A invasão russa à Ucrânia reacendeu o debate sobre a prontidão das forças de Taiwan para se defender de uma potencial incursão chinesa à ilha. Por isso, o território semiautônomo passou a considerar a possibilidade de estender o serviço militar obrigatório de quatro meses para um ano, disse o ministro da Defesa Chiu Kuo-cheng na quarta-feira (23). As informações são do jornal britânico The Guardian.
Levando em conta um hipotético ataque de Beijing, Kuo-cheng avaliou o atual sistema de quatro meses de treinamento obrigatório como “inadequado”. E, visando a uma melhor capacitação das tropas, acrescentou que o órgão governamental revisaria o programa e apresentaria uma proposta de extensão.
Segundo ele, não haverá imediatismo, e qualquer mudança só entrará em vigor um ano depois de anunciada e mediante consulta aos legisladores.
Especialistas têm traçado um paralelo entre a situação Taiwan-China e a invasão russa ao território ucraniano. No entanto, para muitos deles, a situação não se encaixa em uma narrativa simples, e a ação militar chinesa é “improvável”.
A China, que reivindica Taiwan como parte de seu território, embora declare buscar uma “reunificação pacÃfica”, prometeu adotar “medidas drásticas” caso a ilha autogovernada execute qualquer tipo de movimento com vistas à independência. No ano passado, os aviões de guerra chineses bateram o recorde de incursões na zona de identificação de defesa aérea de Taiwan (ADIZ, da sigla em inglês), segundo dados do Ministério da Defesa Nacional.
Diante de tais ameaças, o governo taiwanês aumentou os gastos com defesa, investindo principalmente na aquisição de armas dos Estados Unidos. Paralelamente, vem tentando emplacar mudanças nas suas forças de defesa para resolver problemas de longa data com treinamento e recursos.
Os especialistas, porém, afirmam que o fato de Taiwan ser uma ilha torna a tarefa militar chinesa bem mais árdua que a russa. Sem contar a maior possibilidade de intervenção norte-americana, o que não ocorreu em socorro à Ucrânia.
Desde 2013, todos os homens acima de 18 anos são obrigados a cumprir quatro meses de serviço de formação nas forças armadas taiwanesas. Esse perÃodo, muitas vezes, é ridicularizado a ponto de ser comparado a um “acampamento de verão”. A dinâmica inclui cerca de cinco semanas de treinamento básico, permitindo aos participantes deduzir o tempo se tiverem feito aulas de treinamento na escola ou faculdade. Ao final da preparação, os jovens se tornam reservistas.
Porém, o recrutamento é tido como insuficiente nos principais setores da linha de frente, e a capacitação dos reservistas preocupa. Ou seja: mesmo com significativas compras de armas e aumentos nos orçamentos militares, há problemas de recursos humanos nas forças armadas de Taiwan.
Apoio popular
Uma pesquisa recente feita pela Fundação de Opinião Pública de Taiwan mostrou que a ampliação do serviço obrigatório seria uma medida com aprovação da população. O estudo, feito na semana passada, aponta que 75,9% dos entrevistados acredita que o programa deve ser estendido para um ano, a fim de melhorar as defesas de Taiwan contra os chineses.
O debate público inclui apelos crescentes para uma melhor prontidão civil nas áreas de resposta a emergências, primeiros-socorros e técnicas de guerrilha. O governo disse que preparará manuais civis sobre evacuação e exercÃcios de resposta. Chiu também anunciou na quarta (23) que os exercÃcios civis anuais de emergência em maio, que geralmente testam respostas a terremotos, incluiriam um ataque de mÃsseis simulado.
Base nas Ilhas Salomão
Em meio ao temor de Taiwan com a ameaça militar chinesa, as Ilhas Salomão confirmaram que estão em tratativas para um acordo de segurança com a China, anúncio que fez soar o alarme na vizinha Austrália e em outros aliados ocidentais no Indo-PacÃfico, segundo o The Guardian.
Documentos vazados na quinta-feira (24) indicam que uma base militar chinesa poderia ser montada na ilha ao norte da Austrália. O ministro da Defesa australiano, Peter Dutton, declarou preocupação com “o estabelecimento de qualquer base militar a menos de 2 mil km da costa”.
Uma cópia do projeto que circula nas redes sociais detalha que o acordo de segurança permitiria à China basear navios de guerra da Marinha no PacÃfico. Segundo o documento, a pequena nação também poderia “solicitar que a China envie policiais, policiais armados, militares e outras forças policiais e armadas”.
As Ilhas Salomão não confirmaram os detalhes do rascunho do acordo vazado, nem se o documento se trata de versão finalizada.
Por que isso importa?
Taiwan é uma questão territorial sensÃvel para os chineses. Relações exteriores que tratem o território como uma nação autônoma estão, no entendimento de Beijing, em desacordo com o princÃpio defendido de “Uma Só China“, que também encara Hong Kong como parte do território chinês. Diante da aproximação do governo taiwanês com os Estados Unidos, desde 2020 a China tem endurecido a retórica contra as reivindicações de independência da ilha.
Embora não tenha relações diplomáticas formais com Taiwan, assim como a maioria dos paÃses do mundo, os EUA são o mais importante financiador internacional e principal fornecedor de armas da ilha, o que causa imenso desgosto a Beijing, que tem adotado uma postura belicista na tentativa de controlar a situação.
Jatos militares chineses passaram a realizar exercÃcios militares nas regiões limÃtrofes com Taiwan e habitualmente invadem o espaço aéreo taiwanês, deixando claro que a China não aceitará a independência do território “sem uma guerra“.
O embate, porém, pode não terminar em confronto militar, e sim em um bloqueio total da ilha. É o que apontaram relatórios produzidos pelos EUA e por Taiwan em junho de 2021. O documento taiwanês pontua que Beijing não teria capacidade de lançar uma invasão em grande escala. Segundo o Pentágono, isso “provavelmente sobrecarregaria as forças armadas chinesas”.
Caso ocorresse, a escalada militar criaria um “risco polÃtico e militar significativo” para Beijing. Ainda assim, ambos os relatórios reconhecem que a China é capaz de bloquear Taiwan com cortes dos tráfegos aéreo e naval e das redes de informação. O bloqueio sufocaria a ilha, criando uma reação internacional semelhante à quela que seria causada por uma eventual ação militar.
Em artigo publicado em novembro, Michael Beckley e Hal Brands alertaram que o tempo está se esgotando para frear o Ãmpeto belicista chinês. “Os sinais de alerta históricos da China já estão piscando em vermelho. Na verdade, ter uma visão de longo prazo de por que e sob quais circunstâncias a China luta é a chave para entender o quão curto o tempo se tornou para os Estados Unidos e os outros paÃses no caminho de Beijing”.
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