Um tribunal gerido pelos militares que atualmente governam Mianmar anunciou nesta segunda-feira (6) a condenação de Aung San Suu Kyi a quatro anos de prisão. Destituída do poder em um golpe de Estado em fevereiro, a ex-líder nacional foi condenada por incitação à dissidência e violação das regras para conter a Covid-19. Ela ainda enfrenta acusações de corrupção e fraude eleitoral que podem resultar em mais de cem anos de prisão.
A alta comissária da ONU (Organização das Nações Unidas) para os Direitos Humanos, Michelle Bachele, criticou o julgamento, que ocorreu a portas fechadas em um processo “secreto e perante um tribunal controlado por militares que não tem nada além de motivações políticas”.
Na avaliação da comissária, a sentença nega arbitrariamente a liberdade de Aung San Suu Kyi e fecha mais uma porta para o diálogo político. Bachele disse ainda que a decisão aprofunda a rejeição ao golpe e endurece as relações em um momento em que é necessário dialogar para chegar à solução pacífica e política para a crise. Ela acusa os militares de instrumentalizarem os tribunais a fim de silenciar a oposição política.
Em novembro, outros ministros que faziam parte do governo foram condenados a até 90 anos de prisão sob a acusação de corrupção. Mais de 10 mil pessoas foram presas desde o golpe em 1º de fevereiro deste ano, e pelo menos 175 foram mortas no processo repressivo do governo atual.
Bachelet também condenou o ataque “cruel e totalmente repreensível” relatado na cidade de Yangon. Na ocasião, forças de segurança usaram um caminhão para colidir com manifestantes desarmados e, em seguida, dispararam contra o grupo usando munição real.
Por que isso importa?
Mianmar enfrenta “uma campanha de terror com força brutal”, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas). A repressão imposta pelo governo já causou a morte de ao menos 900 pessoas desde o golpe de 1º de fevereiro deste ano, uma reação dos militares às eleições presidenciais de novembro de 2020.
Na ocasião, a NLD (Liga Nacional pela Democracia) venceu as eleições com 82% dos votos, ainda mais do que havia obtido no pleito de 2015. Em fevereiro, então, a junta militar, que já havia impedido o partido de assumir o poder antes, derrubou e prendeu a presidente eleita Aung San Suu Kyi.
O golpe deu início a protestos no país, respondidos com violência pelas forças de segurança nacionais. Centenas de pessoas foram presas sem indiciamento ou julgamento prévio, e muitas famílias continuam à procura de parentes desaparecidos. Jornalistas e ativistas são atacados deliberadamente, e serviços de internet têm sido interrompidos.
Mais recentemente, o governo declarou guerra a médicos e demais trabalhadores da saúde. As forças de segurança têm prendido, agredido e até matado os profissionais da área, considerados inimigos da junta que governa o país.
“Os ataques ao sistema de saúde são encarados como uma arma de guerra da junta”, declarou um médico em fuga há meses, cujos colegas de clínica foram presos. “Acreditamos que tratar os pacientes, fazendo nosso trabalho humanitário, é um trabalho moral, não um crime”.
Os médicos entraram na mira da junta porque são respeitados pela população e extremamente bem organizados, com sindicatos e grupos profissionais atuantes. Desde o golpe eles formam uma forte oposição ao governo militar e, atualmente, são voz importante para denunciar e combater os abusos.
Conteúdo adaptado do material publicado originalmente pela ONU News
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