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terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Rússia prende três cidadãos ucranianos sob acusações de ‘terrorismo’ e ‘espionagem’

A FSB (Agência de Segurança Federal, da sigla em inglês) russa anunciou, na última quinta-feira (2), a prisão de três cidadãos ucranianos por “terrorismo” e “espionagem”. Um deles é acusado de planejar atentados a bomba em solo russo, e os outros dois, pai e filho, teriam sido recrutados para coletar informações de inteligência em instalações estratégicas. Kiev contesta as denúncias e diz que as prisões são um ato de vingança da Rússia com o objetivo de desacreditar os serviços de inteligência da Ucrânia, de acordo com o site investigativo Meduza.io.

Alexander Tsilyk, acusado de terrorismo, viajou oficialmente a negócios no início de outubro. Bancário de formação, ele atuou posteriormente como barista e vinha trabalhando com café e chá. Teria ido à Rússia fechar acordos de compra de café. “Ele se empolgou muito com o café nos últimos dois anos: ia a festivais e lia muito”, diz Milana, a mãe dele.

Milana contra que, após perder contato com o filho, só voltou a receber notícias dele em novembro. “Liguei para a embaixada e eles fizeram um pedido [à Rússia]”, conta. “Eles [a embaixada] foram informados de que ele havia sido detido. É meio estranho. De acordo com as regras, eles [o FSB] deveriam ter informado o cônsul. Mas nada disso aconteceu”.

Alexander Tsilyk, ucraniano preso na Rússia sob acusação de terrorismo (Foto: reprodução/Instagram)

A FSB informou que Tsilyk foi preso no dia 11 de outubro, e posteriormente a agência divulgou um vídeo no qual ele confessa os crimes. Nas imagens, ele diz que que o serviço de inteligência militar da Ucrânia (HUR MO) o instruiu a orquestrar dois ataques terroristas a bomba na Rússia. Ele diz ter sido treinado pessoalmente pelo tenente-coronel Maksym Kyrylovets.

Milana nega qualquer relação entre o filho e o exército ucraniano. “Tenho certeza de que tudo isso foi inventado. Eu também vi o vídeo [de confissão] e vejo que ele está lendo [em um pedaço de papel]. Eu vejo que a pressão foi colocada sobre ele. Pressão física. Eu tenho um palpite: eles o intimidaram, torturaram e o espancaram, então ele confessou algumas besteiras”, diz, sem explicar o porquê de suas impressões.

Os outros dois ucranianos detidos, estes sob acusação de espionagem, são Zionviy e Igor Koval, pai e filho, que teriam viajado para a Rússia supostamente para gravar imagens de pontos estratégicos do país, como “pontes rodoviárias, pontes ferroviárias e uma central térmica”, segundo a FSB. Eles são acusados de servir ao Serviço Secreto Ucraniano (SBU, da sigla em inglês). Também foram publicados vídeos com as confissões de ambos.

Igor teria sido recrutado pelo coronel Vasyl Kovalik, assumindo o nome de código “Torik”. Posteriormente, o pai dele, Zionviy, teria dito ao filho que também estaria atuando a serviço da SBU, sob o nome de código “Byk”. A mãe de Igor, Iryna, responderia pelo apelido “Shkola” (escola, em russo).

Uma semana depois que a família foi recrutada, pai e filho teriam viajado à Rússia, onde foram presos. Os agentes do FSB dizem ter encontrado um esconderijo de armas no carro da dupla, com oito pistolas, uma carabina e pentes de munição. Segundo a confissão, a eles teria sido prometida uma recompensa de US$ 10 mil pela missão.

“Guerra híbrida”

A SBU diz que as acusações são falsas. “Essas declarações da FSB russa devem ser consideradas exclusivamente pelo prisma de uma guerra híbrida, na qual a propaganda de informações e a divulgação de notícias falsas desempenham um papel importante”, disse o porta-voz da agência ucraniana, Artem Dekhtiarenko.

Ainda de acordo com Dekhtiarenko, nos últimos nove meses, os serviços de segurança ucranianos “expuseram” cerca de 50 agentes russos. “Os oficiais russos da FSB foram identificados pelo nome, e suas conversas foram interceptadas. Aparentemente, foi uma grande perda de reputação para a FSB, que busca mais uma vez desacreditar uma agência de inteligência ucraniana com [histórias] falsas”, disse ele.

Por que isso importa?

tensão entre Ucrânia e Rússia explodiu com a anexação da Crimeia por Moscou. Tudo começou no final de 2013, quando o então presidente da Ucrânia, o pró-Kremlin Viktor Yanukovych, se recusou a assinar um acordo que estreitaria as relações do país com a UE. A decisão levou a protestos em massa que culminaram com a fuga de Yanukovych para Moscou em fevereiro de 2014.

Após a fuga do presidente, grupos pró-Moscou aproveitaram o vazio no governo nacional para assumir o comando da península da Crimeia e declarar sua independência. Então, em março de 2014, as autoridades locais realizaram um referendo sobre a “reunificação” da região com a Rússia. A aprovação foi superior a 90%.

Com base no referendo, considerado ilegal pela ONU (Organização das Nações Unidas), a Crimeia passou a se considerar território russo. Entre outras medidas, adotou o rublo russo como moeda e mudou o código dos telefones para o número usado na Rússia.

Paralelamente à questão da Crimeia, Moscou também apoia os separatistas ucranianos que enfrentam as forças de Kiev na região leste da Ucrânia desde abril de 2014. O conflito armado, que já matou mais de dez mil pessoas, opõe ao governo ucraniano as forças separatistas das autodeclaradas Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, que formam a região de Donbass e contam com suporte militar russo.

Em 2021, as tensões escalaram na fronteira entre os dois países. Washington tem monitorado o crescimento do exército russo na região fronteiriça e compartilhou informações de inteligência com seus aliados. Os dados apontam um aumento de tropas e artilharia russas que permitiriam um avanço rápido e em grande escala, bastando para isso a aprovação de Putin.

Conforme o cenário descrito pela inteligência dos EUA, as tropas russas invadiriam a Ucrânia pela Crimeia e por Belarus, com potencialmente cem mil soldados. A Ucrânia estima um contingente de 90 mil soldados de Moscou prontos para atacar, enquanto a inteligência norte-americana fala em 50 mil.

Um eventual conflito, porém, não seria tão fácil para Moscou como os anteriores. Isso porque, desde 2014, o Ocidente ajudou a Ucrânia a fortalecer suas forças armadas, com fornecimento de armamento, tecnologia e treinamento. Assim, embora Putin negue qualquer intenção de lançar uma ofensiva, suas tropas enfrentariam um exército ucraniano muito mais capaz de resistir.

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