Na luta contra o crescimento da ação jihadista no país, o presidente do Níger, Mohamed Bazoum, se disse pronto para receber o apoio das tropas estrangeiras, encabeçadas pelo exército da França e que nos próximos meses deixarão o Mali, onde estão atualmente com o mesmo objetivo de combate ao extremismo. As informações são da agência catari Al Jazeera.
Em sua conta no Twitter, Bazoum disse que a tendência é o crescimento da atividade jihadista no Sahel em função da retirada das tropas estrangeiras do Mali. Daí a necessidade de que os soldados sejam deslocados para outros países da região, o que o levou a abrir as portas do Níger.
“Nosso objetivo é que nossa fronteira com o Mali seja segura. Esperamos que após a saída de Barkhane e Takuba (missões militares francesa e europeia, respectivamente), esta área fique ainda mais infestada e que os grupos terroristas se fortaleçam. No entanto, sabemos que eles estão destinados a estender sua influência”, disse Bazoum no Twitter.
Notre objectif est que notre frontière avec le Mali soit sécurisée. Nous prévoyons qu’après le départ de Barkhane et de Takuba, cette zone soit encore plus infestée et que les groupes terroristes se renforcent. Or, nous savons qu’ils ont vocation à étendre leur emprise.
— Mohamed Bazoum (@mohamedbazoum) February 18, 2022
A presença das tropas estrangeiras, porém, não é bem recebida por todos no país africano. Maikol Zodi lidera um movimento que contesta a iniciativa e a considera ilegal. “É inaceitável e intolerável aceitar esta redistribuição em nosso território. Se o fizerem, vamos tratá-los como uma força de ocupação”, disse.
Do lado do Mali, o que levou à decisão de retirada dos franceses e seus aliados foi a intenção do coronel Assimi Goita, líder do governo desde o golpe militar, em maio de 2021, de negociar com os jihadistas.
“Não podemos realizar operações conjuntas com poderes que decidam negociar com grupos que, ao mesmo tempo, atiram em nossas crianças. Sem diálogo e sem compromisso”, disse o presidente francês Emmanuel Macron ao anunciar a reestruturação da missão da França no Mali, Operação Barkhane, em junho passado, segundo a rede France 24.
Cinco mortos
Nesta semana, mais um episódio de violência jihadista foi registrado no Níger. Um veículo que conduzia soldados do exército nacional atingiu um IED (dispositivo explosivo improvisado) posicionado em uma estrada e matou cinco militares na quarta-feira (16), na violenta região de Tillaberi. As informações são do site The Defense Post.
O incidente foi confirmado pelo ministério da Defesa do país africano, através de um pronunciamento em uma rádio local. Além dos cinco mortos, outros dois soldados ficaram feridos na ação, que não foi reivindicada por nenhum grupo jihadista.
A explosão ocorreu no distrito de Gotheye, na região de Tillaberi, perto das fronteiras com Burkina Faso e Mali e principal foco de atividade extremista no país.
Por que isso importa?
Ações antiterrorismo globais têm enfraquecido os dois principais grupos terroristas do mundo, o EI e a Al-Qaeda. Já a pandemia de Covid-19 fez cair o número de ataques em regiões sem conflito, devido a fatores como as limitações impostas às viagens internacionais e a redução do número de pessoas em áreas públicas.
Na tentativa de manter a relevância, as organizações jihadistas têm investido em zonas de conflito, como o continente africano, e isso pode causar um impacto a curto prazo na segurança global, conforme as regras de restrição à circulação são afrouxadas.
O EI, em particular, se enfraqueceu militar e financeiramente, vitimado pela má gestão de fundos por parte de seus líderes e sufocado pelas sanções econômicas internacionais. Porém, a organização ganhou sobrevida graças ao poder de recrutar seguidores online. Atualmente, as ações do EI são empreendidas quase sempre por atores solitários ou pequenos grupos que foram radicalizados e incitados através da internet.
Em 2017, o exército iraquiano anunciou ter derrotado a organização no país, com a retomada de todos os territórios que o EI dominava desde 2014. O grupo, que chegou a controlar um terço do Iraque, hoje mantém apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos. Já as Forças Democráticas Sírias (FDS), apoiadas pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pelos extremistas no país.
Em janeiro deste ano, o exército norte-americano anunciou ter matado Amir Muhammad Sa’id Abdal-Rahman al-Mawla, principal líder da facção, durante uma operação antiterrorismo na Síria. Foi mais um duro golpe contra o EI, que em 2019 havia perdido o líder anterior, Abu Bakr al-Baghdadi.
Assim, o principal reduto do EI tornou-se o continente africano, onde conseguem se manter relevante graças à ação de grupos afiliados regionais, como ISWAP, EIGS e Boko Haram. A expansão em muitas regiões da África é alarmante e pode marcar a retomada de força global da organização, algo que em determinado momento tende refletir em regiões sem conflito, como Europa e Estados Unidos, alvos preferenciais de ataques terroristas.
A Al-Qaeda, por sua vez, passou a contar com um forte aliado no Afeganistão, que desde a tomada de poder pelo Taleban abriu as portas do país para os extremistas do grupo. Grupos afiliados à organização terrorista também continuam a controlar o noroeste da Síria, na área de Idlib.
No Brasil
Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.
Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.
Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.
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