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terça-feira, 17 de janeiro de 2023

Ex-parlamentar afegã que ficou no país após a ascensão talibã é morta a tiros

Uma ex-parlamentar afegã e seu guarda-costas foram mortos a tiros por homens armados não identificados no domingo (15) pela manhã em sua casa na capital do Afeganistão, Cabul. A polícia local confirmou a informação, de acordo com a rede CNN.

Mursal Nabizada, de 32 anos, era uma das poucas parlamentares que ainda viviam na capital depois que o Taleban tomou o poder central em agosto de 2021. Ela atuou no Legislativo do país até 2019.

“Nabizada, junto com um de seus guarda-costas, foi morta a tiros em sua casa”, disse o porta-voz da polícia de Cabul, Khalid Zadran. “As forças de segurança iniciaram uma investigação sobre o incidente”, acrescentou. O irmão de Nabizada também foi ferido no ataque, disse a autoridade policial. Até o momento, nenhuma prisão foi feita.

Mursal Nabizada foi eleita em 2019, dois anos antes do país ser tomado pelos radicais do Taleban (Foto: Twitter/Reprodução)

Pelo Twitter, a ex-legisladora Mariam Solaimankhil disse que Nabizada era “uma verdadeira pioneira. Uma mulher forte e sincera que defendia aquilo em que acreditava, mesmo diante do perigo”.

Tirana Hassan, diretora-executiva interina da ONG Human Rights Watch, lamentou a morte. “Nabizada ficou no Afeganistão para lutar pelos direitos de mulheres e meninas”, disse.

O assassinato marca a primeira morte de um parlamentar do governo deposto na cidade desde que o grupo radical assumiu o governo central após a retirada das tropas americanas e de aliados. Porém, há sinais de deterioração da situação de segurança em Cabul.

Nabizada foi eleita em 2019. Ela foi membro da comissão parlamentar de defesa e trabalhou em um grupo privado não governamental, o Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento de Recursos Humanos.

Insegurança

No começo deste mês, pelo menos cinco pessoas morreram após a explosão de uma bomba em um posto de checagem de segurança perto do aeroporto militar de Cabul. O local atingido pelo ataque fica próximo ao escritório do Ministério do Interior. Também na região ficam localizadas embaixadas estrangeiras e o palácio presidencial, embora nenhuma dessas instituições tenha sido atingida.

Em dezembro, um hotel na região central foi alvo de ataque armado, com testemunhas tendo relatado explosões e disparos de armas de fogo. O local é frequentado majoritariamente por cidadãos chineses. Nenhum grupo assumiu a autoria do atentado, que ocorreu um dia após o embaixador chinês no Afeganistão, Wang Yu, se encontrar com representantes do governo talibã para solicitar maior proteção ao corpo diplomático de Beijing e à embaixada do país em Cabul.

Também no mês passado, uma pessoa foi morta durante um ataque suicida perto do escritório de Cabul do partido Hezb-e-Islami, enquanto seu líder Gulbuddin Hekmatyar, que foi primeiro-ministro do Afeganistão na década de 1990, estava lá dentro, segundo a rede CBC.

Por que isso importa?

Nos últimos meses, o Taleban entrou na mira da ONU (Organização das Nações Unidas) e de entidades humanitárias globais por sua inabilidade de governar o Afeganistão, inclusive no campo da segurança, e pela dura repressão que impõe sobretudo às mulheres e meninas afegãs.

Na abertura da 51ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em setembro, mais de 20 governos e entidades condenaram a repressão de gênero no Afeganistão. As críticas globais foram motivadas sobretudo pela proibição imposta às meninas na educação, com as escolas de ensino médio fechadas e alunas obrigadas a ficar em casa quando deveriam estar estudando.

No final de agosto, Josep Borrell, chefe da diplomacia da União Europeia (UE), também havia condenado a atuação dos radicais como governantes afegãos de fato, pouco depois de eles completarem um ano no poder, no dia 15 daquele mês.

“O Afeganistão pode ter saído das manchetes. No entanto, a situação de seu povo é terrível”, dizia texto, listando ainda abusos cometidos pelos radicais que contrariam a moderação prometida após a tomada de poder. “Todas as meninas, apesar das promessas anteriores, são proibidas de estudar; vastas áreas do país são assoladas pela fome (70% da população); e muitos afegãos vivem com medo ou no exílio”.

Já em setembro, a ONG Human Rights Watch (HRW) publicou relatório destacando a ineficiência dos talibãs em sua obrigação de proteger a população local, especialmente algumas minorias xiitas, das ações violentas do EI-K. O documento foca particularmente no caso dos hazaras.

“Desde a tomada do Taleban, combatentes ligados ao Estado Islâmico cometeram vários ataques brutais contra membros da comunidade hazara enquanto iam para a escola, para o trabalho ou para rezar, sem uma resposta séria das autoridades do Taleban”, disse Fereshta Abbasi, pesquisador da ONG para o Afeganistão. “O Taleban tem a obrigação de proteger as comunidades em risco e ajudar as vítimas de ataques e suas famílias”.

O descaso com a minoria xiita contraria uma das muitas promessas feitas pelo Taleban quando chegou ao poder. “Como governo responsável, somos encarregados de proteger todos os cidadãos do Afeganistão, especialmente as minorias religiosas do país”, disse em outubro de 2021 o porta-voz do Ministério do Interior Saeed Khosty.

A promessa não cumprida chegou a ser citada pelo próprio Richard Bennett, que em maio deste ano pediu investigações sobre os ataques às comunidades hazara, xiita e sufi, destacando que eles estão “se tornando cada vez mais sistemáticos por natureza e refletem elementos de uma política organizacional, trazendo assim marcas de crimes contra a humanidade”.

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