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domingo, 27 de novembro de 2022

Jovens recusam trabalho, geram escassez de mão de obra e afetam a economia da China

Para muitos chineses provenientes de áreas rurais do país, o trabalho na indústria sempre foi encarado como uma oportunidade valiosa, a melhor chance de escapar da pobreza. Entretanto, milhões de jovens hoje na faixa de idade entre 20 e 30 anos pensam diferente. A rejeição dessa parcela da população ao trabalho nas fábricas da China tem gerado escassez de mão de obra jovem e causa impacto na economia nacional, de acordo com reportagem da agência Reuters.

A alegação dos jovens chineses é a de que o trabalho nas fábricas paga pouco, exige muitas horas de trabalho exaustivo e oferece grandes riscos à integridade física. Assim, os empresários enfrentam um envelhecimento da mão de obra, com consequente redução da produtividade.

Uma alternativa para contornar a situação seria oferecer maiores salários e melhores condições. Isso, no entanto, colocaria em risco a vantagem competitiva da indústria local. Outra opção, o investimento em novas tecnologias de automação, tornou-se inviável devido à inflação e aos elevados riscos de obter empréstimos no país atualmente.

Jovens no metrô de Beijing, China, agosto de 2019 (Foto: Zhang Kaiyv/Unsplash)

A rejeição dos jovens ao árduo trabalho nas linhas de produção gera uma situação inusitada. Por um lado, cerca de 18% dos chineses entre os 16 e 24 anos de idade estão desempregados. Por outro, mais de 80% dos fabricantes do país sofrem com a falta de mão de obra, sobretudo a jovem. O Ministério da Educação da China projeta quase 30 milhões de vagas não preenchidas na indústria até 2025.

Segundo Klaus Zenkel, presidente da Câmara de Comércio Europeia, entidade sediada no sul da China, o crescimento vertiginosos da economia nacional nos últimos anos fez crescer a ambição dos jovens, cada vez mais focados na formação superior e menos no trabalho braçal. Prova disso, em 2022 houve uma injeção no mercado de trabalho de 10,8 milhões de recém-formados.

“Cedo ou tarde, precisamos atrair mais jovens, mas é muito difícil. Os candidatos vão dar uma olhada rápida e dizer ‘não, obrigado, isso não é para mim'”, disse ele. “Se você é jovem, é muito mais fácil fazer esse trabalho, subir a escada, fazer algum trabalho com máquinas, manusear ferramentas e assim por diante. Mas a maioria dos nossos instaladores tem entre 50 e 60 anos”. 

De acordo com um homem que dirige uma companhia de baterias elétricas e pediu anonimato, mesmo os salários 5% mais altos que ele ofereceu não foram capazes de atrair os jovens. Já a automação tornou-se um problema para os atuais funcionários, cuja idade elevada, segundo o indivíduo, dificulta a absorção das informações necessárias para lidar com o equipamento moderno.

Com o aumento dos salários e a automação temporariamente descartados, surge uma terceira alternativa para manter a produção e o faturamento elevados: mudar as fábricas para outros países com mais mão de obra barata, como Vietnã e Índia. Os elevados custos, porém, também desencorajam a maioria dos empresários a migrar suas linhas de produção.

Para os economistas, a solução pode surgir naturalmente com o passar do tempo. A tendência é a de que, nos próximos anos, os jovens e os empregadores sejam obrigados a reduzir suas ambições. “A situação do desemprego para os jovens deveria ser muito pior para que a incompatibilidade fosse corrigida”, disse Zhiwu Chen, professor de finanças da Universidade de Hong Kong.

Lei do mínimo esforço

Também tem contribuído para afastar os jovens do mercado de trabalho um curioso movimento que nasceu na internet e ganhou espaço na China. Trata-se do tang ping, do inglês lying flat (ficar deitado, em tradução livre). A ideia é basicamente fazer o mínimo necessário para sobreviver, abdicando assim da disputa ferrenha por ascensão social que move a segunda maior economia do mundo.

O movimento levou o governo a impor uma censura online a termos associados ao tang ping. A ideia surgiu a partir de um post que viralizou em abril de 2021, quando um indivíduo chamado Luo Huazhong fez uma publicação despretensiosa na rede social chinesa Baidu Tieba. “A vida é apenas deitar, deitar e deitar”, disse ele no texto, intitulado “Ficar deitado é justiça”.

Numa sociedade competitiva como a chinesa, o lying flat entrou na mira do repressor governo Xi Jinping. No dia 15 de outubro do ano passado, o presidente se dirigiu aos adeptos da lei do mínimo esforço em discurso reproduzido pelo Qiushi, principal publicação sobre teoria política do Partido Comunista Chinês (PCC).

“É preciso evitar a estagnação da classe social, desobstruir os canais de ascensão social, criar oportunidades para que mais pessoas se tornem ricas e formar um ambiente de melhoria do qual todos participem, evitando a involução e o achatamento”, disse Xi.

Porém, a mão de ferro de Beijing parece não intimidar a juventude chinesa, que transformou o lying flat em um movimento online difundido através das redes sociais locais. Isso aumenta a apreensão do governo, que enxerga a inércia da juventude como uma ameaça à ordem social e econômica do país. Os efeitos podem influenciar inclusive na baixa taxa de natalidade, atualmente um grande problema chinês.

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