O Uruguai tem avançado em negócios unilaterais com a China, contrariando as regulamentações do Mercosul, que também inclui Brasil, Argentina e Paraguai. O anúncio foi feito oficialmente em setembro de 2021 e tem gerado discordâncias na vizinhança.
O presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, tem progredido em um acordo de livre-comércio com Beijing, ignorando o fato de ser um membro do bloco econômico sul-americano, cujo regulamento determina que tratados do gênero só podem ocorrer mediante consenso dos outros três países, medida adotada no ano de 2000.
Diante desse impeditivo regulatório, Lacalle Pou é favorável à anulação da exigência de conformidade no bloco, defendendo que cada Estado-Membro do Mercosul tenha liberdade para assinar acordos comerciais.
“Eu particularmente entendo que um Brasil livre poderia ser melhor para nós, mas respeitamos os acordos que foram feitos no passado”, disse Bolsonaro em entrevista no dia 10 de janeiro à Rádio Sarandi, emissora gaúcha, acrescentando que “essa questão do Mercosul é sempre instável, tem seus prós e contras. Neste momento, o Uruguai quer comprar tudo que vem da China diretamente, independentemente da cláusula de barreira do Mercosul. É um problema que estamos enfrentando”.
Segundo o Bilaterals.org, coletivo que compartilha informações e estimula a cooperação sobre acordos bilaterais de comércio e investimento, se um resultado positivo for alcançado entre latino-americanos e chineses, a próxima fase seria a elaboração de um Tratado de Livre-Comércio (TLC). “Vamos ver se é possível. O Uruguai está com pressa”, disse Lacalle Pou.
Em dezembro, Montevidéu se opôs à assinatura do parágrafo da declaração final do bloco, que se refere ao acordo entre Brasil, Argentina e Paraguai para reduzir em 10% a tarifa externa comum de uma série de produtos.
Em maio, o embaixador chinês no Uruguai, Wang Gang, manifestou uma “atitude aberta” de Beijing com todo o Mercosul e interesse em um acordo comercial “bilateral ou em bloco” com Uruguai, Argentina, Paraguai e Brasil quando “todos estiverem prontos”. A tentativa de aproximação aconteceu durante um fórum virtual sobre a probabilidade de o país sul-americano atrair mais investimentos chineses.
Parceria exige cautela
No começo dos anos 2000, a parceria era tímida, com as vendas uruguaias para a China representando somente 5% das exportações de Montevidéu. Atualizando para 2020, o cenário é completamente diferente: quase 30%, sendo principalmente produtos da agroindústria e matérias-primas agrícolas, segundo a agência de notícias cubana Prensa Latina.
Sobre a questão das tarifa, os promotores do TLC com Beijing têm expectativas de redução e até eliminação, já que 52% do volume exportado para aquele mercado paga uma taxa de 11% a 20%. Um estudo detalhado fornecido pela Câmara da Indústria do Uruguai (CIU) apontou que essa é uma das questões a exigir “uma negociação cuidadosa e complexa para graduar os benefícios mútuos em um alto padrão de liberalização”, pondera a reportagem.
O documento organizado pela CIU listou alguns setores a serem protegidos, classificados como “sensíveis”. Entre eles o alumínio, que concorre a preços abaixo da média mundial, e o de calçados, que deslocou produtores nacionais nos mercados locais latino-americanos.
O estudo também chama a atenção para a área têxtil e de vestuário, definida como “pequena e atomizada” e que poderá ser muito afetada negativamente. Já na indústria do plástico há temores de “um grande risco para a produção nacional que afetará as exportações para o Mercosul”.
“O Governo deve decidir, durante o processo, qual o alcance em cada uma destas questões com base no equilíbrio da negociação e, aliás, salvaguardando os interesses nacionais”, analisou o economista e senador pela Frente Ampla (coalizão da esquerda uruguaia), Daniel Olesker. Segundo ele, o TLC “só favorece o núcleo duro exportador: cerca de 30 empresários que levam 90%”. Olesker também receia que empregos serão perdidos.
Analistas ouvidos pela reportagem projetam que, a longo prazo, nem Brasil nem Argentina dirão algo sobre o acordo entre uruguaios e chineses. A justificativa é simples: ambas as nações sabem que, mais cedo ou mais tarde, também terão que negociar e assinar um TLC com a China, que é a segunda economia mundial e talvez torne-se a primeira em algum tempo. Aliás, a China já está no topo da pirâmide da elite econômica, segundo um relatório da empresa de consultoria empresarial norte-americana McKinsey & Co. sobre a classificação global da riqueza.
O tema gera divergência em Montevidéu. Em setembro, um importante ministro da equipe econômica de
Lacalle Pou, que teve conhecimento das intenções do presidente através da imprensa, classificou a decisão como “delírio”, mostro a revista Exame. O líder uruguaio banca sua escolha e quer celeridade nas relações bilaterais.“O Uruguai tem pressa, porque cada dia que passa é um dia perdido. Mas temos que fazer juntos, todos os partidos políticos uruguaios, depois (a conversa) se estenderá às câmaras empresariais e aos sindicatos, para analisar se há vencedores e vencidos e que tipo de compensação pode haver”, disse Pou.
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