Ao assumir a presidência da Argentina, em 2019, Alberto Fernández impulsionou as relações com um antigo parceiro comercial apagado durante o governo do sucessor Maurício Macri: a China.
Fernández, eleito em uma plataforma populista à esquerda, apelou a Beijing para driblar as dificuldades econômicas à mais crise da dívida externa. Desde então, a relação com o chineses é uma das mais próximas entre as nações Mercosul, que, exportadoras de commodities, tem a China como importante destino para suas mercadorias.
A boa relação é vantajosa para ambos. A Argentina oferece à China vastos recursos naturais, fornecimento de soja, de carne suína e de outros insumos agrícolas essenciais para alimentar sua população de 1,4 bilhão de habitantes.
Em troca, a classe média argentina tem acesso às importações de bens e serviços com alto valor agregado. A ajuda chinesa a Buenos Aires também foi essencial na pandemia: o governo já garantiu a compra de 30 milhões de vacinas contra a Covid-19 após o atraso de remessas da Rússia.
Não à toa, as relações com Beijing já são prioridade estratégica para o governo argentino. Não fosse a pandemia, Fernández teria viajado ao país asiático em novembro. A viagem foi remarcada para maio – provavelmente antes do encontro com os EUA, que rivalizam com a China como relevantes parceiros comerciais.
O esforço por um compromisso sino-argentino é cada vez mais significativo – isso em meio a um relevante distanciamento de Washington, apontou o think tank Global Americans. Em artigo, a organização reuniu 12 pilares da atual relação sino-argentina, que listamos a seguir.
Comércio
O comércio entre a China e a Argentina cresceu 11 vezes desde 2001: os países fecharam 2019 com US$ 16,1 bilhões de trocas bilaterais. O fluxo de produtos e serviços entre os dois países ganhou tração a partir de 2007, quando os argentinos passaram a exportar soja e minerais para os chineses.
Mineração
Apesar da participação limitada, as empresas chinesas têm crescido no setor de mineração argentino. O destaque é a extração de lítio, essencial para fabricação de baterias de veículos elétricos e aparelhos eletrônicos.
A China também mantém duas grandes minas no país: Campana Mahuida, de cobre, e Sierra Grande, de ferro. Apesar de ambas terem interrompido sua produção, Beijing já sinalizou que pretende retomar as operações em breve.
Petróleo
A Argentina foi um dos primeiros países latinos a receber empresas da China por meio de fusões e aquisições no setor petroleiro após a crise de 2008. Há empresas chinesas operando nas províncias de Santa Cruz e Chubut, na Patagônia, e Mendoza, na Cordilheira dos Andes.
Agricultura
Além de se tornar o principal comprador da soja argentina, a China já sinalizou um investimento de US$ 3,5 bilhões para a construção de 25 fazendas de suínos no norte do país, que fornecerão a um mercado com constante e crescente demanda por carne.
Protestos contrários à criação dos espaços e de setores que veem com ressalvas uma forte participação da China na economia platina, porém, levaram o acordo a um stand-by. Há indícios de que algumas províncias estejam negociando a questão individualmente.
Construção e logística
É sabido que Beijing se utiliza de sua alta capacidade de investir em infraestrutura para estabelecer e fortalecer laços diplomáticos em todo o mundo. Nos últimos cinco anos, a Argentina recebeu 11 projetos financiados por empresas ou bancos chineses.
O mais significativo envolve melhorias no sistema ferroviário Belgrano Cargas, que liga Buenos Aires à província de Jujuy, já próxima à fronteira com a Bolívia. O projeto é estimado em US$ 4,7 bilhões e foi assinado em dezembro de 2020.
Já a CNTIC (Corporação Nacional de Importação e Exportação da China) está construindo um gasoduto de 50 quilômetros e uma linha de alta tensão de 132 km para fibra óptica na província de Entre Ríos, no nordeste do país e localizada na confluência entre os rios Paraná e Uruguai.
Infraestrutura elétrica
Um projeto de US$ 4,7 milhões estima a construção de hidrelétricas no Rio Santa Cruz, província ao sul do país de onde vem a família da vice-presidente Cristina Kirchner. Os recursos são em parte fornecidos pelo grupo chinês Gezhouba, multado e condenado por crimes ambientais em 2016.
Ao assumir o poder, Fernández reiniciou o projeto apesar dos receios de novos problemas ambientais. Além disso, há planos para a construção de um quarto reator nuclear não complexo de Atucha, planta localizada à beira do rio Paraná.
Tecnologia
A Argentina está no foco das tentativas chinesas de exportar suas tecnologias de “cidade inteligente” e sistemas de vigilância. Províncias como Jujuy e Buenos Aires já possuem redes de câmeras chinesas.
Durante a pandemia, a Huawei, que domina o mercado argentino de telecomunicações, emprestou câmeras de imagem térmica para os principais aeroportos internacionais e terminais de ônibus do país. O objetivo era identificar à distância passageiros com febre.
Cooperação espacial
O telescópio em Bajada del Agrio, em Neuquén, na Patagônia, é agora operado majoritariamente por militares chineses. A localização da estação é essencial para o rastreamento de objetos no espaço e auxilia o projeto espacial chinês.
Apesar de a instalação não possuir uma finalidade militar explícita, o Comando Sul dos EUA vê o projeto com preocupação. A estrutura é capaz de captar sinais de satélites norte-americanos e de outros países no espaço.
Bancário
Desde 2005, os bancos chineses concederam US$ 17,1 bilhões em empréstimos para apoiar projetos de infraestrutura e ofereceram outros US$ 18,5 milhões como uma injeção de liquidez financeira para o governo argentino.
Em agosto, a China assinou um acordo para renovar a linha de crédito do país por mais três anos, mas não concordou em estender essa vantagem, como queria Buenos Aires.
Como o principal credor dos países pobres, Beijing tem tentado diminuir suas linhas de crédito desde o início da pandemia. A reputação da Argentina em suas negociações com o FMI (Fundo Monetário Internacional) também não ajudou a garantir novos recursos dos chineses.
Cooperação para segurança
Um embaixador chinês já teria oferecido à Argentina veículos blindados e aeronaves de combate JF-17 – que requerem parte da montagem no país de destino. Além do apoio material, militares argentinos viajam regularmente à China para cursos de educação militar.
Deslizes
A despeito desse fortalecimento de laços diplomáticos e comerciais entre China e Argentina, também cresce o crime organizado chinês no país. Em 2015, o governo tentou barrar a proliferação de crimes como extorsão e ataques, em operação onde houve auxílio de militares chineses.
As medidas não surtiram efeito, e as redes chinesas de crime organizado permanecem fortes no país e em movimento de expansão por toda a América Latina.
Outro fator de tensão é a pesca ilegal em águas territoriais da Argentina por navios da frota offshore chinesa. A atividade já envolve 603 toneladas de camarão ilegal encontrado nos porões de embarcações.
Em ao menos três ocasiões, a guarda costeira local identificou pesca ilegal de navios chineses. A primeira ocorreu em 2015, quando os crustáceos foram encontrados depois que o navio quebrou em águas argentinas. No ano seguinte, outro navio afundou na região.
Em 2018, outro navio chinês foi apreendido por pescar ilegalmente nas águas do país latino – prática que a China realiza também nos vizinhos próximos, como o Equador.
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