O oposicionista russo Alexei Navalny, atualmente preso em Moscou, foi anunciado na quarta-feira (20) como vencedor do Prêmio Sakharov, concedido anualmente pelo Parlamento Europeu (PE). A vitória, além de amplificar globalmente a voz do ativista no combate ao autoritarismo e à corrupção no governo de Vladimir Putin, reforça o posicionamento antagônico da União Europeia (UE) em relação a Moscou.
O italiano David Sassoli, presidente do PE, evidenciou a posição do bloco ao parabenizar o vencedor em sua conta no Twitter. “Alexei @navalny é o vencedor do #SakharovPrize deste ano. Ele lutou incansavelmente contra a corrupção do regime de Vladimir Putin. Isso custou a ele sua liberdade e quase sua vida. O prêmio de hoje reconhece sua imensa bravura, e reiteramos nosso apelo para sua libertação imediata”.
Alexei @navalny is the winner of this year’s #SakharovPrize. He has fought tirelessly against the corruption of Vladimir Putin’s regime. This cost him his liberty and nearly his life. Today’s prize recognises his immense bravery and we reiterate our call for his immediate release pic.twitter.com/Jox7I280kz
— David Sassoli (@EP_President) October 20, 2021
Para o ativista Marat Gelman, a vitória de Navalny vai reverberar mais no exterior do que na Rússia, devido à censura doméstica que o Kremlin exerce na internet. “Isso não mudará as opiniões sobre Navalny [na Rússia]”, disse ele à organização de mídia estatal norte-americana Radio Free Europe. “As pessoas que assistem à televisão [estatal russa] receberão mais uma afirmação de que Navalny é um canalha, um agente americano. O balanço de forças não mudará”.
Porém, Alina Polyakova, presidente do Centro de Análise de Política Europeia, com sede em Washington, entende que o prêmio fortalece a imagem de Navalny no exterior, e essa é uma importante vitória. “É um forte reconhecimento de que Alexei Navalny não é um extremista ou terrorista, mas é, na verdade, um lutador pela liberdade,” disse. Segundo ela, agora ele se torna uma “figura global, não apenas uma figura russa”, e é visto “sob uma luz totalmente diferente”.
Dissidente soviético
Curiosamente, o nome do prêmio remete a um dissidente político soviético, o físico Andrei Sakharov. Conforme relatório publicado pelo PE quando da nomeação de Navalny, o objetivo é homenagear “indivíduos e organizações excepcionais que defendem os direitos humanos e as liberdades fundamentais”.
No panteão dos vencedores, o russo fará companhia a figuras como o ex-presidente sul-africano Nelson Mandela e paquistanesa Malala Yousafzai, ativista pelos direitos das mulheres e pela educação feminina. Ambos ganharam também o Nobel da Paz.
A edição 2021 do Prêmio Sakharov tinha mais quatro concorrentes. Entre eles um grupo de 11 mulheres afegãs lembradas por sua luta por direitos humanos e igualdade no país dominado pelo Taleban. Na nomeação, o PE recorda a passagem anterior dos talibãs pelo poder, entre 1996 e 2001, quando “mulheres viviam casamento forçado, alta mortalidade materna, baixa alfabetização, testes de virgindade forçada e não podiam viajar sem um homem”.
Outra candidata era Jeanine Áñez, política boliviana e “símbolo da repressão contra dissidentes e da privação do devido processo legal e do Estado de Direito na América Latina”. Já Sultana Khaya é uma ativista e defensora dos direitos humanos da República Árabe Saharaui Democrática, território do Saara Ocidental que é parcialmente reconhecido internacionalmente como nação independente. Por fim, concorria a Global Witness, ONG britânica que investiga abusos ambientais nos setores de gás, petróleo, mineração e madeira.
Por que isso importa?
Navalny ganhou destaque ao organizar manifestações e concorrer a cargos públicos na Rússia. A principal plataforma do oposicionista é o combate à corrupção no governo de Vladimir Putin, em virtude da qual ele uma cobra profunda reforma na estrutura política do país.
Em agosto de 2020, durante viagem à Sibéria, Navalny foi envenenado e passou meses se recuperando em Berlim. Voltou a Moscou em janeiro de 2021 e foi detido ainda no aeroporto. Em fevereiro, foi julgado e condenado a dois anos e meio de prisão por violar uma sentença suspensa de 2014, quando foi acusado de fraude. Promotores alegaram que ele não se apresentou regularmente à polícia em 2020, justamente quando estava em coma pela dose tóxica.
Encarcerado em uma colônia penal de alta segurança, ele chegou a fazer uma greve de fome de 23 dias em abril, para protestar contra a falta de atendimento médico. Em junho de 2021, um tribunal russo proibiu os escritórios regionais de Navalny e sua Fundação Anticorrupção de funcionarem, classificando-as como “extremistas”.
Em agosto, a Justiça russa abriu uma nova acusação criminal contra o oposicionista, o que poderia ampliar a sentença de prisão dele em três anos. Ele foi acusado de “incentivar cidadãos a cometerem atos ilegais”, por meio da Fundação Anticorrupção (FBK) que ele criou. Mais recentemente, em setembro, uma terceira acusação contra, por “extremismo”, ameaça estender o encarceramento por até uma década.
Caso seja condenado em alguma das novas acusações, Navalny será mantido sob custódia no mínimo até o fim da próxima eleição presidencial, em 2024, quando chega ao fim o atual mandato de seis anos de Vladimir Putin no Kremlin.
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