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domingo, 11 de setembro de 2022

ONG destaca ataques do EI-K contra minorias afegãs e contesta ineficiência do Taleban

Como governante de fato do Afeganistão, o Taleban tem sido ineficiente em sua obrigação de proteger a população local, especialmente algumas minorias xiitas, das ações violentas do Estado Islâmico-Khorasan (EI-K). A avaliação consta de um relatório publicado na última terça-feira (6) pela ONG Human Rights Watch (HRW).

O documento foca particularmente no caso dos hazaras, uma minoria xiita que foi perseguida pelos próprios talibãs durante a passagem anterior do grupo pelo poder, entre 1996 e 2001. Atualmente, embora tenham se aproximado dos radicais que governam o país, tornaram-se alvo frequente do EI-K.

De acordo com dados divulgados pela HRW, o EI-K assumiu a autoria de 13 ataques contra os hazaras desde 15 de agosto de 2021, quando o Taleban chegou ao governo, e pode ter sido responsável por ao menos outros três atentados não reivindicados. Setecentas pessoas morreram ou ficaram feridas nessas ações.

“Desde a tomada do Taleban, combatentes ligados ao Estado Islâmico cometeram vários ataques brutais contra membros da comunidade hazara enquanto iam para a escola, para o trabalho ou para rezar, sem uma resposta séria das autoridades do Taleban”, disse Fereshta Abbasi, pesquisador da ONG para o Afeganistão. “O Taleban tem a obrigação de proteger as comunidades em risco e ajudar as vítimas de ataques e suas famílias”.

Recentemente, em 17 de agosto, os próprios talibãs foram responsáveis pela morte de uma importante figura hazara. Mahdi Mujahid havia se unido aos talibãs, tornando-se um comandante no grupo radical que governa o país. Entretanto, ele rompeu com os líderes do governo em junho e acabou morto no mês passado por guardas de fronteira afegãos quando tentava cruzar a linha divisória rumo ao Irã.

“O Taleban nunca gostou dos hazaras”, disse um membro da comunidade que vive na província afegã de Bamyan. “A última vez que estiveram no poder, mataram muitos de nós”.

Combatentes do Estado Islâmico-Khorasan no Afeganistão (Foto: reprodução de vídeo)
Promessas não cumpridas

O descaso com a minoria xiita contraria uma das muitas promessas feitas pelo Taleban quando chegou ao poder. “Como governo responsável, somos encarregados de proteger todos os cidadãos do Afeganistão, especialmente as minorias religiosas do país”, disse em outubro de 2021 o porta-voz do Ministério do Interior Saeed Khosty.

A promessa não cumprida chegou a ser citada inclusive pela ONU (Organização das Nações Unidas). Em maio, o relator especial sobre direitos humanos no Afeganistão, Richard Bennett, pediu investigações sobre os ataques às comunidades hazara, xiita e sufi, destacando que eles estão “se tornando cada vez mais sistemáticos por natureza e refletem elementos de uma política organizacional, trazendo assim marcas de crimes contra a humanidade”.

A HRW cita o caso das explosões que atingiram a Escola Abdul Rahim Shahid de ensino médio, no bairro predominantemente hazara e xiita de Dasht-e-Barchi, em Cabul, no dia 19 de abril. Entre alunos, professores e funcionários, 20 pessoas foram mortas ou feridas na ação do EI-K. Uma segunda explosão ainda foi relatada no Centro Educacional Mumtaz, a alguns quilômetros de distância.

O relatório da ONG destaca, além das mortes e das pessoas feridas, os danos a médio e longo prazo causados às famílias atingidas pela violência. Há, por exemplo, os casos de homens mortos pelo EI-K, o que invariavelmente acaba com o sustento familiar em um país onde as mulheres são oprimidas e têm a liberdade de estudar e trabalhar restringida.

“Para as mulheres, perder um membro da família do sexo masculino tem consequências sociais e econômicas particularmente terríveis, especialmente para mulheres jovens que ficam repentinamente viúvas”, diz a HRW.

Isso sem falar nos traumas, nos encargos médicos que muitas vezes resultam de ferimentos e no medo que membros dessas comunidades têm de levar uma vida plena.

“Os ataques tornaram difícil, se não impossível, para os membros da comunidade hazara e xiita exercer seus direitos à educação, praticar sua religião e outras liberdades fundamentais. Muitos acharam difícil obter cuidados de saúde e dizem que não se sentem seguros em sair em público. Eles agora evitam reuniões sociais, transporte público e outros locais públicos”, afirma a entidade.

Além de cobrar uma mudança de postura do Taleban, a fim de melhor proteger as minorias atingidas pelo EI-K, o relatório reivindica uma ação global que pressione os governantes afegãos nesse sentido.

“Os governos envolvidos com o Taleban devem exigir uma melhor proteção das comunidades hazara e xiita e devem incentivar e apoiar mecanismos para fortalecer a responsabilidade por crimes cometidos no Afeganistão, inclusive contra as comunidades hazara e xiita”, diz a ONG.

Por que isso importa?

Embora tenha ganhado notoriedade somente após o Taleban ascender ao poder, o EI-K não é novo no cenário afegão. O grupo extremista opera no Afeganistão desde 2015 e surgiu na esteira da criação do Estado Islâmico (EI) do Iraque e da Síria. Foi formado originalmente por membros de grupos do Paquistão que migraram para fugir da crescente pressão das forças de segurança paquistanesas.

Agora que a ocupação estrangeira no Afeganistão terminou e que o antigo governo foi deposto pelo Taleban, os principais alvos do EI-K têm sido a população civil e os próprios talibãs, tratados como apóstatas pelo Khorasan, sob a acusação de que abandonaram a jihad por uma negociação diplomática.

Os ataques suicidas são a principal marca do EI-K, que habitualmente tem uma alta taxa de mortes por atentado. O mais violento de todos eles ocorreu durante a retirada de tropas dos EUA e da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), quando as bombas do grupo mataram 182 pessoas na região do aeroporto de Cabul.

No início de outubro de 2021, dezenas de pessoas morreram em um ataque suicida a bomba contra uma mesquita na província de Kunduz, no nordeste do Afeganistão. Já em novembro, nova ação do EI-K, esta contra um hospital de Cabul, deixou 25 pessoas mortas e cerca de 50 feridas.

Não há diferença substancial entre EI e EI-K, somente o local de origem, a região de Khorasan, originalmente parte do Irã.

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