Jornalistas investigativos estão entre os principais alvos de repressão no governo Putin atualmente. Profissionais da área têm sido investigados e presos, e sites e ONG’s têm sido atacados jurídica e financeiramente ao ponto de encerrarem suas atividades. A mais nova arma do Kremlin para combater esses veículos é digital. O alerta foi feito pelo jornalista búlgaro Christo Grozev em entrevista ao site local Coda Story.
Grozev é o principal jornalista investigativo do site holandês Bellingcat na Rússia. O foco do trabalho dele é segurança nacional, operações clandestinas extraterritoriais e o uso da informação como arma de repressão. Ele foi um dos autores da reportagem sobre os envenenamentos cometidos por agentes russos na Inglaterra em 2018, pela qual ganhou o Prêmio Europeu de Jornalismo Investigativo.
Segundo o jornalista, a nova estratégia do Kremlin para sufocar investigações que possam afetar o governo é impedir o acesso digital a informações cruciais para as reportagens. “Na Rússia e em outros países da ex-União Soviética, muitos dados pessoais vazaram ao longo dos anos. Está consolidado em diferentes bancos de dados, que contêm milhões de registros pessoais”, explica ele.
O acesso a esses dados acontece através do aplicativo russo Telegram. “Existe um mercado próspero de bots do Telegram que fornecem acesso a uma grande coleção desses bancos de dados. Portanto, as pessoas fazem negócio fornecendo acesso a qualquer pessoa que queira comprar uma assinatura”.
Grozev conta que foi essa ferramenta que permitiu a um colega alemão rastrear um importante oficial russo envolvido na compra de equipamentos militares confidenciais na Alemanha. “Procurei esse número em um dos bots do Telegram, e ele me deu o nome do proprietário, o número do passaporte e o número de contribuinte pessoal da pessoa”.
Agora, em meio às constantes denúncias que surgem contra membros do governo e outros aliados do presidente Vladimir Putin, o governo tem trabalhado arduamente para bloquear esses bots e dificultar a atuação jornalística. “Eu diria que houve mais de 10 fechamentos de bots nos últimos seis meses”, conta ele, que admite ter o trabalho dificultado pela iniciativa. “Nosso escopo é limitado em comparação com o que tínhamos antes”.
Entretanto, Grozev acredita que não há como encerrar totalmente o negócio. Afinal, os dados estão disponíveis, o desafio é encontrar ferramentas para divulgá-los. “Não consigo imaginar como essa indústria, que se baseia em dados que vazaram anteriormente, possa ser silenciada, porque está tudo lá fora”.
Site ilegal
Em meio à perseguição contra jornalistas e sites jornalísticos, uma decisão da Justiça da Rússia, anunciada na semana passada, tornou irregular a atuação do Proekt (Projeto, em tradução literal), em represália contra uma série de reportagens sobre erros ou ações questionáveis do presidente Vladimir Putin e de alguns de seus aliados.
A ação ocorreu no momento em que o Proekt investigava o ministro do Interior Vladimir Kolokoltsev, que enriqueceu muito desde a nomeação, em 2012, e é suspeito de ter ligações com o crime organizado. O site chegou a noticiar que Putin teve uma filha secreta com uma amante.
Na última semana, jornalistas do site tiveram suas casas invadidas para operações de busca e apreensão da polícia, usando como justificativa um antigo caso de calúnia envolvendo Roman Badanin, editor-chefe do Proekt. Como parte da ação do governo visa a sufocar financeiramente o veículo jornalístico, eventuais doadores, através de qualquer esforço de crowdfunding (financiamento coletivo), também são passíveis de punição.
A repressão do governo Putin a veículos de imprensa tem aumentado. Sites noticiosos, como Meduza e VTimes, também foram declarados “agentes estrangeiros”, mas a medida de considerar o veículo ilegal, caso do Proekt, não é habitual. Muitos jornalistas ligados ao oposicionista Alexei Navalny, atualmente preso em Moscou, tiveram suas casas invadidas pela polícia sob ordens de busca e apreensão. A RFE recebeu multas milionárias.
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