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quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Documentos vazados vinculam a Huawei a programas de vigilância à minoria uigur

A Huawei trabalhou junto de autoridades e outras empresas chinesas no desenvolvimento de uma tecnologia de vigilância para o controle da população uigur, revelou reportagem do jornal The Washington Post.

A denúncia sustenta,

com base em apresentações de PowerPoint obtidas e traduzidas pelo veículo jornalístico, que a gigante das telecomunicações esteve envolvida na elaboração de sistemas de monitoramento estatal na região de Xinjiang – território amplamente povoado por uigures –, destinados ao uso em campos de trabalho e reeducação.

Os slides constavam de um site público da Huawei, até serem apagados, e mostravam como as inovações da empresa tinham capacidade para auxiliar o Estado a perseguir as minorias étnicas. O sistema possui funções como análise de gravações de voz, monitoramento de campos de detenção, rastreamento de indivíduos interesse político, vigilância policial, gerenciamento de reeducação ideológica, reconhecimento facial e cronogramas de trabalho para prisioneiros.

Câmera de vigilância na China (Foto: Erik Törner/Flickr)

O material não traz detalhes sobre para quem as apresentações seriam dirigidas. Mas, de acordo com a reportagem, alguns slides mostram a aplicabilidade da tecnologia para ações específicas de vigilância destinadas à polícia ou a agências governamentais, o que leva a crer que o público-alvo pode ser o governo chinês.

Apesar de o conteúdo institucional não mencionar especificamente a minoria uigur, pelo menos um slide afirma que a tecnologia da Huawei esteve presente na captura de diversos suspeitos de crimes pelo departamento de segurança pública em Ürümqi, capital de Xinjiang. O

PowerPoint ainda sinaliza que o sistema está em uso naquela cidade desde 2017, período que coincide com as detenções em massa de uigures na região.

A apresentação também afirma que a tecnologia foi implementada com êxito em prisões na região autônoma da Mongólia Interior e na província de Shanxi, locais que foram inclusive listados como “cases de sucesso”, bem como em um “jiedusuo”, como são chamados os centros de detenção específicos para infratores por drogas em Xinjiang.

A empresa nega as acusações. “A Huawei não tem conhecimento dos projetos mencionados no relatório do Washington Post”, declarou a multinacional em um comunicado. “Como todos os outros grandes provedores de serviços, a Huawei fornece serviços de plataforma em nuvem que estão em conformidade com os padrões comuns da indústria”.

Vigilância estatal

A desconfiança global que recai sobre a empresa de telecomunicações se sustenta em teorias sobre sua proximidade ao governo chinês. Diante disso, a Huawei tem enfrentado uma crescente desconfiança na construção de redes 5G em todo o mundo, com a implantação rejeitada em vários países. Austrália, Nova Zelândia, Portugal, Índia, Canadá, Estados Unidos e Reino Unido já baniram a infraestrutura da fabricante em seu território por medo de que a China pudesse usá-la para espionagem

Agora, as especulações sobre os produtos de vigilância da Huawei ganham força em meio a temores na China e no mundo sobre as consequências do uso maciço do reconhecimento facial e de outros métodos de rastreamento biométrico. E, ao mesmo tempo em que o Partido Comunista Chinês (PCC) continua a confiar em tais ferramentas para erradicar a dissidência e manter seu regime de partido único, ele alerta sobre o uso indevido de tecnologias no setor privado.

Em 2021, após pressão de Beijing, a Huawei e outros gigantes da tecnologia prometeram não abusar do reconhecimento facial e de outras ferramentas de vigilância depois que uma nova lei de proteção de dados pessoais entrou em vigor. O novo conjunto de leis foi discretamente promulgado – primeiro a Lei de Segurança de Dados em setembro, seguida em novembro pela Lei de Proteção de Informações Pessoais – que vão ainda mais longe, exigindo não apenas acesso a dados privados, mas também controle efetivo sobre eles.

Por que isso importa?

A comunidade uigur habita a região autônoma de Xinjiang, no noroeste da China. A província faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes étnicas e linguísticas.

Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.

Uigures na cidade de Kashgar, Xinjiang, China, em julho de 2017 (Foto: CreativeCommons/Marc van der Chijs)

Estimativas apontam que um em cada 20 uigures ou cidadãos de minoria étnica já passou por campos de detenção de forma arbitrária desde 2014. O governo chinês admite a existência de tais campos, que abrigam mais de um milhão de pessoas, mas alega que eles servem para educação contraterrorismo.

O governo de Joe Biden, nos EUA, foi o primeiro a usar o termo “genocídio” para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e mais recentemente a Lituânia se juntou ao grupo.

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