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sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Engenheiros e cientistas morrem em ritmo sem precedentes durante surto de Covid na China

O fim abrupto da política Zero Covid na China, que gerou um surto mortífero da doença, parece causar também um grande prejuízo intelectual. No intervalo de um mês, morreram em todo o país mais engenheiros e cientistas veteranos do que normalmente se registra em um ano, segundo o jornal South China Morning Post.

A Academia Chinesa de Engenharia, órgão mais importante do setor na China, tem mais de 900 membros, quase todos ligados aos projetos de infraestrutura mais prestigiados do país. Somente entre os dias 15 de dezembro e 4 de janeiro, a entidade diz que 20 de seus integrantes morreram, sendo que o mais jovem da lista tinha 77 anos.

Para se ter ideia do que esse número representa, entre 2017 e 2020 foram registradas 16 mortes por ano, em média, entre os membros da Academia. Já em todo o ano de 2021 foram 13 mortes. As causas das mortes não foram divulgadas, mas é inevitável associá-las ao surto de Covid que tem vitimado sobretudo pessoas acima dos 60 anos.

Centro temporário de controle da Covid em Xangai, março de 2022 (Foto: WikiCommons)

Engenheiros e cientistas são especialmente valorizados pelo governo chinês, vez que os megaprojetos desenvolvidos por eles estão entre os pilares de sustentação da economia nacional. Tanto que esses indivíduos recebem tratamento privilegiado em casos de problemas de saúde, mesmo nível do que se oferece aos vice-ministros do governo central.

Assim como a Academia, a Universidade de Tsinghua, a mais bem classificada do país para as ciências naturais, passou a postar um número excessivamente alto de obituários em suas redes sociais. Entre as vítimas, o farmacologista Jiang Hualiang, de 57 anos, que inclusive liderava o desenvolvimento de medicamentos para o combate à Covid-19.

Porém, em meio ao surto, os hospitais chineses estão superlotados, e mesmo esses profissionais têm que esperar para conseguir um quarto. Segundo um médico de um grande hospital de Beijing, que por questões de segurança pediu para ter a identidade preservada, os acadêmicos podem se considerar com sorte se conseguirem um cama nos corredores.

A falta de informações sobre as mortes dos acadêmicos segue um padrão estabelecido pelo governo da China, que não divulga dados precisos sobre a Covid. Casos assintomáticos não são mais contabilizados, e apenas óbitos causados por pneumonia ou insuficiência respiratória são considerados. Assim, ficam fora das estatísticas oficiais as mortes de pessoas com doenças pré-existentes.

Diante desse cenário, a OMS (Organização Mundial de Saúde) chegou a cobrar uma postura diferente da China. “Acreditamos que a definição [de uma morte por Covid] é muito estreita”, disse o diretor de emergências da entidade, Michael Ryan, de acordo com a rede BBC.

Segundo Ryan, os números divulgados oficialmente por Beijing “sub-representam o verdadeiro impacto da doença em termos de internações hospitalares, em termos de internações em UTI e, particularmente, em termos de mortes”.

Por que isso importa?

atual surto de Covid na China começou no final de novembro e piorou a partir de 7 de dezembro, quando o governo suspendeu subitamente os radicais bloqueios antes impostos à população para controlar a propagação da doença, a política Zero Covid.

Entre as medidas de flexibilização, doentes assintomáticos ou com sintomas leves são autorizados a se isolar em casa, não mais em instalações do governo. Testes de PCR e o aplicativo de monitoramento de saúde deixaram de ser obrigatórios para acessar locais públicos. Já os bloqueios de rua, que antes atingiam distritos inteiros, agora são menores, concentrados em andares ou edifícios específicos.

Um dos problemas do afrouxamento das medidas é o fato de que os cidadãos ficaram trancados durante muito tempo, o que reduziu entre os chineses a imunidade natural encontrada em outros países. Aumenta a preocupação a baixa taxa de vacinação entre os idosos, sendo que apenas 40% das pessoas a partir dos 80 anos receberam a terceira dose da vacina.

O governo chinês também não aprovou o uso no país de nenhuma vacina produzida no exterior, limitando seus cidadãos à inoculação com os imunizantes da Sinovac e da Sinopharm. Para especialistas, porém, o nível de imunidade fornecida pelas vacinas da China é mais baixo que o das ocidentais, que usam a tecnologia de RNA mensageiro, mais moderna.

Um estudo publicado em dezembro pela revista de medicina Lancet em Singapura mostra que as vacinas chinesas, que usam a tecnologia do vírus inativado, mais antiga que a do RNA mensageiro, levam a uma probabilidade quase duas vezes maior de o indivíduo inoculado desenvolver Covid-19 grave.

“Continuamos preocupados com a evolução da situação e continuamos incentivando a China a rastrear o vírus da Covid-19 e vacinar as pessoas de maior risco. Continuamos a oferecer nosso suporte para atendimento clínico e proteção de seu sistema de saúde”, disse Tedros.

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