Um esquema especial foi organizado para abalar emocionalmente o oposicionista russo Alexei Navalny no presídio onde está detido, o IK-2, 100 quilômetros a leste de Moscou. A revelação foi feita por dois ex-presidiários em entrevista à emissora de televisão russa Dozhd, classificada como “agente estrangeiro” por uma série de matérias críticas ao governo. As informações são da Radio Free Europe.
Segundo Nariman Osmanov e Evgeny Burak, a principal determinação dentro do presídio era para isolar Navalny e em momento algum se comunicar com ele, a fim de tentar vencê-lo pelo isolamento. Também foram adotadas medidas diversas no intuito de desmoralizar o principal opositor do presidente Vladimir Putin, que cumpre pena de dois anos e meio iniciada em fevereiro.
A fim de desencorajar qualquer interação social, teria sido exibido um vídeo afirmando que Navalny é gay, o que habitualmente leva ao isolamento no sistema carcerário russo. Adicionalmente, um grupo de cerca de dez homens foi destacado para seguir o oposicionista o tempo todo, provocando-o sempre que possível. O objetivo era forçar uma reação violenta e, assim, permitir punições administrativas ou mesmo novas acusações.
Também partiu da administração do presídio a ordem para atrapalhar o sono de Navalny, com um preso destacado para fazer barulhos irritantes a noite toda. A situação levou o oposicionista a uma greve de fome em abril deste ano, que também gerou reação dentro do presídio. Para mexer com os sentidos do oposicionista e tentar dar fim ao protesto, que vinha atraindo negativamente a atenção global, presos chegaram a fritar linguiça ao lado da cela dele.
Provocações desmentidas
De acordo com o site independente russo Meduza.io, um watchdog russo chamado Comissão de Monitoramento Público, da região onde fica o presídio IK-2, questionou a veracidade das alegações dos dois ex-presidiários. Sergey Yazhan, membro do grupo, afirmou que “tudo isso é apenas conversa. Só sei que está tudo bem com [Navalny], a julgar pelas informações mais recentes”.
No mês passado, Navalny usou sua conta no Instagram, atualizada por aliados e advogados, para contar que foi classificado como “extremista e terrorista” por uma comissão formada dentro da prisão. Devido à designação, ele passou a usar um uniforme diferente e teve a tal classificação estampada na cela que ocupa. Por outro lado, contou com satisfação que foram reduzidas as checagens noturnas, o que permitiu a ele dormir melhor.
Abusos em presídios
No início de outubro, o grupo de direitos humanos Gulagu.net revelou ter recebido mais de mil vídeos que mostram prisioneiros sendo espancados e torturados dentro de presídios por agentes da FSB (Agência Nacional de Segurança, da sigla em inglês) e do Serviço Prisional Federal (FSIN, da sigla em russo).
O delator é o belarusso Sergei Savelyev, um profissional de TI (tecnologia da informação) e ex-presidiário colocado em liberdade em fevereiro deste ano. Ele cumpriu pena por tráfico de drogas e ficou detido por sete anos e meio, período no qual armazenou os vídeos enquanto trabalhava com manutenção de computadores na cadeia. Atualmente, busca asilo político na França.
As imagens mostram episódios de violência em várias penitenciárias, incluindo cenas de prisioneiros urinando em outros e imagens explícitas de abuso sexual. Uma cena mostra um prisioneiro gritando enquanto é estuprado com um cabo de vassoura.
Após a denúncia, uma investigação resultou na demissão de vários funcionários, entre eles o diretor de uma prisão onde foram relatados abusos, o chefe do serviço penitenciário regional e mais três funcionários do FSIN.
Entre 2018 e 2020, pelo menos 200 presidiários teriam sido vítimas de tortura e estupro por agentes da FSB e do FSIN nos hospitais de penitenciárias das cidades de Saratov e Irkutsk. As imagens mostram maus tratos praticados contra 40 deles.
Por que isso importa?
Navalny ganhou destaque ao organizar manifestações e concorrer a cargos públicos na Rússia. A principal plataforma do oposicionista é o combate à corrupção no governo de Vladimir Putin, em virtude da qual ele uma cobra profunda reforma na estrutura política do país.
Em agosto de 2020, durante viagem à Sibéria, Navalny foi envenenado e passou meses se recuperando em Berlim. Voltou a Moscou em janeiro de 2021 e foi detido ainda no aeroporto. Em fevereiro, foi julgado e condenado a dois anos e meio de prisão por violar uma sentença suspensa de 2014, quando foi acusado de fraude. Promotores alegaram que ele não se apresentou regularmente à polícia em 2020, justamente quando estava em coma pela dose tóxica.
Encarcerado em uma colônia penal de alta segurança, ele chegou a fazer uma greve de fome de 23 dias em abril, para protestar contra a falta de atendimento médico. Em junho de 2021, um tribunal russo proibiu os escritórios regionais de Navalny e sua Fundação Anticorrupção de funcionarem, classificando-as como “extremistas”.
Em agosto, a Justiça russa abriu uma nova acusação criminal contra o oposicionista, o que poderia ampliar a sentença de prisão dele em três anos. Ele foi acusado de “incentivar cidadãos a cometerem atos ilegais”, por meio da Fundação Anticorrupção (FBK) que ele criou. Mais recentemente, em setembro, uma terceira acusação contra, por “extremismo”, ameaça estender o encarceramento por até uma década.
Caso seja condenado em alguma das novas acusações, Navalny será mantido sob custódia no mínimo até o fim da próxima eleição presidencial, em 2024, quando chega ao fim o atual mandato de seis anos de Vladimir Putin no Kremlin.
O post Administração de presídio armou esquema para isolar e desmoralizar Alexei Navalny apareceu primeiro em A Referência.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe aqui seu comentário, evite comentários depreciativos e ofensivos