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quinta-feira, 2 de junho de 2022

Taleban é acusado de prender, agredir e até assassinar jornalistas no Afeganistão

A ONG Comitê para Proteger Jornalistas (CPJ), sediada em Nova York, nos EUA, denunciou na terça-feira (31) a detenção por parte do Taleban de quatro trabalhadores da mídia no Afeganistão, sendo três jornalistas e um motorista que servia a um deles. Já o caso de um fotojornalista indiano assassinado no ano passado, crime atribuído aos talibãs, continua impune.

Os episódios levaram a Unama, missão da ONU (Organização das Nações Unidas) no país, a se manifestar no Twitter. “O assédio e a violência contra jornalistas no #Afeganistão continuam. A Unama reitera seu apelo ao Taleban para libertar todos os trabalhadores de mídia detidos e acabar com as medidas draconianas, incluindo detenções arbitrárias e ameaças, contra jornalistas e a imprensa”.

De acordo com o CPJ, Roman Karimi e o motorista que o acompanhava, identificado apenas como Samiullah, foram detidos no Distrito 10 de Cabul quando cobriam um protesto de mulheres afegãs contra a repressão de gênero imposta pelo Taleban, no domingo (29). Ambos trabalham para a rádio Watander.

O próprio jornalista teria relatado a agressão à ONG, por telefone. Ele diz que um agente de inteligência talibã o agarrou pelas mãos, retirou seu telefone e gravador de voz e o empurrou para dentro de uma cabine de trânsito. Ali, teria levado tapas no rosto enquanto era questionado sobre o trabalho, com o telefone checado pelos radicais.

Karimi e Samiullah foram depois levados ao Diretório Geral de Inteligência (GDI), onde permaneceram por aproximadamente sete horas. Eles foram liberados sob a condição de não voltarem a cobrir protestos ou eventos similares no futuro.

Repórter afegão realiza entrevista (Foto: nara.getarchive.net)

Os outros dois episódios de repressão à imprensa ocorreram no dia 24 de maio. Em um deles, Jamaluddin Dildar, proprietário e editor executivo da rádio Saday-e-Gardez, foi detido na cidade de Gardez, província de Paktia, e levado a um local não informado. A denúncia foi feita pelo irmão dele, segundo quem não houve contato do jornalista desde então. A emissora está fora do ar desde então.

Já Mirza Hasani, ex-dono da hoje desativada rádio Aftab, na província de Daikundi, foi preso quando passava por um posto de checagem na cidade de Herat. O telefone dele foi checado pelos agentes de segurança, que o detiveram ao notar material jornalístico no aparelho.

A prisão do profissional foi denunciada no Twitter pelo também jornalista Alisher Shahiri. “Mirza Hassani, proprietário da Radio Aftab em Daikundi, foi preso há cinco dias pelos talibãs na cidade de Herat. Seus colegas confirmam que Hassani foi severamente espancado e torturado pelo grupo e ainda está sob custódia do Taleban”.

“O Taleban deve libertar imediatamente Jamaluddin Dildar e Mirza Hasani e investigar a detenção e ataque de Roman Karimi e a detenção de seu motorista Samiullah”, disse Steven Butler, coordenador do Programa Ásia do CPJ. “O recente aumento nas detenções arbitrárias de trabalhadores da mídia e jornalistas marca uma deterioração perturbadora da liberdade de imprensa e da capacidade do povo afegão de acessar informações precisas e oportunas”.

Jornalista morto

Em meio às denúncias crescentes de repressão ao trabalho jornalístico, a ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) instou o Tribunal Penal Internacional (TPI) a investigar a morte do fotojornalista indiano Danish Siddiqui, ocorrida no Afeganistão em julho de 2021. O crime é atribuído ao Taleban, que à época ainda não havia assumido o poder no país.

Vencedor de um Prêmio Pulitzer, Siddiqui trabalhava ao lado de um militar afegão num combate pelo controle do principal mercado da cidade de Spin Boldak, perto da fronteira Afeganistão-Paquistão. À época, o exército afegão afirmou que os dois foram pegos no meio de um fogo cruzado dos talibãs.

Entretanto, Avi Singh, advogado da família, desmente essa versão. “De várias fontes, ficou claro que ele foi torturado e morto porque era jornalista”, disse.

Os pais de Siddiqui, que atuava a serviço da agência Reuters, entraram em março com uma ação legal no TPI contra o Taleban. Eles buscam justiça contra seis líderes e outros comandantes não identificados, sob a alegação de que o fotojornalista foi morto em razão da profissão e também por ser cidadão indiano.

“Apesar de usar um colete à prova de balas com o rótulo ‘Press’ (Imprensa), Siddiqui foi detido, torturado e depois morto. Quando seu corpo foi finalmente entregue à Cruz Vermelha, apresentava sinais de mutilação e 12 buracos de entrada e saída de balas”, disse a RSF.

Por que isso importa?

As estatísticas mostram que o jornalismo afegão tem sido sufocado pelo Taleban. Em dezembro de 2021, uma pesquisa feita em parceria pela RSF e a Associação de Jornalistas Independentes do Afeganistão (AIJA) apontou que 231 veículos de imprensa foram fechados e mais de 6,4 mil jornalistas perderam o emprego no Afeganistão desde o dia 15 de agosto, quando o Taleban assumiu o poder no país.

Conforme os dados, mais de quatro em cada dez veículos de comunicação desapareceram nesse período, e 60% dos jornalistas e funcionários da mídia estão impossibilitados de trabalhar. As mulheres sofreram muito mais: 84% delas perderam o emprego, contra 52% no caso dos homens. Entre as 34 províncias do país, em 15 delas não há sequer uma mulher jornalista trabalhando atualmente.

Dos 543 meios de comunicação registrados no Afeganistão antes da ascensão talibã, apenas 312 ainda operavam no final de novembro. Isso significa que 43% dos meios de comunicação locais desapareceram em três meses. Das 10.790 pessoas que trabalhavam na mídia afegã (8.290 homens e 2.490 mulheres) no início de agosto, apenas 4.360 (3.950 homens e 410 mulheres) ainda atuavam quando a pesquisa foi feita.

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