O veto da Polônia e da Hungria sobre o orçamento europeu dos próximos sete anos, em oposição à obrigatoriedade de adesão a padrões democráticos, representa uma tendência de enfraquecimento do bloco.
Em entrevista à Bloomberg, o historiador Timothy Garton Ash afirma que, a longo prazo, a resistência dos países não deve se transformar em um total colapso – mas preocupa.
O acordo fechado entre o Conselho e Parlamento da UE, no dia 11, viabiliza um pacote de gastos histórico, de 1,8 trilhão de euros, que compreenderia os anos de 2021 a 2027. Sem o aval de todos os países-membros, no entanto, não é possível avançar na negociação.
A oposição de Varsóvia e Budapeste ao plano orçamentário pode, sim, representar um “risco existencial” à UE, disse Ash. Mas, segundo ele, o apoio de boa parte da população aos princípios democráticos deve retardar a formação de “novos Brexits”.
“Não se preocupe se Polexit ou Hungexit acontecerão em breve. Mas se não resolvermos essas questões, o que veremos não é um colapso da UE, mas definitivamente um enfraquecimento gradual do bloco”, pontuou.
Assim, a tendência é que a condicionalidade do Estado de direito diminua, disse o historiador especialista em geopolítica europeia. “Numa perspectiva de dez anos, a UE sobreviverá como uma comunidade de democracias liberais ou estará gradualmente a desintegrar-se”, apontou.
Democracias em declínio
Para Ash, a Hungria já não é mais uma democracia, mas um sistema híbrido-autoritário ou competitivo-autoritário. A história recente do país já soma a expulsão de universidades e anulação de licenças de veículos de comunicação pelo primeiro-ministro, Viktor Orbán.
O governo populista da Polônia, no entanto, tenta seguir a mesma direção. Há chances de reversão se houver eleições livres em 2023, como previsto.
“Na Hungria é mais difícil”, ressalvou Ash. “Orbán tem quase tudo sob seu controle. Se o Estado de direito e a democracia na Hungria receberem o apoio que deveriam receber do resto da UE, também pode ser reversível”.
Mas, sem resposta ao impasse sobre o acordo orçamentário, o mecanismo de condicionalidade do Estado de direito – que já é mais fraco do que o proposto pelo Conselho Europeu – pode se diluir ainda mais.
“Se for assim, a partir de janeiro devemos voltar a esta questão e mantê-la, porque ela está corroendo a própria base de todo o projeto europeu”, disse o historiador, ao ressaltar a expectativa de uma liderança alemã “mais firme”.
Agora é um jogo de resistências quem dá o tom ao futuro da UE, mergulhada em uma explosão de casos no segundo surto de Covid-19 e uma dívida estimada de mais de 100% do PIB (Produto Interno Bruto).
Mas ainda pode haver otimismo em relação aos recuos democráticos da Hungria e Polônia, como conclui Ash. “Como vemos na Polônia e na Hungria, quando há ameaça à democracia, as pessoas saem às ruas para defendê-la”.
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