Um vídeo compartilhado através do aplicativo de mensagens Telegram pela equipe do oposicionista russo Alexei Navalny mostra um indivíduo supostamente recrutando presos para que se juntem às forças da Rússia em ação na Ucrânia. Em troca, recebem a promessa de liberdade, com os crimes perdoados pelo governo. As informações são da rede Radio Free Europe.
No vídeo, o homem fala a um grande grupo de presos, todos com uniformes escuros. Ele se apresenta como membro da organização paramilitar Wagner Group e explica as condições que devem ser atendidas para o recrutamento. O contrato é para seis meses de serviços no campo de batalhas. Entre os avisos, ele diz que desertores serão fuzilados.
“Não há como voltar à prisão depois disso”, diz o homem, afirmando que os sobreviventes terão o direito de escolher se preferem continuar a serviço do Wagner Group ou não. Independentemente da decisão, se servirem e sobreviverem, receberão o perdão presidencial e serão libertados.
O sujeito mostrado nas imagens se parece fisicamente com Evgeny Prigozhin, aliado do presidente russo Vladimir Putin e tido como principal financiador do Wagner Group. Ele é popularmente conhecido como “chef de Putin” devido aos muitos contratos de fornecimento de refeições ao governo firmados com empresas dele.
Denúncia antiga
Foi o jornal Fontanka quem primeiro revelou os esforços do Wagner Group para recrutar novos membros em presídios russos. A reportagem citava o caso de uma mãe que tentava encontrar o filho, que cumpria pena de dois anos por roubo de carro quando desapareceu da prisão. Mais tarde, ele foi localizado em Luhansk, uma cidade no leste da Ucrânia então sob o controle da Rússia.
A ONG de direitos humanos Gulagu.net, que monitora o sistema carcerário do país, reforçou a denúncia. Vladimir Osechkin, chefe da entidade, citou justamente a presença de Prigozhin em algumas colônias penais, dizendo que os principais locais de recrutamento são as regiões de São Petesburgo, Tver, Ryazan, Smolensk, Rostov, Voronezh e Lipetsk.
Um detento que teria presenciado o recrutamento afirmou que condenados por homicídio premeditado e roubo são especialmente bem-vindos, nas palavras do recrutador. Já presos condenados por estupro, tráfico de drogas ou terrorismo são proibidos de se juntar ao Wagner Group.
Prigozhin, por sua vez, disse que tais alegações são “falsas” e visam a “criar uma imagem negativa” da Rússia e seus governantes. Ele chegou a pedir a abertura de uma investigação contra o Fontanka, a autora da reportagem, Ksenia Klochkova, e o editor-chefe Aleksandr Gorshkov.
Opções emergenciais
A Rússia tem enfrentado sérias dificuldade para encontrar novos soldados dispostos a combater na Ucrânia, com a guerra tendo ultrapassado a marca dos seis meses. A principal razão para Moscou buscar novos combatentes é o alto número de baixas em suas fileiras, o que levou a uma preocupante redução de contingente.
Embora o país não divulgue dados oficiais, Washington apresentou uma estimativa em 8 de agosto: entre 70 mil e 80 mil soldados russos foram mortos ou feridos na guerra. Alguns dias antes, em 20 de julho, William Burns, diretor da CIA (Agência Central de Inteligência), afirmou que 15 mil soldados russos haviam morrido na guerra até então.
Putin já havia determinado o aumento legal do efetivo de suas forças armadas. Um decreto assinado por ele criou 137 mil novos postos militares, aumentando em 10% o número de combatentes ativos e atingindo assim um efetivo de 1,15 milhão. Não haverá aumento nas vagas destinadas a civis, que completam o quadro das forças armadas. Atualmente, há 1,9 milhão de postos, entre civis e militares. Com o novo recrutamento, que entra em vigor no dia 1º de janeiro de 2023, serão cerca de 2,05 milhões.
Enquanto o decreto não vigora, Moscou recorre invariavelmente a combatentes longe das condições ideais. Soldados que participaram do conflito dizem ter passado por um treinamento curto, com duração entre cinco e dez dias. Uma prática que contraria o Ministério da Defesa da Rússia, segundo o qual uma preparação de quatro semanas é necessária para considerar o soldado apto.
Existe ainda a delicada situação dos conscritos, soldados recrutados pelo governo e enviados ao campo de batalha mesmo contra a própria vontade. Nessas situações, o envio à guerra só é permitido pela legislação russa após quatro meses de serviço militar. O tema é sensível porque o governo teme insatisfação generalizada no país caso obrigue os cidadãos a combater.
Desde o início do conflito, Moscou afirma que apenas soldados profissionais fazem parte do que o governo classifica como “operação militar especial“. Em março, porém, o Ministério da Defesa admitiu que alguns conscritos foram enviados por engano, mas já teriam sido levados de volta à Rússia. Inclusive, houve a promessa de punições aos oficiais que os enviaram à guerra contra a própria vontade.
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