Um vídeo divulgado na internet pelo ISWAP (Estado Islâmico da África Ocidental) mostra crianças-soldado executando dois homens identificados como militares do exército da Nigéria. As imagens foram originalmente publicadas pelo SITE Intelligence Group, que monitora a atividade jihadista no mundo, com informações posteriormente reproduzidas pela agência Associated Press (AP).
O vídeo, possivelmente gravado na região do Lago Chade, no nordeste da Nigéria, mostra um homem com uniforme militar que diz ser membro das forças especiais nigerianas. Ele é executado com dois tiros na cabeça por um garoto de aproximadamente 12 anos de idade. Depois, outro suposto militar, que alega ter sido capturado em abril de 2021, é morto por um homem mascarado. Também há imagens de crianças-soldado treinando em campo aberto e estudando em salas de aula.
Segundo Rita Katz, diretora executiva do SITE Intelligence Group, o Estado Islâmico (EI), ao qual o ISWAP é vinculado, está “mais desesperado do que nunca para manter seu nome na discussão global, devido ao fato de que não tem mais um ‘califado’ físico fora de bases relativamente pequenas em diferentes países”. Ela faz referência ao fato de o grupo ter sido derrotado em seus dois principais domínios, Iraque e Síria, e atualmente apostar na África para ressurgir.
O vídeo, diz Katz, “demonstra o imenso foco do EI na África” e coloca “os holofotes na Nigéria como uma de suas fortalezas, projetando-se como uma força adaptativa e duradoura para o mundo”.
Tomasz Rolbiecki, analista da empresa de segurança ExTrac, que estuda a situação naquela região, afirma que o vídeo confirma o fato de o ISWAP ter “liberdade suficiente na área do Lago Chade para manter um campo de treinamento pequeno, mas permanente, para uma futura geração de insurgentes”.
O enfraquecimento do EI e, consequentemente, do ISWAP não significa que a facção esteja perto de uma derrota definitiva. “O ISWAP ainda é um grande grupo, com milhares de combatentes, trabalhando em cadeias de suprimentos e capaz de arrecadar centenas de milhares de dólares em impostos”, disse ele. “Mesmo que o exército nigeriano lançasse ofensivas maciças contra o ISWAP, levaria anos para conter totalmente a ameaça que este grupo representa”.
Crianças-soldado
As regiões central e oeste da África notificam o maior número de crianças-soldado do mundo, de acordo com o Unicef (Fundo para a Infância das Nações Unidas). Entre 2005 e 2020, estima-se que mais de 93 mil crianças tenham sido recrutadas e usadas em conflitos. São mais de 21 mil menores recrutados por forças governamentais e grupos armados na região somente entre 2016 e 2021.
Também nesse intervalo de cinco anos, cerca de 2,2 mil crianças foram vítimas de violência sexual, enquanto outras 3,5 mil foram sequestradas. As duas regiões africanas aparecem em segundo lugar entre as que mais registram esses delitos no mundo.
Pelo menos 1,5 mil ataques ocorreram em escolas e hospitais em nações como Burkina Faso, República Centro-Africana, Camarões, Chade, RD Congo, Mali, Mauritânia e Níger. As comunidades sofrem com a violência que foi agravada na pandemia.
Em 2005, a ONU introduziu um sistema que monitora e relata violações graves contra crianças, como recrutamento, sequestro, estupro e ataques a escolas e hospitais. O relatório ressalta que desde o período, uma em cada quatro violações ocorridas em todo o mundo ocorreu na África Ocidental e Central.
Os últimos anos têm sido marcados por um aumento da violência no Sahel, a região semiárida que se estende do norte do Senegal e compreende a Mauritânia, o Mali, o Burquina Fasso, o Níger, a Nigéria, o Chade, o Sudão e a Eritreia.
Por que isso importa?
Afiliado ao EI, o ISWAP foi formado em 2016 por dissidentes do Boko Haram insatisfeitos com as decisões do ex-líder Abubakar Shekau. Atualmente, se concentra em alvos militares e ataques de alto perfil, inclusive contra trabalhadores humanitários. Os dois grupos jihadistas disputam o controle do estado de Borno, no nordeste da Nigéria. Chegaram a surgir relatos de uma aliança entre as duas organizações rivais, informação jamais confirmada oficialmente.
Desde 2021 o ISWAP adquiriu importância estratégica para o EI, que tem se enfraquecido financeira e militarmente nos últimos anos e, assim, aposta em sua força no continente africano para tentar ressurgir globalmente.
Em 2017, o Iraque anunciou ter derrotado a organização, com a retomada de todos os territórios que ela dominava desde 2014. O grupo, que chegou a controlar um terço do país, hoje mantém células adormecidas que lançam ataques esporádicos. Já as Forças Democráticas Sírias (FDS), apoiadas pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pelos extremistas no país.
De acordo com um relatório do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), publicado em julho deste ano, a prioridade do EI atualmente é “o reagrupamento e a tentativa de ressurgir” em seus dois principais domínios, Iraque e Síria. O documento sugere, ainda, que o grupo teve considerável perda financeira recentemente, devido a dois fatores: as operações antiterrorismo no mundo e a má gestão de fundos por parte de seus líderes.
Paralelamente à derrocada do EI, a pandemia de Covid-19 reduziu o número de ataques terroristas em regiões sem conflito, devido a fatores como a redução do número de pessoas em áreas públicas. Entretanto, grupos jihadistas têm se fortalecido em zonas de conflito, caso da África Ocidental, o que explica a importância de fortalecer o ISWAP para manter a relevância global.
Em meio aos conflitos que se intensificam no nordeste da Nigéria, estima-se que cerca de 1,74 milhão de crianças menores de cinco anos sofram de desnutrição aguda entre setembro de 2021 e agosto de 2022 na região. Esse número inclui mais de 600 mil casos de desnutrição aguda grave.
No Brasil
Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.
Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.
Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.
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