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terça-feira, 5 de julho de 2022

Hong Kong começa a julgar autores de livros infantis acusados de sedição

A Justiça de Hong Kong deu início nesta semana ao julgamento de cinco fonoaudiólogos acusados de sedição por terem escrito uma série de livros infantis que fazem referência aos protestos por democracia no território autogovernado ocorridos em 2019. Se culpados, eles podem pegar até dois anos de prisão, de acordo com a agência catari Al Jazeera.

A acusação contra o grupo se baseia em crime não previsto na lei de segurança nacional imposta pela China em 2020, uma reação direta aos protestos pró-democracia. Porém, tribunais locais têm usado os poderes conferidos pela lei para aplicar normas da era colonial que previam a sedição.

A promotoria diz que as obras têm clara “intenção sediciosa” porque retratam a população de Hong Kong como ovelhas, enquanto os chineses são lobos. Trata-se de uma série de três livros voltados a crianças entre quatro e sete anos de idade e que contêm alegorias sobre os protestos.

Fotografia flagra combate entre forças policiais de Hong Kong e manifestantes pró-democracia em Sheung Wan, julho de 2019 (Foto: CreativeCommons/Studio Incendo)

“Estes são livros de histórias muito simples, mas eles têm algumas informações e algum material dentro do qual há uma intenção sediciosa, que traz ódio contra o governo e a administração da justiça e incita a violência a outros”, disse o superintendente Steve Li Kwai-wah, do Departamento de Segurança Nacional.

Quando os autores foram detidos, em julho de 2021, as autoridades apreenderam cerca de 550 livros e folhetos, além de terem congelado 160 mil dólares de Hong Kong (R$ 109 mil, no câmbio atual).

À época das prisões, a polícia se manifestou no Twitter. “5 executivos do sindicato dos fonoaudiólogos #PRESOS – suspeitos de conspirar para distribuir publicações sediciosas (livros de histórias infantis que disfarçam atos ilegais de manifestantes + glorificando fugitivos de #HK etc.) com intenção de corromper a mente de crianças de 4 a 7 anos. 2 anos de prisão se condenados!”

Quem também se pronunciou sobre o caso na oportunidade foi a Confederação dos Sindicatos de Hong Kong, já prevendo o aumento da repressão. “Hoje, um livro infantil é definido como sedicioso. Amanhã, quaisquer metáforas podem ser lidas como palavras sediciosas, e todos na sociedade estão no limite”, disse a entidade, que em outubro de 2021 teve as atividades encerradas junto de mais de 50 grupos da sociedade civil atingidos pela lei de segurança nacional.

Por que isso importa?

Após a transferência de Hong Kong do domínio britânico para o chinês, em 1997, o território passou a operar sob um sistema mais autônomo e diferente do restante da China. Apesar da promessa inicial de que as liberdades individuais seriam respeitadas, a submissão a Beijing sempre foi muito forte, o que levou a protestos em massa por independência e democracia em 2019.

A resposta de Beijing aos protestos veio com autoritarismo, representado pela lei de segurança nacional, que deu ao governo de Hong Kong poder de silenciar a oposição e encarcerar os críticos. A normativa legal classifica e criminaliza qualquer tentativa de “intervir” nos assuntos locais como “subversão, secessão, terrorismo e conluio”. Infrações graves podem levar à prisão perpétua.

No final de julho de 2021, um ano após a implementação da lei, foi anunciado o primeiro veredito de uma ação judicial baseada na nova normativa. Tong Ying-kit, um garçom de 24 anos, foi condenado a nove anos de prisão sob as acusações de praticar terrorismo e incitar a secessão.

O incidente que levou à condenação ocorreu em 1º de julho de 2020, o primeiro dia em que a lei vigorou. Tong dirigia uma motocicleta com uma bandeira preta na qual se lia “Liberte Hong Kong. Revolução dos Nossos Tempos”, slogan usado pelos ativistas antigoverno nas manifestações de 2019.

Os críticos ao governo local alegam que os direitos de expressão e de associação têm diminuído cada vez mais, com o aumento da repressão aos dissidentes graças à lei. Já as autoridades de Hong Kong reforçam a ideia de que a normativa legal é necessária para preservar a estabilidade do território

O Reino Unido, por sua vez, diz que ela viola o acordo estabelecido quando da entrega do território à China. Isso porque havia uma promessa de que as liberdade individuais, entre elas eleições democráticas, seriam preservadas por ao menos 50 anos. Metade do tempo se passou, e Beijing não cumpriu sua parte no acordo. Muito pelo contrário.

Nos últimos anos, os pedidos por democracia foram silenciados, a liberdade de expressão acabou e a perspectiva é de que isso se mantenha por um “longo prazo”. Nas palavras do presidente Xi Jinping, “qualquer interferência deve ser eliminada”.

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