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domingo, 12 de março de 2023

Sob o Taleban, Afeganistão tem quase 19 milhões em insegurança alimentar, diz ONU

A crise no Afeganistão é catastrófica em todo seu espectro social e econômico. É o que revelou o último relatório do relator especial da ONU (Organização das Nações Unidas) para o país do Oriente Médio.

Na semana que passou, Richard Bennett, o enviado do Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários no Afeganistão (Unocha, da sigla em inglês), apresentou um documento 20 de páginas que disseca o período entre julho e dezembro de 2022, no qual descreve que cerca de dois terços das famílias reconheceram enfrentar situação de insegurança alimentar.

Quase 20 milhões de afegãos não sabem se terão comida no prato no dia seguinte, enquanto pelo menos 700 mil perderam seus empregos no país desde a tomada do poder pelo Taleban em agosto de 2021, com agricultura, serviço público e setores de construção os mais severamente afetados, estimou o relatório. O apagamento dos direitos das mulheres e meninas também é outra questão dramática. 

No contexto da fome do povo afegão, além do deemprego em massa, estão aspectos como fechamento de empresas e a relutância de investidores estrangeiros em se envolver na economia do país. Uma tempestade perfeita que causou impactos calamitosos na vida de milhões, já que o agravamento do declínio econômico local só fez piorar a crise humanitária

Família afegã tenta se aquecer em campo para deslocados na província de Herat (Foto: Sayed Bidel)

“Esta crise foi exacerbada pelas consequências não intencionais da cautela política e do cumprimento das sanções (impostas pelos EUA), apesar das isenções humanitárias concedidas pelo Conselho de Segurança”, disse o relatório submetido à ONU.

Ao descrever o agravamento da situação de dezenas de milhares de civis, que continuam a enfrentar o peso da mudança de regime e das consequências pós-conflito, o relatório acrescenta que “estima-se que 18,9 milhões de pessoas estão passando por insegurança alimentar aguda, um número que deve aumentar para 20 milhões, e mais de 90% dos afegãos sofrem de alguma forma de insegurança alimentar, com famílias monoparentais chefiadas por mulheres e crianças sendo desproporcionalmente afetadas”.

Embora as autoridades talibãs argumentem que estão protegendo a população e suas propriedades, o relatório constatou que “escolas, locais de culto e outros locais civis continuaram sob ataque”, sendo uma grande porcentagem deles realizada por extremistas do EI-K (Estado Islâmico-Khorasan), uma organização terrorista dominante no país após a ascensão do Taleban.

Pelo Twitter, o Unocha disse que o Afeganistão é agora “uma das maiores e mais graves crises humanitárias do mundo, com um recorde de 28,3 milhões de pessoas – ou seja, dois terços de sua população – necessitando de assistência humanitária e proteção em 2023”.

Voltando ao relatório assinado por Bennett, o documento também reitera como as autoridades de fato impuseram restrições a mulheres e meninas, repressão que, com o pano de fundo da crise econômica e humanitária, resultou em em mecanismos de enfrentamento negativos, como suicídios e casamentos forçados e infantis.

“Até 1.855 violações graves foram cometidas contra crianças entre janeiro e setembro de 2022”, apontou o relatório.

No dia 8 de março, na passagem do Dia Internacional da Mulher, a ONU declarou que não há lugar no mundo mais repressivo para o sexo feminino do que o Afeganistão.

Segundo as Nações Unidas, ao assumir o poder, os insurgentes mostraram um “foco quase singular na imposição de regras que deixam a maioria das mulheres e meninas efetivamente presas em suas casas”. Diante desse cenário, 11,6 milhões de mulheres e meninas afegãs precisam de assistência humanitária. 

A misoginia é parte central nesse processo, já que o governo tem na repressão de gênero uma de suas mais autoritárias marcas. Elas não podem estudar, trabalhar e nem sair de casa desacompanhadas de um homem. A perda do salário por parte de muitas mulheres que sustentavam suas casas tem contribuído para o empobrecimento da população afegã.

Além de dar recomendações políticas, o relatório da ONU levantou sérias preocupações sobre o aumento de assassinatos de membros das ex-Forças de Segurança e Defesa Nacional Afegãs, que estariam sendo supostamente executadas pelo Taleban. 

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