O Grupo de Apoio ao Islã e aos Muçulmanos (GSIM, na sigla em francês), uma facção da Al-Qaeda no Mali, alega ter matado quatro mercenários do Wagner Group, misteriosa organização paramilitar russa que atua no país a serviço do governo local. As informações são da agência Reuters.
O GSIM, também conhecido pelo nome em árabe Jamaat Nasr al-Islam wal Muslimin (JNIM), lidera a principal rede jihadista do Sahel e, entre os insurgentes, rivaliza no Mali com o Estado Islâmico no Grande Saara (EIGS).
Na segunda-feira (15), o GSIM usou seu braço de mídia para informar sobre as mortes dos mercenários, que teriam ocorrido em um confronto no sábado (13), na região de Mopti. A informação foi confirmada pelo SITE Intelligence Group, que monitora grupos terroristas e teve acesso ao material.
O Wagner Group está no Mali justamente para combater o terrorismo, após ter firmado um acordo com o coronel Assimi Goita, que assumiu o poder no golpe de Estado de maio de 2021. Os mercenários têm a missão de substituir as tropas da França, que colaboravam com as forças armadas locais no combate ao extremismo e deixaram o país.
Fontes sustentam que o pagamento pelos serviços da organização russa seria de US$ 10,8 milhões por mês, dinheiro que viria da extração de minerais. Em abril, o GSIM havia anunciado a captura de um mercenário do Wagner Group, que os extremistas classificaram como “forças assassinas” e acusaram de assassinar civis.
Retirada francesa
Na segunda-feira (15), as forças armadas da França, até então as principais parceiras do Mali no combate ao terrorismo, finalizaram o processo de retirada de tropas do país, devido a um desacerto entre os governos. A decisão gerou dúvidas quanto à capacidade de o país africano sustentar os avanços obtidos nessa área.
Segundo o general francês Laurent Michon, comandante da Operação Bakhane de combate ao terrorismo, a retirada dos militares franceses não tem nenhuma relação com a chegada ao Mali do Wagner Group, como se especulava. Ele diz que o governo militar maliano desde o início deixou claro seu desejo de “nos ver partir sem demora”.
A partir da saída do Mali, a Operação Barkhane tende a mudar sua abordagem e oferecer ajuda apenas aos países que a solicitarem. Nas palavras do comandante, os militares franceses darão “suporte sob demanda, adaptado com flexibilidade para atender às intenções de tal ou tal país”.
Permanecerão no Sahel africano cerca de 2,5 mil soldados da França, que passarão a atuar como coadjuvantes, dando o protagonismo aos países anfitriões.
Por que isso importa?
A instabilidade no Mali começou com o golpe de Estado em 2012, quando vários grupos rebeldes e extremistas tomaram o poder no norte do país. De quebra, a nação, independente desde 1960, viveu em maio de 2021 o terceiro golpe de Estado em um intervalo de apenas dez anos, seguindo o que já havia ocorrido em 2012 e também em 2020.
A mais recente turbulência política começou semanas antes do golpe, com a demissão do primeiro-ministro Moctar Ouane pelo presidente Bah Ndaw. Reconduzido ao cargo pouco depois, Ouane não conseguiu formar um novo governo, e a tensão aumentou com a falta de pagamento dos salários dos professores. O maior sindicato da categoria, então, começou a se preparar para uma greve.
Veio a noite do dia 24 de maio, quando o coronel Assimi Goita, vice-presidente do país, destituiu Ndaw e Ouane de seus cargos e ordenou a prisão de ambos na capital Bamako. Segundo ele, os dois líderes civis violaram a carta de transição ao não consultarem o militar na formação do novo governo.
Ao contrário do que ocorreu em golpes anteriores, que contaram com apoio popular, desta vez a maior parte da população malinesa rejeitou a tomada de poder por Goita, que derrubou o governo de transição recém-instituído e assumiu o comando do país. A população civil não foi às ruas protestar contra o militar, mas usou as redes sociais para mostrar sua insatisfação.
Militarmente, especialistas e políticos ocidentais enxergam uma geopolítica delicada na região, devido ao aumento constante da influência de grupos jihadistas ligados à Al-Qaeda e ao Estado Islâmico (EI) e à consequente explosão da violência nos confrontos entre extremistas e militares.
Além disso, trata-se de uma posição importante para traficantes de armas e pessoas, e o processo em curso de redução das tropas franceses, que atuam no país desde 2013, tende a piorar a situação.
Os conflitos, antes concentrados no norte do país, se expandiram inclusive para os vizinhos Burkina Faso e Níger. A região central do Mali se tornou um dos pontos mais violentos de todo o Sahel africano, com frequentes assassinatos étnicos e ataques extremistas contra forças do governo.
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