Nas últimas semanas, uma inusitada rivalidade ganhou corpo nos campos de batalha na Ucrânia. De um lado, o Wagner Group, uma companhia militar privada (PMC, na sigla em inglês) que serve aos interesses da Rússia. Do outro, o Mozart Group, fundado pelo coronel norte-americano aposentado Andy Milburn e que diz não pegar em armas, apenas treinar combatentes ucranianos e prestar assistência humanitária. As informações são da revista Newsweek.
Evgeny Prigozhin, importante aliado do presidente Vladimir Putin e chefe da organização russa, usou o aplicativo de mensagens Telegram para classificar os integrantes do Mozart Group como “mercenários americanos”. O termo é comumente atribuído ao próprio Wagner, porém refutado por Milburn.
“As pessoas nos chamam de PMC porque é tudo o que têm como referência”, declarou o coronel aposentado. “Não carregamos armas, nossas tarefas são humanitárias. Digo, é sério, são legalmente humanitárias”, reforçou, referindo-se ao fato de ter registrado a organização como sendo de caridade.
A manifestação de Prigozhin é mais um indício de que o Wagner Group, e consequentemente o Kremlin, passou a ver o Mozart como uma ameaça. Tanto que as palavras do aliado de Putin viralizaram nas redes sociais e demais meios de comunicação russos. Não demorou muito para o site do grupo norte-americano, com sede no Estado de Wyoming, sofrer um ataque de hackers.
De acordo com Milburn, a informação de que o Mozart está na mira do Wagner se espalhou, e a equipe a serviço do norte-americano passou a ter dificuldade para se hospedar na Ucrânia. “Tivemos três hotéis em que ficamos atingidos por mísseis, o que pode ter sido aleatório”, disse. “Mas podem definitivamente estar mirando na gente, o que parecem ser recursos demais usados em um grupo que faz principalmente trabalho humanitário”.
O coronel reforça essa posição, dizendo que seus funcionários não pegam em armas, embora apliquem treinamento militar a combatentes a serviço de Kiev. “Qualquer mercenário zombaria do que pagamos a nossos homens. Os soldados ucranianos que treinamos recebem mais do que nossos homens”, afirmou.
A organização norte-americana diz que se mantém graças a doações privadas e tem, em seu site oficial, um canal para receber doações. Descreve-se como “uma empresa de responsabilidade limitada registrada em Wyoming” e cita funções que vão além do treinamento militar: evacuação médica, logística, análise de risco, remoção de minas terrestres, extração humanitária de civis e ajuda humanitária em geral.
Abusos revelados
O nome da entidade, que claramente faz um contraponto ao do Wagner, parece uma das razões para colocá-los na mira dos russos. “Mas acho que realmente o que atrai a ira deles não é o nome, é o que estamos relatando”, diz Milburn, citando o fato de ter autorização do governo ucraniano para registrar e divulgar imagens e relatos de abusos cometidos pelas tropas de Moscou.
“Somos os únicos que publicam regularmente fotos e filmagens e relatórios do que está acontecendo, que é uma aniquilação absoluta das cidades ucranianas da linha de frente em uma extensão que não vi na mídia”, afirmou o militar dos EUA.
Apesar da aparente perseguição, os integrantes do Mozart até agora escaparam ilesos dos ataques, a não ser por alguns estilhaços. Quem sofre mesmo, segundo Milburn, são os civis ucranianos, que seguem sob ataque constante e se preparam para enfrentar uma situação ainda mais dramática no inverno.
“Essas pessoas estão presas sem comida, água, calor… Cada janela de cada prédio, sem exagero, está quebrada. É difícil de acreditar”, diz ele, que calcula ter ajudado a evacuar entre 600 e 700 pessoas desde maio, quando a equipe passou a atuar. E, apesar de todas as dificuldades, inclusive financeiras, promete continuar em ação. “Nenhuma dessas ameaças ou das bobagens que jogam no Telegram afetarão nossas operações”.
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