativistas de direitos humanos e comunidades minoritárias, incluindo os hazaras (muçulmanos xiitas, em sua maioria).

Recentemente, o chefe supremo dos talibãs, Hibatullah Akhundzada, ordenou que as mulheres se cobrissem totalmente em público, incluindo seus rostos. A ordem foi dada após combatentes terem dispersado nesta quinta-feira (26) um protesto de mulheres que reivindicava a reabertura de escolas secundárias para meninas.

“Forças furiosas do Taleban vieram e nos dispersaram”, disse à agência AFP Munisa Mubariz, organizadora da manifestação.

Em março, as escolas do Afeganistão foram fechadas para a entrada de meninas a partir do que, no Brasil, equivale à 6ª série do ensino fundamental. O governo não deu uma justificativa detalhada sobre a medida, apenas afirmou que que as instituições voltariam a funcionar “em breve”.

Para a comunidade internacional, o histórico de violações aos direitos humanos pelo Taleban, particularmente no que diz respeito ao tratamento dado às mulheres, é uma grande barreira para a aceitação do reconhecimento do novo governo. Em dezembro, uma Assembleia Geral da ONU adiou indeterminadamente o reconhecimento dos jihadistas como mandatários legítimos.

Algumas mulheres afegãs inicialmente resistiram às novas restrições do Taleban, realizando pequenos protestos nos quais exigiam o direito à educação e ao trabalho – alguns deles com uso de violência por parte dos radicais para desfazer a aglomeração. Muitas foram presas e mantidas incomunicáveis.

Segundo a agência catari Al Jazeera, o porta-voz do Taliban Inamullah Samangani disse que as autoridades “prestaram atenção às questões mencionadas pelo relator e estão trabalhando na questão da educação secundária das meninas”.

Por que isso importa?

A vida das mulheres tem sido particularmente dura no Afeganistão. Aquelas que tinham cargos no governo afegão antes da ascensão talibã seguem impedidas de trabalhar, e a cúpula do governo que prometia ser inclusiva é formada somente por homens. A perda do salário por parte de muitas mulheres que sustentavam suas casas tem contribuído para o empobrecimento da população afegã.

Na educação, o governo extremista mantém fora da escola as meninas acima dos sete anos de idade em diversas regiões do país. Algumas poucas províncias, entre as 34 existentes, permitiram a volta das meninas à escola. Assim, muitas têm recorrido a uma instituição que ministra aulas online, a fim de não interromperem os estudos.

Mulheres também não podem sair de casa desacompanhadas, e há relatos de solteiras e viúvas forçadas a se casar com combatentes. Para lembrar as afegãs de suas obrigações, os militantes ergueram cartazes em algumas áreas para informar os moradores sobre as regras. Em partes do país, as lojas estão proibidas de vender mercadorias a mulheres desacompanhadas.

Há também um código de vestimenta para as mulheres, forçadas a usar o hijab quando estão em público. Como forma de protestar, mulheres afegãs em todo o mundo iniciaram um movimento online, postando fotos nas redes sociais com tradicionais roupas afegãs coloridas, sempre acompanhadas de hashtags como #AfghanistanCulture (cultura afegã) e #DoNotTouchMyClothes (não toque nas minhas roupas).

A proibição do esporte feminino é outra realidade sob o governo talibã. Embora o grupo extremista não tenha emitido uma nota oficial sobre o veto, ele se faz presente na rotina das atletas afegãs. Depois do críquete feminino, cuja proibição foi anunciada pelo vice-líder da comissão cultural do Taleban, Ahmadullah Wasiq, a repressão atingiu outra modalidade muito popular no país: o taekwondo.

O Afeganistão tem apenas duas medalhas olímpicas em sua história: dois bronzes conquistados pelo atleta do taekwondo Rohullah Nikpai em Beijing 2008 e Londres 2012. As conquistas de Nikpai no masculino popularizaram o esporte no país, inclusive entre as mulheres. Porém, agora que o Taleban assumiu o poder, a prática tem se restringido aos homens, e as escolas que ofereciam aulas de taekwondo para mulheres fecharam as portas.

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