O governo do Paquistão, historicamente alinhado com o Taleban, contestou a repressão às mulheres imposta pelo grupo radical, que governa o Afeganistão desde o dia 15 de agosto. No domingo (26), o Taleban decretou que as mulheres estão proibidas de realizar viagens longas desacompanhadas, sendo necessária a companhia de um homem da família sempre que precisarem percorrer mais de 72 quilômetros. As informações são da rede Voice of America (VOA).
O ministro da Informação paquistanês, Fawad Hussain, classificou o governo do Taleban como “regime extremista” e citou especificamente a nova imposição. “Queremos ajudar plenamente o povo do Afeganistão. Mas dizer que as mulheres não podem viajar sozinhas, ou ir a escolas e faculdades… esse tipo de pensamento retrógrado é uma ameaça ao Paquistão”, disse.
A norma que proíbe as viagens longas de mulheres desacompanhadas vem poucas semanas após o Ministério da Promoção da Virtude e Prevenção do Vício ter determinado aos canais locais de televisão que deixassem de exibir programas e novelas em que mulheres aparecem atuando. As novas medidas também se estendem às jornalistas de TV, que devem usar o hijab diante das câmeras.
Repressão de gênero
A nova realidade no país tem sido particularmente devastadora para as mulheres, que voltaram a viver sob um regime repressivo baseado numa interpretação radical do Islã. Entre as imposições dos talibãs às mulheres, além da proibição de viajarem desacompanhadas, estão o veto à educação e ao trabalho, bem como inúmeros casos de solteiras ou viúvas forçadas a se casar com combatentes.
Muitas mulheres que tinham cargos no governo afegão antes da ascensão talibã seguem impedidas de trabalhar, e a cúpula do governo que prometia ser inclusiva é formada somente por homens. A perda do salário por parte de muitas mulheres que sustentavam suas casas tem contribuído para o empobrecimento da população afegã.
Na educação, o governo extremista tem postergado uma tomada de decisão, o que mantém fora da escola as meninas acima dos sete anos de idade em diversas regiões do país. Algumas poucas províncias do país, entre as 34 existentes, permitiram a volta das meninas à escola. Assim, muitas delas têm recorrido a uma instituição que ministra aulas online, a fim de não perderem o ano letivo ou interromperem os estudos.
O tratamento opressivo dedicado às mulheres pela organização extremista tem sido o principal motivo de críticas por parte do Ocidente. Nos encontros diplomáticos dos novos governantes afegãos com representantes de nações e de organismos internacionais, por exemplo, apenas homens têm sido enviados, atendendo a uma reivindicação dos próprios talibãs. Algo que gerou críticas a governos e organizações intergovernamentais que aceitam tais regras.
Por que isso importa?
Depois que o Taleban conquistou Cabul, em agosto de 2021, consequentemente assumindo o governo do Afeganistão, o primeiro-ministro do Paquistão, Imran Khan, declarou que o grupo estava “quebrando as correntes da escravidão”, em vídeo reproduzido pelo jornal britânico The Independent. Posteriormente, o país passou a reivindicar o papel de principal interlocutor dos talibãs, até então exercido pelo Catar.
Nos EUA, são comuns as acusações de que o governo paquistanês não apenas dialoga com os talibãs, mas também os apoia e dá suporte. Segundo especialistas, o ISI, serviço de inteligência paquistanês, apoiou grupos militantes na região da Caxemira, disputada entre Paquistão e Índia. Entre eles, grupos que hoje figuram na lista de organizações terroristas do Departamento de Estado norte-americano.
O CFR ilustra essa desconfiança com uma entrevista do então secretário de Defesa dos Estados Unidos Robert Gates, concedida ao programa 60 Minutes, da rede CBS, em maio de 2009. Na ocasião, ele disse que “até certo ponto, eles jogam dos dois lados”, referindo-se ao ISI.
Há inclusive indícios materiais de ligação entre Islamabad e Taleban. Em setembro de 2021, o jornal indiano Hindustan Times afirmou que o mulá Abdul Ghani Baradar, cofundador do Taleban, tem um passaporte e um documento nacional de identificação oficiais do Paquistão, sob o nome falso Muhammad Arif Agha.
O passaporte, com validade vitalícia, e o documento nacional de identificação foram emitidos no mesmo dia, 10 de julho de 2014, com a assinatura do registro geral do Paquistão. A suspeita é de que o ISI tenha fornecido os documentos, da mesma forma que oferece suporte militar, financeiro e sobretudo de inteligência ao Taleban.
Um indício anterior de apoio paquistanês ao Taleban ocorreu em 2016, quando o ex-líder do grupo, o mulá Akhtar Mansoor, foi morto num ataque de drone. Um passaporte do Paquistão também foi encontrado com ele quando da recuperação do corpo após o ataque.
O post Paquistão condena repressão imposta pelo Taleban às mulheres no Afeganistão apareceu primeiro em A Referência.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe aqui seu comentário, evite comentários depreciativos e ofensivos