Entre 300 e 400 mercenários russos do Wagner Group estão em atividade atualmente no Mali, a serviço do governo local. A estimativa foi apresentada por um alto funcionário do Ministério das Forças Armadas da França, país que é o principal aliado militar do governo malinês. As informações são da agência Reuters.
“Eu diria que há entre 300 a 400 membros do Wagner, e também treinadores russos que fornecem equipamentos”, disse a autoridade francesa, que relatou ainda o envio dos mercenários para a região central do país, onde se juntaram ao exército local.
Os relatos que chegam de Paris contestam a informação dada no final de dezembro pelo coronel Assimi Goita, que assumiu o governo do Mali no mais recente golpe de Estado, em maio de 2021. Segundo ele, os russos que atuam no país africano atualmente seriam soldados contratados apenas para treinar o exército local e fornecer equipamento militar, com o objetivo de combater organizações extremistas islâmicas.
A contratação dos mercenários do Wagner Group foi noticiada em setembro de 2021 pela rede britânica BBC, com um contrato avaliado em 9,1 milhões de euros (R$ 57,8 milhões). Desde o início, a iniciativa foi reprovada por Emmanuel Macron, presidente da França, e teria contribuído para a decisão do líder francês de reduzir sua presença militar no país africano.
“O fato de o Wagner estar em uma parte diferente do Mali limita o risco de interação, que seria muito difícil de [a França] aceitar”, disse a autoridade francesa. “Eles (a junta militar) fizeram a escolha de dar as costas aos europeus, americanos e africanos, e isso traz consequências”.
Em meio à turbulência política e social que atinge o Mali, outras nações decidiram fechar suas fronteiras e cortaram relações diplomáticas com o vizinho. Também foram impostas sanções econômicas pela Ecowas (Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental) em virtude da demora para realizar eleições democráticas após os últimos dois golpes de Estado, em 2020 e 2021. A presença de mercenários russos no país pesou na decisão.
Por que isso importa?
A instabilidade no Mali começou com o golpe de Estado em 2012, quando vários grupos rebeldes e extremistas tomaram o poder no norte do país. De quebra, a nação, independente desde 1960, viveu em maio de 2021 o terceiro golpe de Estado em um intervalo de apenas dez anos, seguindo o que já havia ocorrido em 2012 e também em 2020.
A mais recente turbulência política começou semanas antes do golpe, com a demissão do primeiro-ministro Moctar Ouane pelo presidente Bah Ndaw. Reconduzido ao cargo pouco depois, Ouane não conseguiu formar um novo governo, e a tensão aumentou com a falta de pagamento dos salários dos professores. O maior sindicato da categoria, então, começou a se preparar para uma greve.
Veio a noite do dia 24 de maio, quando o coronel Assimi Goita, vice-presidente do país, destituiu Ndaw e Ouane de seus cargos e ordenou a prisão de ambos na capital Bamako. Segundo ele, os dois líderes civis violaram a carta de transição ao não consultarem o militar na formação do novo governo.
Ao contrário do que ocorreu em golpes anteriores, que contaram com apoio popular, desta vez a maior parte da população malinesa rejeitou a tomada de poder por Goita, que derrubou o governo de transição recém-instituído e assumiu o comando do país. A população civil não foi às ruas protestar contra o militar, mas usou as redes sociais para mostrar sua insatisfação.
Militarmente, especialistas e políticos ocidentais enxergam uma geopolítica delicada na região, devido ao aumento constante da influência de grupos jihadistas e a consequente explosão da violência nos confrontos entre extremistas e militares. Além disso, trata-se de uma posição importante para traficantes de armas e pessoas, e o processo em curso de redução das tropas franceses, que atuam no país desde 2013, tende a piorar a situação.
Os conflitos, antes concentrados no norte do país, se expandiram inclusive para os vizinhos Burkina Faso e Níger. A região central do Mali se tornou um dos pontos mais violentos de todo o Sahel africano, com frequentes assassinatos étnicos e ataques extremistas contra forças do governo.
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