Muitos usuários do Twitter que fizeram recentemente buscas na rede social por informações sobre os protestos ocorridos na China foram bombardeados por conteúdo suspeito, como spam e pornografia. Para especialistas em desinformação digital, provavelmente trata-se de uma ação online de Beijing para censurar as cenas de desordem social registradas no país. As informações são da rede CNN.
A China impôs severos bloqueios em diversas cidades, entre elas Beijing e Xangai, para tentar conter o mais recente surto de Covid-19. Impedidas de sair de casa e sujeitas a testes e mais testes anti-Covid, os cidadãos se rebelaram. Em Xinjiang, no noroeste do país, um incêndio que matou dez pessoas em meio aos bloqueios desencadeou grandes manifestações.
Na segunda-feira (28), o governo ampliou a segurança nas ruas para conter eventuais novos protestos, incomuns no repressor regime de Xi Jinping. Também foi anunciada a flexibilização de algumas regras, como o fim das barreiras policiais em blocos de edifícios onde foram registrados casos da doença em Beijing. Já em Guangzhou, a testagem em massa foi reduzida, segundo a agência Associated Press (AP).
No mesmo dia em que a segurança foi reforçada, surgiram os primeiros relatos de conteúdo incomum exibido nas buscas do Twitter. Muitas das postagens com spam e pornografia analisadas se originaram de contas criadas há poucos dias e praticamente sem nenhum seguidor, um indício de que trata-se de uma ação coordenada.
“Pesquise qualquer cidade que tenha visto um aumento nos casos de Covid ou tenha protestos nas ruas no fim de semana e você verá a mesma coisa”, disse Charlie Smith, pseudônimo de um dos fundadores do GreatFire.org, grupo que funciona de forma anônima e monitora a censura online na China. “Isso está acontecendo não apenas sobre Xinjiang, mas sobre qualquer questão chinesa delicada no momento”.
A possibilidade de que o conteúdo seja proveniente de um grupo independente, segundo Smith, foi praticamente descartada porque a pornografia é censurada na China desde o início da repressão online. O próprio Twitter é bloqueado no país, mas ainda assim estima-se que algo entre três e dez milhões de chineses sejam usuários da rede social.
Alex Stamos, pesquisador de desinformação na internet, reforçou a suspeita. Segundo ele, uma análise feita pelo programa Observatório da Internet de Stanford, do qual é diretor, sugere tratar-se de um “ataque intencional para jogar lixo informativo e reduzir a visibilidade externa dos protestos na China”.
Por que isso importa?
Beijing tem adotado uma severa política de combate ao coronavírus, com relatos de milhões de cidadãos trancados em casa durante períodos longos e empresas impedidas de funcionar, impactando duramente nas vidas das pessoas e na economia do país.
Há relatos de chineses que morreram durante os períodos de confinamento por falta de atendimento médico para doenças diversas da Covid-19 e até de fome, devido à impossibilidade de sair de casa para obter alimento.
Em maio, Tedros Ghebreyesus, chefe da OMS (Organização Mundial de Saúde), contestou a política “Zero Covid” de Beijing, o que levou o governo a censurá-lo. Declarações dadas por ele foram excluídas de ao menos dois canais, o serviço de microblogs Weibo e o aplicativo de mensagens WeChat.
A autoridade de saúde disse não aprovar a radical política chinesa de trancar a população em casa, uma iniciativa que começou em Xangai, durou seis semanas e se repetiu em outras cidades do país em meio à rápida disseminação da variante Ômicron.
“Quando falamos sobre a estratégia ‘Zero Covid’, não achamos que seja sustentável, considerando o comportamento do vírus agora e o que prevemos no futuro”, disse o chefe da OMS. “Discutimos esta questão com especialistas chineses e indicamos que a abordagem não será sustentável. Acho que uma mudança será muito importante”.
Em abril, a ONG Human Rights Watch (HRW) alertou para os danos que o confinamento vem causando a seus cidadãos, particularmente em Xangai. “As autoridades de Xangai impuseram medidas draconianas de bloqueio desde março de 2022, que impediram significativamente o acesso das pessoas a cuidados de saúde, alimentos e outras necessidades vitais”, disse a entidade na ocasião.
No caso específico de Xangai, pessoas teriam morrido porque não foram autorizadas a sair de casa sequer para tratamento médico de doenças crônicas que enfrentam. E de crianças separadas de seus pais porque um ou mais integrantes da família testaram positivo para Covid-19. Muitos cidadãos teriam ficado sem comida em casa, devido à longa duração do bloqueio, que os pegou desprevenidos.
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