Desde que a Covid-19 tomou o mundo, fechando muitos países para o turismo e trancando as pessoas em casa para evitar a propagação do coronavírus, o Sudeste Asiático viu o número de ataques terroristas declinar drasticamente. Agora, com a reabertura de seus países para o turismo, a região se prepara para a possibilidade de os grupos extremistas voltem a agir, o que coloca em alerta as forças de segurança. As informações são da revista The Diplomat.
Não foi apenas o coronavirus que reduziu os índices de violência extremista no Sudeste Asiático. Pesou muito a eficiência das medidas de contraterrorismo em países como as Filipinas, que usaram as forças armadas para derrubar líderes terroristas; a Malásia, escorada no Comando de Segurança Oriental Sabah (ESSCOM); e a Indonésia, através do esquadrão de elite Densus 88 (D88).
As operações terroristas no Sudeste Asiático atingiram um pico histórico em 2019. No ano seguinte, tiveram uma queda brusca, e os números voltaram a baixar em 2021.
Segundo especialistas, há uma outra razão para a redução da atividade jihadista: os grupos radicais islâmicos usaram o período de pandemia para se reagrupar, recrutar novos seguidores, buscar financiamento e treinar seus membros. É o que eles chamam de i’dad, a preparação para a jihad.
O ministro da Defesa de Singapura, Ng Eng Hen, já havia alertado no final de março que o terrorismo tende a ressurgir. “Com a remoção das restrições de viagens da Covid, podemos esperar um aumento na atividade terrorista”, disse ele em um fórum de segurança realizado em Kuala Lumpur, na Malásia, de acordo com o jornal South China Morning Post.
O ministro endossa a análise dos especialistas e diz que a pandemia serviu para os grupos recrutarem novos seguidores através da internet. “Grupos terroristas globais como o Isis (Estado Islâmico) e a Al-Qaeda provaram ser resilientes e adaptáveis. Eles mantiveram suas estratégias de recrutamento e radicalização atualizadas e estão explorando o ciberespaço com grande efeito”, afirmou Ng.
Migração jihadista
Um dos maiores desafios é lidar com os indivíduos que deixaram seus países para lutar ao lado de grupos extremistas no exterior. Primeiro, houve uma leva de seguidores que viajaram para combater a União Soviética na guerra do Afeganistão. Depois, houve uma segunda onda de migrações rumo ao califado do Estado Islâmico (EI) no Iraque e na Síria. A terceira onde ocorreu em 2017, durante a Batalha de Marawi, entre as forças do governo das Filipinas e militantes dos grupos extremistas Abu Sayyaf e Maute.
Um dos resultados dessas ondas migratórias é a presença atualmente de cerca de 700 indonésios e 100 malaios no campo de Al-Hol, na Síria, ou na prisão de Al-Hasakah, no nordeste do Iraque. Além dos demais extremistas que deixaram seus países para se unir à jihad e não retornaram. Assim, quando as condições permitirem, jihadistas que vivem no exterior podem voltar para casa com o objetivo de realizar ataques domésticos.
Atualmente, os principais grupos extremistas do Sudeste Asiático, como o filipino Abu Sayyaf e o indonésio Jemaah Islamiyah (JI), contam em suas fileiras com muitos cidadãos que foram combater fora do país e voltaram com experiência e conexões que permitiram a eles facilitar, organizar e conduzir ataques domésticos. E isso pode ressurgir com força agora.
A fim de conter o problema, as forças de segurança e os governos têm agido. A região endureceu a vigilância nas fronteiras, melhorou o compartilhamento de inteligência e sufocou o financiamento do terrorismo.
Diante do novo cenário que se apresenta, além de sustentar tais políticas, é preciso atualizá-las e revitalizá-las. Além de fortalecer a resposta multilateral dos Estados à ameaça, através de fiscalização local e acordos bilaterais de inteligência e extradição. Só assim será possível sustentar os atuais níveis reduzidos de ameaça terrorista.
Por que isso importa?
Embora as ações antiterrorismo globais tenham enfraquecido os dois principais grupos jihadistas do mundo, EI e Al-Qaeda, ambos conseguem se manter relevantes e atuantes. A estratégia dessas duas organizações para se manterem vivas inclui o recrutamento de novos seguidores através da internet e a forte presença em zonas de conflito, sobretudo na África, onde são representadas por grupos afiliados regionais.
Em 2017, o exército iraquiano anunciou a derrota do EI no Iraque, com a retomada de todos os territórios que a organização dominava desde 2014. O grupo, que chegou a controlar um terço do país, hoje mantém por lá apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos. Já as Forças Democráticas Sírias (FDS), apoiadas pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pelos extremistas na Síria.
Em janeiro deste ano, o exército norte-americano impôs nova derrota ao EI com o anúncio da morte de Amir Muhammad Sa’id Abdal-Rahman al-Mawla, principal líder da facção. Ele morreu durante uma operação antiterrorismo na Síria, em mais um duro golpe contra o grupo, que em 2019 havia perdido o líder anterior, Abu Bakr al-Baghdadi.
No caso da Al-Qaeda, além de igualmente manter facções relevantes na África, também ajudou a fortalecer o grupo a tomada de poder pelo Taleban no Afeganistão. De acordo com a ONU (Organização das Nações Unidas), o território afegão pode virar um porto seguro para a organização jihadista e suas afiliadas, bem como “potencial ímã para combatentes terroristas de outras regiões viajarem ao país”.
“Não há sinais recentes de que o Taleban tenha tomado medidas para limitar as atividades de combatentes terroristas estrangeiros no país. Pelo contrário, os grupos terroristas gozam de maior liberdade lá do que em qualquer momento da história recente”, diz relatório da ONU publicado em fevereiro deste ano.
O documento destaca, ainda, que a Al-Qaeda chegou a parabenizar publicamente os talibãs pela ascensão ao poder. E alega que um filho do ex-terrorista Osama Bin Laden, Abdallah, visitou o Afeganistão em outubro de 2021 para reuniões com o Taleban.
No Brasil
Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.
Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.
Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.
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