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sexta-feira, 1 de julho de 2022

Ataque a teatro que abrigava civis em Mariupol é crime de guerra cometido pela Rússia, diz Anistia

A organização humanitária Anistia Internacional classificou como crime de guerra o ataque aéreo da Rússia a um teatro que abrigava centenas de civis na cidade de Mariupol, região de Donetsk, leste da Ucrânia, no dia 16 de março deste ano. A afirmação consta do relatório intitulado ‘Children’: The Attack on the Donetsk Regional Academic Drama Theatre em Mariupol, Ukraine (‘Crianças’: O Ataque ao Teatro Acadêmico Regional de Donetsk em Mariupol, Ucrânia), publicado na quinta-feira (30).

O título do documento se deve ao fato de que, a fim de tentar proteger os civis que se abrigavam no local, a palavra “CRIANÇAS” foi escrita em cirílico, o alfabeto russo, dos dois lados e em frente ao prédio. Os russos ignoraram o aviso.

“O teatro era claramente reconhecível como um objeto civil, talvez mais do que qualquer outro local da cidade. As evidências coletadas pela Anistia Internacional demonstram que o ataque foi um crime de guerra“, diz o documento, que cobra a responsabilização criminal dos “perpetradores pela perda de vidas civis e ferimentos graves e pelos danos causados à infraestrutura civil”.

Pouco após o ataque, o Conselho Municipal de Mariupol afirmou que cerca de 300 pessoas haviam morrido. Posteriormente, uma investigação conduzida pela agência Associated Press sugeriu 600 vidas perdidas, com base na capacidade do local e no fato de que ele estava superlotado. Agora, a Anistia faz um cálculo diferente: “Não está claro exatamente quantas pessoas foram mortas, mas é provável que a contagem seja muito menor do que o informado anteriormente”.

Diz o relatório: “Com base em nossa análise de relatos de testemunhas e dessas outras fontes, a Anistia Internacional acredita que pelo menos uma dúzia de pessoas morreram no ataque, mas também que é provável que muitas mortes adicionais permaneçam não relatadas”.

Teatro de Mariupol abrigava mulheres e crianças e foi bombardeado (Foto: Ukraine Now/Telegram)
A Rússia é a culpada

Ao atribuir a responsabilidade do ataque a Moscou, a Anistia rejeitou outras três teorias. Foi descartado, por exemplo, que o teatro tenha sido destruído em um confronto entre tropas dos dois países. “O teatro foi destruído em um único ataque, e nenhuma das munições mais leves empregadas pelas forças ucranianas ou russas em e ao redor de Mariupol no momento do ataque (…) tinham qualquer ponto próximo da força explosiva necessária para causar o dano que foi infligido”.

As outras duas teorias descartadas foram citadas como possíveis causas pelo próprio Kremlin ao se eximir de responsabilidade. Uma delas é a de que a explosão foi causada por um ataque aéreo ucraniano, o que a Anistia descartou ao analisar o tipo de armamento usado.

“No momento do ataque, a Força Aérea Russa estava voando de 200 a 300 missões por dia, enquanto a Força Aérea Ucraniana estava voando apenas de cinco a 10 delas”, aponta a investigação, que não identificou uma aeronave de Kiev capaz de efetuar o ataque. “Dessas poucas missões ucranianas, a maioria eram patrulhas aéreas de combate carregadas com armas ar-ar para atacar jatos russos”.

Um fato complementar que derruba de vez tal alternativa: Kiev disparou, durante toda a guerra, somente um míssil balístico, o modelo Tochka-U. Ele deixa para trás um motor particularmente fácil de ser identificado, mas não havia nada do gênero no local atingido.

“O terceiro cenário é que o ataque foi uma operação de ‘bandeira falsa’ do Batalhão Azov das forças ucranianas, destruindo propositalmente o prédio por dentro. O Ministério da Defesa russo e os meios de comunicação oficiais russos alegaram que o Batalhão Azov da Ucrânia explodiu o teatro em um ato de sabotagem”, diz o documento.

As investigações, entretanto, afastam essa hipótese. “Para que essa afirmação fosse precisa, o Azov teria que colocar e detonar pelo menos 400 a 800 kg de explosivos dentro do teatro”, diz o relatório. Porém, tal operação demandaria tempo e espaço. Seria inviável posicionar tal carga de explosivos no local ideal dentro do teatro, qual seja o palco principal, sem que nenhuma das pessoas dentro do teatro notasse. Ainda que conseguissem, o efeito da explosão teria sido diferente.

O massacre de Bucha

A pressão global por punições à Rússia, às suas tropas e ao presidente Putin aumentou bastante depois que os corpos de dezenas de pessoas foram encontrados nas ruas de Bucha, quando as tropas locais reconquistaram a cidade três dias após a retirada do exército russo. As imagens dos mortos foram divulgadas pela primeira vez no dia 2 de abril, por agências de notícias, e chocaram o mundo.

As fotos mostram pessoas mortas com as mãos amarradas atrás do corpo, um indício de execução. Outros corpos aparecem parcialmente enterrados, com algumas partes à mostra. Há também muitos corpos em valas comuns. Nenhum dos mortos usava uniforme militar, sugerindo que as vítimas são civis.

“O massacre de Bucha prova que o ódio russo aos ucranianos está além de qualquer coisa que a Europa tenha visto desde a Segunda Guerra Mundial”, disse o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, em sua conta no Twitter.

Civis mortos nas ruas de Bucha cidade ucraniana (Foto: reprodução/Twitter)

Moscou, por sua vez, nega as acusações. Através do aplicativo russo de mensagens Telegram, o Ministério da Defesa russo disse que, “durante o tempo em que a cidade esteve sob o controle das forças armadas russas, nenhum morador local sofreu qualquer ação violenta”. O texto classifica as denúncias como “outra farsa, uma produção encenada e provocação do regime de Kiev para a mídia ocidental, como foi o caso em Mariupol com a maternidade“.

Entretanto, imagens de satélite da empresa especializada Maxar Technologies derrubam o argumento da Rússia. O jornal The New York Times realizou uma investigação com base nessas imagens e constatou que objetos de tamanho compatível com um corpo humano aparecem na rua Yablonska entre 9 e 11 de março. Eles estão exatamente nas mesmas posições em que foram descobertos os corpos quando da chegada das tropas ucranianas, conforme vídeo feito por um residente da cidade em 1º de abril.

Mais recentemente, Kiev alegou que apenas em Mariupol, que tem sido o principal alvo das tropas russas, foram encontrados ao menos 20 mil corpos de civis mortos. E acusa os soldados russos de depositarem cerca de nove mil cadáveres em valas comuns em Manhush, uma vila próxima à cidade portuária. Ao levar os corpos para outra localidade, o objetivo das tropas de Moscou seria esconder as evidências de crimes.

Vadym Boychenko, prefeito de Mariupol, comparou a descoberta ao massacre de Babi Yar, um fuzilamento em massa comandado nas proximidades de Kiev pelos nazistas em 1941, durante a Segunda Guerra Mundial. Os corpos de cerca de 33 mil pessoas, essencialmente judeus, foram encontrados em valas comuns na ocasião.

“O maior crime de guerra do século 21 foi cometido em Mariupol. Este é o novo Babi Yar. Então, Hitler matou judeus, ciganos e eslavos. Agora, Putin está destruindo os ucranianos”, disse Boychenko. “Precisamos fazer tudo o que pudermos para impedir o genocídio”.

Os mortos de Putin

Desde que assumiu o poder na Rússia, em 1999, o presidente Vladimir Putin esteve envolvido, direta ou indiretamente, ou é forte suspeito de ter relação com inúmeros eventos, que levaram a dezenas de milhares de mortes. A lista de vítimas do líder russo tem soldados, civis, dissidentes e até crianças. E vai aumentar bastante com a guerra que ele provocou na Ucrânia.

Na conta dos mortos de Putin entram a guerra devastadora na região do Cáucaso, ações fatais de suas forças especiais que resultaram em baixas civis até dentro do território russo, a queda suspeita de um avião comercial e, em 2022, a invasão à Ucrânia que colocou o mundo em alerta.

A Referência organizou alguns dos principais incidentes associados ao líder russo. Relembre os casos.

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