Os presidentes do Níger e do Chade se reuniram na quarta-feira (13) para debater o futuro do G5 Sahel, uma força-tarefa multinacional criada em 2014 para combater o terrorismo na África Ocidental. O governo do Mali anunciou em maio deste ano sua saída da aliança, que conta ainda com Mauritânia e Burkina Faso e tem o suporte do governo da França. As informações são da rede Deutsche Welle (DW).
No encontro, o nigerino Mohamed Bazoum e o chadiano Mahamat Idriss Déby Itno assinaram um novo acordo focado em segurança, mas não revelaram maiores detalhes. O presidente do Níger disse apenas que “a decisão de retirada do Mali” do G5 Sahel é um “episódio que será superado”. Já o homólogo do Chade se disse “otimista” com a possibilidade de o Mali vir a “reconsiderar a decisão”.
Apesar da indefinição, a reunião dá esperança de que a força-tarefa sobreviva. “Não consideramos que acabou para o G5 Sahel. Vamos lutar”, disse Bazoum, afirmando ainda que uma nova reunião ocorrerá entre as quatro nações remanescentes “para garantir que o G5 seja viável”.
A saída do Mali da aliança está relacionada ao encerramento da missão de segurança do governo francês no país, fruto de uma série de desavenças entre Paris e o coronel Assimi Goita, líder interino do governo maliano desde o golpe de Estado de maio de 2021.
A Operação Barkhane, que chegou a contar com cinco mil soldados no Mali, foi drasticamente reduzida e tem hoje cerca de 2,5 militares no Sahel. Somente o Níger deve ficar com mil dessas tropas, apoiadas por três aviões de combate, seis drones armados e até seis helicópteros.
A intenção da França é mudar seu papel antiterrorismo na África, que era de substituir as forças locais, para um de apoio. Não está claro, porém, como as forças armadas da região se ajustarão para suprir a redução do efetivo francês. O Chade tem o exército mais poderoso da região e tende a assumir papel central nas missões antiterrorismo locais.
Por que isso importa?
Embora as ações antiterrorismo globais tenham enfraquecido os dois principais grupos jihadistas do mundo, Estado Islâmico (EI) e Al-Qaeda, ambos conseguem se manter relevantes e atuantes. A estratégia dessas duas organizações inclui o recrutamento de novos seguidores através da internet e a forte presença em zonas de conflito como a África, onde são representadas por grupos afiliados regionais. O Afeganistão, agora sob o comando do Taleban, também é um porto seguro para muitos jihadistas.
Na África Ocidental, em particular, a violência das organizações jihadistas tem aumentado. Nos últimos três anos, foram registrados mais de 5,3 mil ataques terroristas, com a morte de cerca de 16 mil pessoas. A informação foi divulgada no início de maio deste ano pelo ministro da Defesa de Gana, Dominic Nitiwul, durante reunião de representantes dos países da região.
O continente africano ganhou importância em meio às derrotas impostas às grandes organizações jihadistas em outras regiões, caso do Oriente Médio. Em 2017, o exército iraquiano anunciou a derrota do EI no Iraque, com a retomada de todos os territórios que o grupo dominava desde 2014. O EI, que chegou a controlar um terço do país, hoje mantém por lá apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos. Já as Forças Democráticas Sírias (FDS), apoiadas pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pelos extremistas do grupo na Síria.
Em janeiro deste ano, o exército norte-americano impôs nova derrota ao EI com o anúncio da morte de Amir Muhammad Sa’id Abdal-Rahman al-Mawla, principal líder da facção. Ele morreu durante uma operação antiterrorismo na Síria, em mais um duro golpe contra o grupo, que em 2019 havia perdido o líder anterior, Abu Bakr al-Baghdadi.
No caso da Al-Qaeda, que igualmente mantém facções relevantes na África, a sobrevivência do grupo pode ser explicada também pela tomada de poder pelo Taleban no Afeganistão. “As avaliações dos Estados-Membros até agora sugerem que a Al-Qaeda tem um porto seguro sob o Taleban e maior liberdade de ação”, diz relatório da ONU (Organização das Nações Unidas) divulgado no final de maio.
“A Al-Qaeda permanece no sul e leste do Afeganistão, onde tem uma presença histórica”, diz o relatório. “O grupo supostamente tem de 180 a 400 combatentes, com as estimativas dos Estados-Membros inclinando-se para o número mais baixo”, prossegue o documento, que cita cidadãos de Bangladesh, Índia, Mianmar e Paquistão como sendo integrantes da facção.
O documento destaca, ainda, que “a Al-Qaeda usou a ascensão do Taleban para atrair novos recrutas e financiamento e inspirar os afiliados da Al-Qaeda globalmente”. E que o atual líder da organização, Ayman al-Zawahri, que foi o braço direito do famoso terrorista Osama Bin Laden, continua a viver no Afeganistão, bem como seus comandantes mais próximos.
Anteriormente, a ONU já havia lembrado que a Al-Qaeda chegou a parabenizar publicamente os talibãs pela ascensão ao poder. E alegou que um filho de Bin Laden, Abdallah, visitou o Afeganistão em outubro de 2021 para reuniões com o Taleban.
No Brasil
Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.
Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.
Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.
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