Ativistas alinhados com a Rússia e pautados por uma ideologia antiocidental estão disseminando mensagens pró-Kremlin na África, usando uma rede coordenada em idioma francês que também ataca Paris em suas ex-colônias na África. A desinformação parte de plataformas como o Facebook, o YouTube, o Telegram e outras mídias digitais. As informações são da BBC.
A rede tem até nome: foi apelidada de “Russosfera”. As publicações acusam a França de “colonialismo” moderno, elogiam a postura do presidente Vladimir Putin, celebram o trabalho dos mercenários do Wagner Group no continente e chamam o exército ucraniano de “nazistas” e “satanistas”, reverberando a narrativa russa de sua chamada “operação militar especial”, que está às vésperas de completar um ano.
O cérebro por trás da “Russosfera” é Luc Michel, um ativista político belga de extrema direita, segundo pesquisadores da Logically, uma empresa que rastreia desinformação online. Michel, que se autodenomina stalinista, esteve envolvido na supervisão do referendo na Crimeia em março de 2014, tida por analistas como uma farsa política orquestrada pelo Kremlin que consultou a então república autônoma sobre a separação da Ucrânia e anexação à Rússia. O resultado não é reconhecido pela Ucrânia, EUA e União Europeia (UE).
A campanha de desinformação têm gerado estrago, segundo especialistas. Particularmente por gerar desconfiança das nações africanas em relação ai Ocidente, alimentando sentimentos pró-Kremlin e anti-Kiev no continente.
A exemplo do que aconteceu nas eleições dos EUA em 2016, quando Moscou interferiu para impulsionar o ex-presidente Donald Trump, a máquina de desinformação russa no estrangeiro evidencia como as plataformas de mídia social continuam sendo uma espécie de artilharia pesada na disseminação de mensagens pró-Rússia. E isso ocorre mesmo enquanto as big techs tentam combater fake news e a propaganda apoiada pelo Estado.
Segundo investigação da Inteligência norte-americana divulgada em setembro, a Rússia investiu ao menos US$ 300 milhões desde 2014 em um grande projeto para influenciar políticos e partidos de todo mundo, a fim de moldar decisões de nações estrangeiras conforme os interesses do Kremlin.
O fenômeno da Russosfera nasceu da restrição e banimento da mídia estatal russa de todas as principais plataformas sociais, tornando-se rapidamente ativa no Facebook, YouTube e Twitter, além do VK, uma versão doméstica da rede de Mark Zuckerberg. E os resultados já vieram à tona: segundo especialistas, a campanha trouxe rápida deterioração nas relações entre a França e várias nações africanas.
Kyle Walter, chefe das investigações dos EUA na Logically, foi quem rastreou as ações de Luc Michel na internet. Ele disse que entrou em contato com o ativista, que concordou em discutir a Russosfera.
“Ele nos disse que o criou, mas sem receber nenhum apoio financeiro da Rússia, argumentando que é financiado por ‘dinheiro privado'”, relatou Walter.
Michel também insistiu que não tinha ligações com o Wagner Group e seu chefe Yevgeny Prigozhin, detalhou Walter.
“Eu gerencio a guerra cibernética, a guerra da mídia. E Prigozhin conduz atividades militares”, disse Michel ao chefe das investigações.
Segundo Walter, as operações de influência capitaneadas pelo belga tiveram “sucesso significativo”. “Mesmo que os grupos tenham sido ajudados por bots no início, eles agora são uma autêntica operação de influência orgânica, com uma grande parcela de seguidores reais de toda a África”.
Influência a base de ódio, dinheiro e apoio militar
A Rússia vem expandindo seus esforços para construir influência na África há anos por meio de negócios de armas, investimento econômico e apoio militar na forma do Wagner Group.
Washington inclusive levou ao Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) sua preocupação com a crescente presença dos mercenários no continente. O governo norte-americano acusa os combatentes contratados por Prigozhin, que servem ao Kremlin, de prejudicar o combate ao extremismo islâmico, comprometer a democracia e subtrair de maneira abusiva recursos naturais das nações onde atuam.
Um desses países é o Mali. A retirada das forças francesas no país, bem como a raiva política que a França enfrenta na África Ocidental devido às suas políticas agressivas em relação à região, apresenta uma oportunidade significativa para Moscou aproveitar a região, mostrando-se como uma alternativa viável. Moscou se destaca em explorar essas oportunidades. Enquanto a raiva contra a França continuar fervendo, o Wagner Group encontrará países dispostos.
É difícil avaliar o impacto de campanhas específicas de desinformação, mas na África a mensagem pró-Rússia está sendo ouvida e amplificada, apontam analistas. Atualmente por influenciadores locais criados por Moscou.
“O sucesso de pessoas como Luc Michel se deve à sua oposição à França. Isso explora as queixas reais no território africano”, diz Kevin Limonier, professor da Universidade de Paris-8, estudioso das operações de informação de Moscou na África.
A maioria das operações de Luc Michel na África promove o pan-africanismo e o sentimento anticolonial, segundo Walter. Para ele, esse é um “ponto de encontro para apoiar a tese central de Michel: que os países africanos se beneficiariam com o distanciamento de seus colonizadores europeus e o desenvolvimento de laços mais estreitos com a Rússia”, disse o chefe de investigações.
A Russosfera surgiu em meados de 2021 e já acumula mais de 65 mil seguidores e assinantes.
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