O grupo terrorista Boko Haram não é o único desafio de segurança da Nigéria. Pelo contrário: o país africano enfrenta um “estado de emergência” devido à insegurança contínua em diversas partes do país, como já classificou o presidente Muhammadu Buhari.
A violência armada não ocorre em todo o território, mas em corredores geográficos específicos. Há conflitos envolvendo gangues, políticos e etnias que também colocam em risco a segurança da nação mais populosa da África, com 174 milhões de habitantes, onde a taxa de desemprego chega a 33%.
Com informações do think tank norte-americano Africa Center for Strategic Studies, entenda a atual situação da violência em todo o território nigeriano.
Boko Haram e grupos extremistas
Dominante no estado de Borno, noroeste da Nigéria, o Boko Haram é a principal ameaça de segurança do país. Com o ISWA (Estado Islâmico na África Ocidental), o grupo extremista é o responsável por todos os eventos violentos na região desde 2015.
À época, o governo central lançou uma ofensiva contra o grupo, que acabou desalojado de seus esconderijos – isolados até então. A partir dali, os extremistas passaram a montar uma série de ataques e invasões transfronteiriças em cidades e vilas de Borno até isolar a capital do estado, Maiduguri.
Assaltos, minas terrestres e postos de controle permanentes tornaram as rodovias de Borno intransitáveis, o que serviu para a rápida dominação do território e dos civis que permanecem na região. Hoje o grupo possui uma renda significativa e suprimentos militantes para garantir sua permanência no local.
As gangues e os sequestros
Os sequestros em massa como os das meninas de Zamfara, em março, se tornaram um negócio “lucrativo” para gangues criminosas no noroeste da Nigéria nos últimos cinco anos. Depois de 2014, quando o Boko Haram sequestrou as estudantes de Chibok, o governo foi forçado a responder – com dinheiro.
Relatos locais apontam que o governo de Buhari teria pago aos criminosos para garantir a libertação dos reféns – em sua maioria crianças e adolescentes –, apesar da negativa do presidente.
Denúncias já deram conta de que funcionários do governo se beneficiavam com as grandes quantias usadas no pagamento da libertação, em um país com altos índices de corrupção e violência.
Além dos sequestros, as gangues locais costumam invadir e entrar em confronto por minas de ouro artesanais. A corrida pelo metal atrai jovens pobres e desempregados, que veem na criminalidade uma forma de sobreviver. Só no estado de Zamfara, seriam dez mil criminosos espalhados por 40 campo, a maioria nas florestas.
Fazendeiros e pastores
Um corredor de confrontos entre fazendeiros e pastores sai da região central de Zamfara e se estende até o sul da Nigéria, em uma disputa que envolve a formação de milícias étnicas e execuções extrajudiciais. A região, conhecida como Cinturão Médio, é repleta de planícies férteis e pastagens e, por décadas, abrigava em sua maioria pastores nômades e agricultores.
A chegada da seca e as grandes alocações de terras para grandes proprietários, porém, afastaram os pastores de suas rotas de passagem, que diminuíram em 38% entre 1975 e 2013, confirme análise do órgão de georreferenciamento dos EUA.
Na região, os habitantes falam dezenas de línguas distintas e pouca unidade política, o que contribui para a “politização” dos confrontos por grandes latifundiários e políticos nigerianos.
Agricultores e pastores ganham as alcunhas de “colonos” contra “indígenas”, e há alegações de limpeza étnica. A violência entre os grupos já expandiu as milícias organizadas e se espalha, cada vez mais, rumo ao sul do país.
Separatismo
No estado de Biafra, atividades separatistas voltaram à tona nos últimos anos e geram violentos confrontos entre as forças de segurança da Nigéria e milícias locais. Em dezembro, a emissora de rádio Ipob (Povo Indígena de Biafra) estabeleceu a chamada Rede de Segurança Oriental, que opera como força paramilitar na região.
Tribunais nigerianos já buscam classificar o Ipob como grupo terrorista. O ex-líder da Frente de Salvação dos Povos do Delta do Níger, Asari Dokubo, anunciou a formação de um governo em Biafra em 2021. A disputa separatista remonta à guerra civil que devastou a região entre 1967 e 1970. Mais de um milhão de pessoas morreram no conflito, que pleiteava a independência de Biafra.
Navios piratas e violência policial
Mais de 95% dos sequestros de tripulantes no mundo acontece no Golfo da Guiné, epicentro global da pirataria. Apenas em 2020, 35 desses eventos ocorreram na costa da Nigéria. Há empresas por trás desses ataques, mas suas motivações e origens ainda não foram bem documentadas.
Em terra firme, porém, o que mais preocupa é a violência policial. O fim dos abusos de militares contra civis norteou os protestos pelo fim do Esquadrão Especial Antirroubo, chamado de SARS, em outubro e novembro de 2020. As manifestações, que se notabilizaram sob a alcunha de #EndSARS, denunciavam extorsão, tortura e violações dos policiais.
Há denúncias de perseguição a jornalistas e ativistas, além de execuções extrajudiciais conduzidas pelas tropas de comando. As forças da Nigéria responderam aos protestos com mais violência e dezenas de manifestantes foram mortos nas marchas pacíficas.
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