A Justiça da Alemanha anunciou, na terça-feira (30), a sentença de prisão perpétua imposta a um jihadista iraquiano responsável pela morte de uma menina yazidi de 5 anos. O homem, identificado como Taha Al-J, era membro do Estado Islâmico (EI) e foi condenado por crimes contra a humanidade e crimes de guerra, na primeira condenação de um combatente extremista por genocídio contra os yazidi, uma comunidade étnico-religiosa curda do norte do Iraque.
“Este é o momento pelo qual os yazidi estavam esperando: finalmente ouvir um juiz, após sete anos, declarar que o que eles sofreram foi genocídio”, disse Amal Clooney, advogada de direitos humanos e membro da equipe jurídica da mãe da menina, conforme informações do jornal The New York Times.
O crime ocorreu na cidade iraquiana de Falluja, em 2015, onde a qa\Z e a mãe eram mantidas em cativeiro pelo extremista depois de terem sido compradas como escravas. Um dia, como castigo, o homem prendeu a criança do lado de fora da casa, sob o sol, e lá ela morreu de sede.
Taha Al-J foi preso em 2019 em Atenas, na Grécia, com base em um mandado de prisão europeu. A mulher dele, Jennifer W., que é cidadã alemã, foi julgada separadamente na cidade de Munique e condenada a dez anos de prisão por ter permitido que a menina morresse.
Jurisdição universal
Atualmente, a mãe da menina, cuja identidade é mantida em segredo, vive na Alemanha. Embora nem a vítima nem o assassino sejam alemães, o crime foi julgado no país com base no princípio da jurisdição universal, frequentemente usado por tribunais alemães para julgar criminosos de guerra.
Clooney afirmou ser “grata à Alemanha por defender o princípio da jurisdição universal, o que significa que crimes como este devem ser processados, não importa onde ou quando ocorreram”.
Genocídio reconhecido
O genocídio contra o povo yazidi pelo EI ocorreu entre 2014 e 2017 e teve como principal característica o sequestro e venda de mulheres e crianças como escravos sexuais. Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), as crianças sequestradas eram torturadas, forçadas a lutar na guerra, estupradas e sujeitas a inúmeros outros abusos pelo grupo extremista.
Em 1º de março, o parlamento iraquiano aprovou a Lei de Sobreviventes Yazidi (YSL, da sigla em inglês) para oferecer apoio não apenas às mulheres yazidi, mas também a outras sobreviventes étnico-religiosas visadas pelo grupo extremista quando este ocupou grandes áreas do Iraque, entre 2014 e 2017.
A nova lei reconhece oficialmente o genocídio orquestrado contra os yazadi, estabelece uma estrutura para reparações financeiras e outras reparações concretas e oferece reparação.
Por que isso importa?
Nos últimos anos, o EI se enfraqueceu financeira e militarmente. Em 2017, o exército iraquiano anunciou ter derrotado a organização no país, com a retomada de todos os territórios que ela dominava desde 2014. O grupo, que chegou a controlar um terço do Iraque, hoje mantém apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos, quase sempre focados em agentes do governo e raramente contra civis. Já as Forças Democráticas Sírias (FDS), apoiadas pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pela organização extremista no país.
De acordo com um relatório do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), publicado em julho deste ano, a prioridade do EI atualmente é “o reagrupamento e a tentativa de ressurgir” em seus dois principais domínios, Iraque e Síria, onde ainda mantem cerca de 10 mil combatentes ativos. O documento sugere, ainda, que o grupo teve considerável perda financeira recentemente, devido a dois fatores: as operações antiterrorismo no mundo e a má gestão de fundos por parte de seus líderes.
Paralelamente à derrocada do EI, a pandemia de Covid-19 reduziu o número de ataques terroristas em regiões sem conflito, devido a fatores como a redução do número de pessoas em áreas públicas. Entretanto, grupos jihadistas têm se fortalecido em zonas de conflito, e isso pode causar um impacto na segurança global conforme as regras de restrição à circulação são afrouxadas.
Esse cenário permitiu ao EI, particularmente, ganhar uma sobrevida, fazendo uso sobretudo do poder da internet. À medida em que as restrições relacionadas à pandemia diminuem gradualmente, há uma elevada ameaça de curto prazo de ataques inspirados no grupo fora das zonas de conflito. São ações empreendidas por atores solitários ou pequenos grupos que foram radicalizados e incitados através da internet.
Atualmente, o principal reduto do EI é o continente africano, onde consegue se manter relevante graças ao recrutamento online e à ação de grupos afiliados regionais. A expansão do grupo em muitas regiões da África desde o início de 2021 é alarmante e pode marcar a retomada de força da organização.
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