A USCIRF (Comissão dos EUA sobre Liberdade Religiosa Internacional, da sigla em inglês), órgão criado pelo Congresso norte-americano para abordar a liberdade religiosa em todo o mundo, classificou o Afeganistão como um “país de particular preocupação” devido à repressão religiosa, que se intensificou desde a tomada de poder pelo Taleban em 15 de agosto de 2021.
Em outubro, a USCIRF já havia afirmado que as condições para as minorias religiosas no Afeganistão “se deterioraram” desde que os talibãs assumiram o controle do país. E a situação piorou de lá para cá, de acordo com o relatório anual da Comissão, cuja edição 2022 foi publicada na segunda-feira (25).
“Apesar das declarações iniciais do Taleban de que havia reformado alguns elementos de sua ideologia, os afegãos que não aderem à interpretação dura e estrita do islamismo sunita e os adeptos de outras religiões ou crenças correm o risco de grave perigo”, diz o documento. “Relatos indicam que o Taleban continua perseguindo minorias religiosas e punindo moradores em áreas sob seu controle de acordo com sua interpretação extrema da lei islâmica”.
O documento cita também o Estado Islâmico-Khorasan (EI-K), grupo extremista que faz oposição ao Taleban e que tem realizado frequentes e violentos ataques em território afegão, tendo como alvo também as minorias religiosas no país.
No caso do EI-K, até mesmo os muçulmanos xiitas correm risco, pois têm sido o alvo preferencial nos atentados mais recentes. Recentemente, o grupo assumiu a autoria de um ataque que matou 11 pessoas em uma mesquita na cidade de Mazar-e-Sharif, na quinta-feira passada (21).
A classificação do Afeganistão como “país de particular preocupação” não ocorria desde 2001, ano em que o Taleban deixou o poder em seu governo anterior, iniciado em 1996. Países são inseridos nessa lista “por se envolverem em violações sistêmicas, contínuas e flagrantes da liberdade religiosa, conforme definido pela Lei Internacional de Liberdade Religiosa (IRFA)”.
Em virtude da classificação, o relatório recomenda que o governo norte-americano imponha “sanções específicas aos funcionários do Taleban responsáveis por graves violações da liberdade religiosa, congelando os bens desses ‘indivíduos’ e/ou proibindo sua entrada nos Estados Unidos sob as autoridades financeiras e de vistos relacionadas aos direitos humanos”.
Cristãos perseguidos
Mais de 360 milhões de cristãos em todo o mundo sofrem perseguição e discriminação em consequência da fé. É o que aponta o relatório anual da ONG Open Doors (Portas Abertas, em tradução literal), que foi divulgado em janeiro deste ano e destacou 50 países onde até cem milhões de cristãos enfrentam perigo por causa de suas crenças. No topo da lista estão Afeganistão, Nigéria e Índia, com a China em 17º.
O Afeganistão encabeça a relação de nações mais perigosas do mundo para os fiéis que seguem o Cristianismo, desbancando a Coreia do Norte da liderança pela primeira vez em 20 anos.
De acordo com o presidente da Portas Abertas, David Curry, o desastre humanitário em Cabul trouxe repercussões massivas. “A grande questão dos refugiados desencadeada pela tomada do poder significa que os talibãs tentarão matar aqueles suspeitos de serem cristãos, bem como aqueles de diferentes visões políticas”.
Em relação ao resto do mundo, Christian Nani, diretor de Portas Abertas Itália, diz que a intolerância atingiu nível recorde. “Desde que realizamos este relatório, há cerca de 30 anos, este é o nível mais elevado em termos absolutos de perseguição. Um cristão em cada sete no mundo é perseguido. Na África um cristão em cada cinco e na Ásia dois em cada cinco. Estamos assistindo ao crescimento de um fenômeno que diz respeito à vida de comunidades e de indivíduos cristãos, sob vários pontos de vista”, disse ele liderança ao portal Vatican News.
O estudo da Portas Abertas também relatou que 5.898 cristãos foram mortos por sua fé em 2021, número que representa um aumento de 24% em relação a 2020. Cerca de 79% desses assassinatos (4.650) ocorreram na Nigéria. Aproximadamente 11% (620 homicídios) foram no Paquistão.
Por que isso importa?
A questão da perseguição religiosa não pode ser ignorada pelo Taleban, que busca reconhecimento global como governo de direito do Afeganistão. Enquanto isso não ocorre, o país continua marginalizado da comunidade internacional, justamente em razão das acusações de abusos dos direitos humanos e da forte repressão, sobretudo contra mulheres.
Mais que legitimar os talibãs internacionalmente, o reconhecimento fortaleceria financeiramente um país pobre e sem perspectiva imediata de gerar riqueza. Em meio à crise profunda que os afegãos enfrentam, os Estados Unidos liberaram para ajuda humanitária., em fevereiro de 2022, US$ 3,5 bilhões em ativos congelados do Banco Central do Afeganistão em solo norte-americano.
Quando o governo afegão se dissolveu, com altos funcionários deixando o país, incluindo o presidente e o governador interino do banco central, deixou para trás pouco mais de US$ 7 bilhões em ativos depositados no Federal Reserve Bank dos EUA. Como não estava mais claro quem tinha autoridade legal para obter acesso a essa conta, o Fed tornou os fundos indisponíveis para saque.
Washington congelou os fundos afegãos mantidos nos EUA após o grupo islâmico ascender ao poder, em agosto do ano passado. Ultimamente, o governo Biden vinha sendo pressionado a disponibilizar o dinheiro sem reconhecer o regime do Taleban, que alega ser o dono do dinheiro. O valor, então, acabou liberado, com a outra metade destinada a pagar indenizações às vítimas dos ataques de 11 de setembro.
O Afeganistão tem mais US$ 2 bilhões em reservas, depositados em países como Reino Unido, Alemanha, Suíça e Emirados Árabes Unidos. A maioria desses fundos também está congelada. Autoridades norte-americanas relataram ter entrado em contato com aliados para detalhar sua iniciativa, mas Washington foi o primeiro a oferecer um plano sobre como usar os ativos congelados para auxiliar o povo afegão.
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