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terça-feira, 1 de novembro de 2022

EUA sancionam o Estado Islâmico da Somália, inclusive um ‘apoiador vital’ do grupo no Brasil

O Departamento do Tesouro dos EUA impôs na terça-feira (1º) sanções econômicas ao Estado Islâmico (EI) da Somália, acusado de envolvimento com o tráfico de armas que alimenta a rede extremista islâmica no continente africano. Um membro da facção no Brasil, classificado por Washington como “apoiador vital” dos insurgentes, está entre os alvos da punição.

O indivíduo em questão foi identificado como Osama Abdelmongy Abdalla Bakr, que teria comandado uma operação de compra de armamento da Coreia do Norte (RPDC). “Bakr recebeu instruções diretas de um líder do EI e recebeu quase US$ 30 mil de líderes do EI em apoio aos seus esforços. Bakr buscou várias reuniões com funcionários da embaixada da RPDC no Brasil em um esforço para comprar armamento leve e tecnologia anti-drone para o benefício do EI”, diz relatório do Tesouro.

O documento não deixa claro se o terrorista citado ainda vive no Brasil. Além de participar da negociação de compra de armas com o governo norte-coreano, Bakr é acusado de ajudar indivíduos a imigrar e obter emprego em território brasileiro.

“Hoje, visamos diretamente as redes que financiam e suprem tanto o EI-Somália quanto o Al-Shabaab, apoiando seus atos violentos. O envolvimento dos designados hoje em outras atividades criminosas, incluindo pirataria e pesca ilegal, demonstra a extensão da integração do EI-Somália com redes ilícitas e outras organizações terroristas que operam na região”, disse o subsecretário do Tesouro para Terrorismo e Inteligência Financeira Brian E. Nelson.

Segundo os EUA, o EI ajudou a armar inclusive o Al-Shabaab, grupo somali ligado à Al-Qaeda que assumiu a autoria de um violento atentado em Mogadíscio ocorrido no último sábado (29). Mais de 120 pessoas morreram e dezenas seguem desaparecidas em virtude da explosão de dois carros-bomba perto do prédio do Ministério da Educação local.

O EI da Somália foi designado como um grupo terrorista pelo Departamento de Estado norte-americano em 2018. Agora, após anunciar as sanções, Washington afirmou que o grupo “comumente trabalha com outras organizações terroristas”, citando o Al-Shabaab, bem como contrabandistas e piratas locais.

Membros do grupo jihadista Estado Islâmico no Grande Saara (EIGS) (Foto: Divulgação)
Por que isso importa?

Nos últimos anos, o EI se enfraqueceu financeira e militarmente. Em 2017, o exército iraquiano anunciou ter derrotado a organização no país, com a retomada de todos os territórios que ela dominava desde 2014. O grupo, que chegou a controlar um terço do Iraque, hoje mantém apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos, quase sempre focados em agentes do governo. Já as FDS (Forças Democráticas Sírias), uma milícia curda apoiada pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pela organização extremista na Síria.

Em fevereiro deste ano, o grupo sofreu mais um duro golpe quando o exército norte-americano anunciou ter matado Abu Ibrahim al-Hashimi al-Qurashi, principal líder da facção. Durante uma operação antiterrorismo dos EUA na Síria, ele explodiu uma bomba que carregava junto ao corpo, matando também mulheres e crianças que o acompanhavam. O evento foi semelhante a outro, em 2019, que terminou com a morte do líder anterior da organização extremista, Abu Bakr al-Baghdadi.

De acordo com um relatório do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) publicado em fevereiro de 2022, as perdas territoriais e de pessoal transformaram o EI, que antes controlava boas partes da Síria e do Iraque, em “uma insurgência principalmente rural, resistindo à pressão antiterrorista sustentada pelas forças da região”.

A pandemia também continua a ser um desafio, pois impede as “viagens transfronteiriças, diminuindo as ameaças decorrentes de fluxos de combatentes em zonas de conflito e viagens terroristas mais amplas em zonas de não conflito”. Por outro lado, a estagnação do terrorismo em meio à onda de Covid-19 aumenta as “oportunidades de recrutamento e radicalização online”, criando a perspectiva de uma retomada futura das ações extremistas globais.

Outro risco que o grupo oferece é a presença de milhares de ex-combatentes em prisões e campos de deslocados em várias partes do mundo. Devolvê-los a seus países de origem e processá-los judicialmente é um desafio para os Estados-Membros da ONU, e os estabelecimentos que abrigam os extremistas são um potencial alvo de ataques para o EI. Exatamente como ocorreu na prisão de Ghwayran, na cidade de al-Hasakah, na Síria, invadida pelo grupo com a meta de libertar seguidores.

“Devido à capacidade severamente degradada, a sobrevivência futura do EI depende de sua capacidade de reabastecer as fileiras por meio de tentativas mal concebidas, como o ataque a Hasakah”, afirmou o major-general norte-americano John W. Brennan Jr., comandante da força de coalização liderada pelos EUA para combater o EI. Segundo ele, a ação na prisão síria gerou enorme prejuízo ao grupo terrorista, que “sentenciou à morte muitos dos seus que participaram deste ataque”.

Atualmente, o principal reduto do EI é o continente africano, onde consegue se manter relevante graças ao recrutamento online e à ação de grupos afiliados regionais. A expansão do grupo em muitas regiões da África desde o início de 2021 é alarmante e pode marcar sua retomada de força. No Sudeste Asiático, ao contrário, os países da região têm obtido sucesso significativo em interromper o terrorismo de facções afiliadas.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.

Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.

Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.

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