Wang Yam, um cidadão chinês que vive no Reino Unido desde 1992 e atuava como informante do MI6, o serviço de inteligência estrangeira do Reino Unido, teria revelado a políticos locais inúmeros segredos da empresa de telecomunicações Huawei, vista com desconfiança por governos ocidentais devido a seu vínculo com Beijing. Atualmente, Wang cumpre pena por um homicídio que diz não ter cometido, se diz abandonado pela inteligência britânica e luta para provar sua inocência. As informações são do jornal The Guardian.
A contribuição de Wang, ao revelar os segredos e riscos que a Huawei representa, gerou agradecimentos de políticos britânicos, segundo os quais as informações fornecidas por ele compreendem “várias áreas importantes de preocupação”. A história do informante vem à tona em um momento de preocupação crescente do Reino Unido com a China, que teria supostamente infiltrado uma agente no Parlamento. Em outro incidente recente, o diretor de comunicações do primeiro-ministro Boris Johnson, Guto Harri, foi acusado de fazer lobby para evitar que a Huawei fosse banida.
Wang era pesquisador no instituto de armamento nuclear da China, país do qual fugiu via Hong Kong, tendo recebido o status de refugiado em 1992. Posteriormente, foi recrutado para servir ao MI6 como informante, tendo a missão de acompanhar cidadãos chineses a serviço da Embaixada do país em Londres. Atualmente, o informante está preso na Inglaterra, condenado em 2009 por um homicídio que alega não ter cometido. E se diz abandonado pela inteligência britânica.
No ano passado, Wang entrou em contato com o Comitê de Segurança e Inteligência (ISC, na sigla em inglês) do Parlamento britânico. Também contatou uma série de figuras importantes da política local. O objetivo: enviar documentos destacando seu conhecimento a respeito da Huawei e os potenciais riscos que a empresa representaria para o Reino Unido caso tivesse participação na futura rede 5G, da qual foi banida.
Julian Lewis, membro do Parlamento pelo Partido Conservador e líder do ISC, enviou uma carta em resposta a Wang. “Você discute várias áreas importantes de preocupação em relação à influência da China em geral e da Huawei em particular na infraestrutura de telecomunicações e no setor público do Reino Unido”, diz ele na carta. “Como você deve saber, o ISC está atualmente conduzindo uma investigação sobre as questões de segurança nacional relacionadas à China”.
Homicídio
Wang foi condenado por assassinar em 2006 o escritor e fotógrafo Alan Chappelow, à época com 86 anos. A polícia chegou ao acusado depois de alertada por um banco sobre transações incomuns na conta da vítima. Um cartão de crédito de Chappelow, usado após o crime, levou a Wang. O julgamento, em 2008, foi inexplicavelmente cercado de mistério para um homicídio.
Conforme a teoria da acusação, Chappelow teria acusado Wang de roubar cartas e informações bancárias da caixa de correio. O réu, então, teria entrado na casa da vítima e cometido o homicídio. Incialmente, a sentença cobriu apenas os crimes de roubo e fraude, sem chegar a um veredito por homicídio. Posteriormente, um segundo julgamento determinou uma pena não menor do que 20 anos de reclusão pelo assassinato.
Em 2014 surgiram novas evidências que poderiam levar à absolvição de Wang. Um vizinho de Chappelow, por exemplo, disse que foi ameaçado por um homem perto da antiga casa da vítima, quando o acusado já cumpria pena. Outra testemunha disse que o escritor, no dia do crime, foi visto deixando uma casa noturna local na companhia de outro homem mais jovem. Pegadas e pontas de cigarro que não eram de Wang, localizados na casa da vítima, reforçam a teoria de que outra pessoa cometeu o crime.
O advogado de Wang apelou, mas o pedido foi rejeitado pela Justiça. Agora, a esperança reside em eventuais testes de DNA que levem àquele que, segundo o acusado, é o verdadeiro criminoso.
Por que isso importa?
Há uma desconfiança global que recai sobre a Huawei, baseada em teorias sobre sua proximidade com o governo chinês. Autoridades ocidentais citam a Lei de Inteligência Nacional da China, de 2017, segundo a qual as empresas nacionais devem “apoiar, cooperar e colaborar com o trabalho de inteligência nacional”, o que poderia forçar particularmente a gigante da tecnologia a trabalhar a serviço do Partido Comunista Chinês (PCC).
Em 2020, parlamentares britânicos afirmaram em um relatório que a Huawei está “fortemente ligada ao Estado e ao PCC, apesar de suas declarações em contrário”. Diante disso, a empresa tem enfrentado crescente desconfiança na construção de redes 5G em todo o mundo, com a implantação rejeitada em vários países. Austrália, Nova Zelândia, Portugal, Índia, EUA e Reino Unido baniram a infraestrutura da companhia por medo de ser usada para espionagem.
As especulações referentes aos produtos de vigilância da Huawei ganharam força no final de 2021 em meio a temores na China e no mundo sobre as consequências do uso maciço do reconhecimento facial e de outros métodos de rastreamento biométrico. E, ao mesmo tempo em que o PCC continua a confiar em tais ferramentas para erradicar a dissidência e manter seu regime de partido único, ele alerta sobre o uso indevido de tecnologias no setor privado.
Em 2021, após pressão de Beijing, a Huawei e outros gigantes da tecnologia foram compelidas a não abusar do reconhecimento facial e de outras ferramentas de vigilância, após uma nova lei de proteção de dados pessoais entrar em vigor. Mas o veto vale apenas para o setor privado. No setor público, o jornal The Washington Post revelou em dezembro que a ligação da Huawei com o aparato chinês de vigilância governamental é maior que o imaginado.
Os dados aparecem em uma apresentação de Power Point que estava disponível no site da empresa e foi removida. Repleto de itens “confidenciais”, o arquivo mostra como a tecnologia da empresa pode ajudar Beijing a identificar indivíduos por voz, monitorar pessoas de interesse, gerenciar reeducação ideológica, organizar cronogramas de trabalho para prisioneiros e rastrear compradores através do reconhecimento facial.
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