Centenas de parentes de uigures detidos pelo governo da China foram submetidos a trabalho forçado na província de Xinjiang, no noroeste do país. O episódio ocorreu na aldeia de Sheyih Mehelle, onde ao menos cem pessoas da etnia uigur foram presas, e a informação foi confirmada por uma fonte que não quis se identificar e por uma autoridade policial local, de acordo com a rede Radio Free Asia.
As pessoas submetidas a trabalho forçado são na maioria mulheres e idosos, enviados a fábricas de Xinjiang, onde trabalham de dez a 12 horas diárias, sempre sob a rígida supervisão de agentes estatais. Todos são provenientes de Sheyih Mehelle, que tem cerca de 700 habitantes e faz parte da vila de Cholunqay, com mais de dez mil residentes.
Entre 2017 e 2019, os dois primeiros anos de detenção, os parentes dos presos eram obrigados a frequentar aulas de educação política. Depois, passaram a trabalhar nas fábricas, com salários mensais que vão de mil a dois mil yuans (R$ 735 a R$ 1.470).
De acordo com o policial que confirmou a informação, “há cerca de 500 pessoas trabalhando” em Yamachang, nos arredores da cidade de Ghulja. “Lá existem fábricas que fazem roupas, meias e luvas”, disse o homem.
Segundo o agente de polícia, os trabalhadores são levados por agentes do governo às 6h e retornam para casa às 18h. “Eles têm filhos em idade escolar e alguns têm idosos para cuidar em casa. É por isso que eles são trazidos de volta à noite”, afirmou. “Tem até um que está sempre doente”, prosseguiu, referindo-se a um dos uigures submetidos a trabalho forçado.
Caso semelhante
O caso de Sheyih Mehelle não é isolado e parece repetir um padrão em se tratando de minorias étnicas muçulmanas. Gulzire Awulqanqizi, uma muçulmana cazaque étnica que passou por um campo de internação em Ghulja, entre julho de 2017 e outubro de 2018, disse que a situação dela era idêntica.
Hoje vivendo no Estado da Virginia, nos EUA, Awulqanqizi diz que foi obrigada a trabalhar em uma fábrica de luvas depois de ser autorizada a deixar o sistema de reeducação do governo. Ela era levada ao trabalho por um ônibus e recebia 600 yuans (R$ 441 no câmbio atual) por mês.
“Íamos trabalhar a partir das 7h da manhã e tínhamos 40 minutos para almoçar”, disse ela. “Depois do trabalho na fábrica, íamos para nossos dormitórios”, conta Awulqanqizi, que ainda precisava realizar os estudos políticos obrigatórios e passar por interrogatórios policiais.
Por que isso importa?
A comunidade uigur é uma minoria muçulmana de raízes turcas que habita a região autônoma de Xinjiang, no noroeste da China. A província faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes étnicas e linguísticas.
Os uigures, cerca de 11 milhões, enfrentam discriminação da sociedade e do governo chinês e são vistos com desconfiança pela maioria han, que responde por 92% dos chineses. Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.
Estimativas apontam que um em cada 20 uigures ou cidadãos de minoria étnica já passou por campos de detenção de forma arbitrária desde 2014.
O governo de Joe Biden, nos EUA, foi o primeiro a usar o termo “genocídio” para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e mais recentemente a Lituânia se juntou ao grupo.
A China nega as acusações de que comete abusos em Xinjiang e diz que as ações do governo na região têm como finalidade a educação contraterrorismo, a fim de conter movimentos separatistas e combater grupos extremistas religiosos que eventualmente venham a planejar ataques terroristas no país. .
O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Zhao Lijian, afirma que o trabalho forçado uigur é “a maior mentira do século”. “Os Estados Unidos tanto criam mentiras quanto tomam ações flagrantes com base em suas mentiras para violar as regras do comércio internacional e os princípios da economia de mercado”, disse ele.
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