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terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

Moçambique não reconquistará Cabo Delgado sem ajuda, diz analista

A recaptura de Cabo Delgado, província de Moçambique tomada por militantes do EI (Estado Islâmico), não será possível sem ajuda externa. A análise é do pesquisador do movimento jihadista sunita, Tore Hamming, ao portal Lawfare.

A primeira investida do Exército moçambicano contra os insurgentes do EI aconteceu na cidade portuária de Mocímboa da Praia, em agosto de 2020. Sem sucesso, os militantes tomaram parte das armas e mataram cerca de 20 soldados.

Desde então, a violência é crescente na região. Mais de 565 mil pessoas já deixaram a província, rica em gás natural. O terror gerado pelos militantes, que recrutam jovens sem perspectivas, soma dois mil mortos.

Moçambique não reconquistará Cabo Delgado sem ajuda externa, diz analista
Crianças refugiadas dos ataques de insurgentes do Estado Islâmico em Metuge, Cabo Delgado, em dezembro de 2020 (Foto: Unicef/Mauricio Bisol)

O número, porém, pode se multiplicar para dezenas de milhares, como alertaram agências humanitárias à Reuters. Em um dos casos de brutalidade, 50 pessoas foram decapitadas em um campo de futebol, em novembro.

Para Hamming, a tomada de Cabo Delgado é, até agora, um case de sucesso do EI. Enfraquecido em 2016, insurgentes voltaram a se reunir e demonstram sua capacidade de atrair milícias locais, fornecer plataformas de organização e, em troca, lucrar com seus ataques.

Forças do exterior

A extrema desigualdade social, as tensões étnicas, a grande população jovem do país – 45% tem entre 15 e 35 anos – e o alto desemprego (cerca de 80%) impulsionam o conflito em Moçambique.

“O problema a curto prazo, porém, é que o exército moçambicano simplesmente não está à altura da tarefa de combater sozinho os militantes”, aponta Hamming.

A falta de treinamento adequado já gera denúncias de atrocidades contra civis e o governo passou a contar com milícias locais para compensar as deficiências. Maputo também já busca auxílio estrangeiro com os mercenários russos Wagner Group, acusados de crimes de guerra na Líbia.

Moçambique não reconquistará Cabo Delgado sem ajuda externa, diz analista
Imagem divulgada pelo Estado Islâmico após tomada de controle da cidade portuária de Mocímboa da Praia, em Moçambique (Foto: Reprodução)

Países como a Tanzânia, África do Sul, Portugal, EUA e Reino Unido já estão em negociação, mas não há qualquer intervenção até o momento. “No Ocidente, é provável que haja pouco interesse político em engajar-se militarmente”, disse Hamming.

Os países se voltarão à Moçambique caso os estragos ameacem os interesses ocidentais e saiam do âmbito local ou regional. A suspensão de um projeto de extração de gás liquefeito da empresa francesa de energia Total pode ser um motivo.

Insurgência do EI

O EI ganhou espaço em Moçambique por meio do grupo islâmico Ahlu Sunnah wa-l-Jama’ah, também conhecido como Al-Shabab – sem relação com a agremiação filiada à Al-Qaeda da Somália.

Historiadores estimam que o grupo – hoje conhecido como Estado Islâmico de Moçambique – surgiu como uma seita islâmica em 2007. À época, o grupo se opunha às instituições educacionais formais, orar apenas três vezes ao dia e vestindo sapatos.

Isolada por alguns anos, em 2015 passou a construir escolas e suas próprias mesquitas, onde incentivou o proselitismo e passou a oferecer educação à população local, inclusiva às mulheres.

Moçambique não reconquistará Cabo Delgado sem ajuda externa, diz analista
Famílias refugiadas após conflitos de insurgentes do EI em Cabo Delgado, Moçambique, em dezembro de 2020 (Foto: UN Photo/Mauricio Bisol)

Em consequência, o grupo se popularizou e acabou gerando novos confrontos com as entidades muçulmanas da região, que mantinham os costumes tradicionais do Islã.

Um queixa de líderes comunitários de Mocímboa da Praia, em outubro de 2017, resultou na prisão de 30 membros do grupo e foi o estopim para uma conflituosa relação que culminaria no encontro com o Estado Islâmico poucos anos depois.

Trinta ataques se seguiram desde 2017 até a primeira tomada de Mocímboa da Praia, em março de 2020. Em agosto, um novo ataque concretizou a união dos dois grupos: Al-Shabab e EI. Em um rebranding, o grupo local dedicou sua lealdade ao grupo.

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