Cerca de 60 cristãos chineses que vivem atualmente na ilha de Jeju, na Coreia do Sul, correm o risco de repatriação para a China após terem seus pedidos de asilo negados pelo governo sul-coreano. São membros da Igreja Mayflower de Shenzhen que temem a repressão religiosa estatal em caso de retorno à China, de acordo com a rede Radio Free Asia.
Os fieis chegaram à Coreia do Sul em 2019, para fugir da repressão religiosa do Partido Comunista Chinês (PCC). Nem mesmo a barreira linguística e a falta de serviços oferecidos pelo Estado, como educação e saúde, os demovem da ideia de buscar abrigo no exterior e, assim, livrar os filhos da “educação patriótica” imposta por Beijing.
“Nossa igreja educaria nossos filhos sobre nossas crenças religiosas, e a polícia os forçaria a se matricular na escola para que pudessem sofrer lavagem cerebral”, disse o pastor Pan Yongguang. “Eles (governo da China) não queriam que ensinássemos a Bíblia aos nossos filhos, e as crianças são proibidas de frequentar a igreja”.
A Igreja Mayflower tornou-se particularmente visada depois que Pan assinou uma carta de protesto contra a repressão religiosa do governo chinês. Cerca de 30 seguidores que permaneceram na China dizem que têm sido perseguidos pela polícia local.
“Uma de nossas irmãs não pôde permanecer em Shenzhen, mas teve que voltar para sua cidade natal na província de Guangdong”, disse Pan. “Em algum momento de abril ou maio de 2021, a polícia de segurança do Estado a localizou e a acusou de ‘subversão do poder do Estado’, confiscou seus livros cristãos e seu telefone celular e a colocou sob vigilância. Ela não tem permissão para sair [da China]”.
O próprio pastor diz que é alvo de processos judiciais na China, enquanto a mãe, a irmã e o irmão dele são constantemente assediados pelas autoridades. Mesmo morando no exterior, os membros da Igreja têm sido alvo do governo chinês, através do corpo diplomático. “Recebemos muitas ligações do consulado. Se nos tornarmos imigrantes ilegais aqui, o governo sul-coreano não poderá nos oferecer proteção e estaremos em perigo”.
Os pedidos de asilo de chineses têm sido frequentemente rejeitados pela Coreia do Sul, para evitar possíveis retaliações de Beijing. No caso dos membros da Igreja Mayflower, o pedido já foi rejeitado pelas instâncias inferiores da Justiça sul-coreana e será julgado agora pela corte suprema do país.
Um advogado do grupo, que se identificou apenas pelo sobrenome Zheng, disse que a Coreia do Sul exige aos requerentes de asilo que demonstrem ter suas vidas ou saúde ameaçadas em caso de retorno à China. “O processo de solicitação de refugiados é complicado, a probabilidade de ser rejeitado novamente é bastante alta”, disse.
“O atual governo da Coreia do Sul é muito cauteloso com o PCC”, reforçou Bob Fu, presidente do grupo de direitos cristãos ChinaAid, com sede nos EUA. “Apenas 0,4% dos pedidos de asilo de cidadãos chineses foram bem-sucedidos no passado. “A Coreia do Sul está efetivamente sendo refém do PCC”.
Por que isso importa?
Desde 2012, quando Xi Jinping assumiu o governo, a repressão religiosa na China se intensificou. As restrições tornaram-se ainda mais rígidas em 2018, quando entrou em vigor a atual regulamentação de assuntos religiosos no país. Somada à repressão imposta em outros setores, como os meios de comunicação e a internet, a prática religiosa tornou-se um desafio para os fieis em território chinês.
No episódio mais recente da repressão religiosa imposta pelo PCC, a Apple foi obrigada a apagar de sua loja dois aplicativos, um voltado à Bíblia cristã, outro dedicado ao Corão, o livro sagrado do Islã. De acordo com a rede britânica BBC, ambos foram vetados por Beijing por conterem textos religiosos considerados proibidos.
Mas o principal expoente do desafio que os fieis enfrentam na China é a etnia muçulmana dos uigures, que habitam a região autônoma de Xinjiang, no noroeste da China, fazendo fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes étnicas e linguísticas.
O governo chinês refuta as acusações de abusos e classifica como “campos de reeducação” as áreas nas quais vivem milhões de uigures. O argumento de Beijing para isolar e vigiar a etnia muçulmana é o da “segurança nacional”, sob a justificativa de que pretende evitar a radicalização dos fiéis. Entretanto, para os governos de determinados países ocidentais, como Reino Unido, Estados Unidos e Canadá, a ação da China configura “genocídio”.
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