A Justiça da Rússia desistiu de processar criminalmente o belarusso Sergei Savelyev, responsável pelo vazamento dos vídeos que denunciam abusos contra presos no sistema prisional russo. O anúncio foi feito na quarta-feira (10) por promotores de Justiça do país, segundo o jornal independente The Moscow Times.
De acordo com a ONG Gulagu.net, que originalmente publicou os vídeos, o promotor da região de Saratov, onde fica um dos presídios alvo de denúncia, ordenou que as acusações fossem retiradas, alegando “ilegalidade e falta de fundamento”. O Ministério do Interior também excluiu da lista de criminosos procurados o nome do belarusso, que atualmente busca asilo na França.
Já o chefe do serviço penitenciário da região de Saratov, Anton Yefarkin, afirmou que 18 funcionários do presídio foram demitidos e 11 enfrentaram medidas disciplinares “rígidas”. Também foram abertos cinco processos criminais em função dos vídeos.
“Estamos fazendo de tudo para resolver as coisas e tirar as conclusões apropriadas”, disse Yefarkin a um canal de televisão estatal. “Tenho certeza de que no futuro isso não se repetirá”.
Entenda o caso
Savelyev é um profissional de TI (tecnologia da informação) e ex-presidiário colocado em liberdade em fevereiro deste ano. Ele enviou à Gulagu.net mais de mil vídeos que mostram prisioneiros sendo espancados e torturados por agentes da FSB (Agência Nacional de Segurança, da sigla em inglês) e do Serviço Prisional Federal (FSIN, da sigla em russo), encontrados quando ele trabalhava com manutenção de computadores na cadeia.
Durante suas atividades, Savelyev teve acesso ao servidor interno da prisão onde estava e também de outras. O material foi salvo em pen drives, que ficaram escondidos enquanto ele cumpria pena. No dia de sua libertação, durante uma revista minuciosa, ele pegou os dispositivos de memória sem ser visto pelos guardas e os levou quando finalmente deixou o presídio.
Segundo a ONG, entre 2018 e 2020, ao menos 200 detentos teriam sido vítimas de tortura e estupro, sendo que as imagens mostram 40 casos. Um dos principais centros de tortura é a Colônia Penal 15, em Angarsk, perto da Mongólia. Lá, os agentes carcerários empreenderam uma campanha de violência desde uma rebelião que ocorreu em abril de 2020, organizada pelos presos justamente em virtude de uma agressão contra um detento.
Novos vídeos
Na terça-feira (9), a Gulagu.net lançou novos vídeos que supostamente mostram mais casos de tortura e estupro em um hospital prisional de Saratov. Seria imagens gravadas entre julho de 2015 e setembro de 2020 na enfermaria que trata presos com tuberculose no presídio OTB-1. As informações são da Radio Free Europe.
O fundador da ONG, Vladimir Osechkin, que também vive na França, afirma que os homens responsáveis pelos abusos contra os detentos são funcionários contratados pelo hospital da prisão como gerentes administrativos e enfermeiros. Mais uma vez, ele acusa a FSB e o FSIN de envolvimento no caso, pois os órgãos seriam encarregados de supervisionar os acusados.
Por que isso importa?
O sistema carcerário russo ganhou atenção global devido a denúncias de Alexei Navalny, o principal opositor do presidente Vladimir Putin. O oposicionista está preso desde fevereiro deste ano em uma colônia penal de alta segurança, a IK-2, 100 quilômetros a leste de Moscou.
Navalny, detido por ter liderado manifestações não autorizadas contra o Kremlin, chegou a fazer uma greve de fome de 23 dias em abril. Na ocasião, ele protestava contra a falta de atendimento médico e contra o que classificou como “tortura” por privação de sono, alegando que um guarda o acordava de hora em hora durante a noite.
Em agosto, a Justiça russa abriu uma segunda acusação criminal contra Navalny, o que pode ampliar a sentença de prisão em três anos. A acusação: “incentivar cidadãos a cometerem atos ilegais”, por meio da Fundação Anticorrupção (FBK) que ele criou. Mais recentemente, uma terceira acusação, de “extremismo”, pode estender o encarceramento por até uma década.
Caso seja condenado em alguma das novas acusações, Navalny será mantido sob custódia no mínimo até o fim da próxima eleição presidencial, em 2024, quando chega ao fim o atual mandato de seis anos de Putin no Kremlin.
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