Entre os dias 14 de janeiro e 14 de dezembro deste ano, foram registradas na Rússia 20.467 prisões politicamente motivadas. Durante esse período, em apenas 25 dias não ocorreu nenhum detenção política. Os dados foram divulgados pela ONG OVD-Info, que monitora a repressão estatal e a violência policial no país.
Protestar contra o governo russo já não era uma tarefa fácil antes da eclosão da guerra na Ucrânia. Os protestos coletivos desapareceram das ruas a partir do momento em que a Justiça local passou a usar a pandemia de Covid-19 como pretexto para punir grandes manifestações, alegando que o acúmulo de pessoas feria as normas sanitárias. Assim, tornou-se comum ver manifestantes solitários erguendo cartazes com frases contra o governo.
Com o início do conflito, o presidente Vladimir Putin tratou de criar um novo mecanismo para impedir inclusive os protestos individuais. Foi instituída, no início de março, uma nova lei voltada a punir quem “desacredita o uso das forças armadas”. Com base nessa normativa, a Justiça abriu processos criminais contra 378 pessoas, sendo a enorme maioria, 79%, mulheres. Dessas, 51 pessoas fora condenadas.
O relatório da OVD-Info destaca os casos de Alexei Gorinov e Ilia Yashin, julgados e condenados por se posicionarem contra a guerra. O primeiro pegou seis anos e 11 meses de prisão, enquanto o segundo foi sentenciado a oito anos e seis meses. “Ambos são ex-deputados municipais e receberam essas duras sentenças por falarem sobre a guerra na Ucrânia e as mortes de civis”, diz o texto.
Em muitas das detenções, os alvos do governo sequer chegaram a protestar. “As autoridades também começaram a usar a tática de detenções preventivas durante feriados e outros eventos. Um total de 141 pessoas foram detidas usando o sistema de reconhecimento facial em câmeras de segurança no metrô de Moscou”, afirma a ONG.
Somente no dia 12 de junho, quando foi celebrado o Dia da Rússia, importante feriado nacional que marca a declaração de soberania da nação em 1990, 67 pessoas foram detidas previamente, segundo reportou a OVD-Info na ocasião. A maioria dessas pessoas foi alvo de um alerta prévio das autoridades. Identificadas por reconhecimento facial, foram levadas a uma delegacia e liberadas ao fim do dia sem qualquer acusação.
Além das mais de 20 mil detenções, há inúmeros relatos de violência policial. “Pessoas foram jogadas no chão, jogadas no asfalto, espancadas com cassetetes, estrangulados, espancados no estômago, rosto, olhos, suas cabeças foram batidas contra a parede, suas mãos foram torcidas e torcidas”, afirma a ONG, destacando mais uma vez que as mulheres foram as principais vítimas em casos desse tipo.
Nem os advogados dos detidos escapam da repressão. Foram identificados 275 casos de profissionais do Direito impedidos de acessar centros de detenção para falar com os clientes e pressionados pelo governo por conta da relação profissional que mantêm com os réus.
“A polícia costuma roubar os telefones dos detidos para que não possam entrar em contato com os advogados”, diz a OVD-Info. Além disso, a polícia usa força física contra os advogados. Por exemplo, no início de março, a polícia usou a força contra o advogado Alexei Kalugin e não o deixou entrar no departamento para ver seu cliente. E seu colega, o advogado Sergei Podolsky, foi levado para uma sala separada pelos policiais, onde o ameaçaram”.
Imprensa silenciada
O relatório cita ainda os muitos veículos jornalísticos impedidos de operar em território russo. A censura tirou do ar no país gigantes globais como CNN, BBC, Bloomberg, ABC e CBS. E silenciou a mídia independente local, com destaque para o jornal Novaya Gazeta, cujo editor chefe, Dmitry Muratov, venceu o Nobel da Paz. O periódico teve a licença cassada e teve que se transferir para a Letônia.
Ocorreram 140 detenções de jornalistas durante a cobertura de protestos pacíficos neste ano, segundo o relatório. Ao menos 17 profissionais froam perseguidos extrajudicialmente, uma forma de fazer com que se calem.
“As autoridades russas estão pressionando os jornalistas independentes, inclusive abrindo processos criminais contra eles”, afirma o texto. O documento cita ainda que 90 jornalistas foram listados como ‘agentes estrangeiros’. Ao menos 504 profissionais de imprensa foram forçados a deixar a Rússia, a maioria deles após 24 de fevereiro de 2022, quando começou a guerra.
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